Experiências e conselhos para cobrir terremoto na Turquia e na Síria

Feb 17, 2023 em Reportagem de crise
صورة من شمال سوريا لعمليات البحث

O terremoto de magnitude 7.8 que abalou a Turquia e a Síria no dia 6 de fevereiro deixou pelo menos 36.000 mortos e milhares de feridos. Redações e jornalistas estão na linha de frente cobrindo a destruição, ao mesmo tempo que vão às redes sociais para compartilhar nomes de desaparecidos e informações de contato de organizações que podem oferecer assistência.

Eu conversei com jornalistas na Síria, na Turquia e no Líbano sobre suas experiências durante o terremoto e suas consequências. Eles falaram sobre como cobrir o desastre com responsabilidade, verificar informações que estão circulando e por que é importante colaborar em tempos de crise. 

 

صورةFoto da destruição no norte da Síria, feita pelo jornalista Rami Muhammad

Testemunha do desastre

Tanto jornalistas da Turquia quanto da Síria foram diretamente impactados pelo terremoto. "Eu acordei aterrorizado sentindo que o mundo estava tremendo em toda parte e saí de casa com meus filhos e esposa porque pensei que poderia ser um ataque de mísseis", diz o jornalista sírio Ahmed Orabi, que estava com a família em Atarib, na região de Aleppo, na Síria, quando houve o terremoto. "A energia acabou na minha casa e ficamos seis horas no meu carro. O clima estava chuvoso, nós ouvimos o barulho dos prédios caindo e sentimos o cheiro da destruição."

Também em Aleppo, a jornalista independente Haneen Al-Sayed descreveu a noite trágica. "Eu estava assustada, então corri para a rua com meus filhos, marido e mãe. Tinha pedras caindo sobre nossas cabeças devido ao desmoronamento do piso superior da nossa casa."

Mesmo estando entre os afetados pelo desastre, muitos jornalistas se apressaram em ajudar após o ocorrido. Rami Muhammad, outro jornalista sírio, ajudou a resgatar vítimas presas debaixo dos escombros. "A extensão da destruição é assustadora: quando você olha, acha que entrou em uma área que foi alvo de bombas atômicas", diz. 

Ali Al Ibrahim, jornalista investigativo e cofundador da organização Reportagem Investigativa Síria para o Jornalismo de Responsabilidade (SIRAJ), compartilhou como perdeu parentes no terremoto. "Meu tio, a esposa dele e os três filhos ficaram 42 horas sobre os escombros até morrerem."  

 

صورة Cidade de Bisnia no interior de Idlib, na Síria, em foto do jornalista Ahmed Orabi


Mídia e reportagens humanitárias

Na Síria, que recebeu pouca ajuda internacional após o terremoto, cidadãos estão ajudando a buscar por pessoas em meio a centenas de prédios que desabaram, diz Khalil Ashawi, fotógrafo da Reuters e cofundador da Frontline in Focus. Os pais de Ashawi ficaram presos sob os escombros em Antakya, Turquia, por dois dias até serem resgatados vivos.  

Após garantir a segurança de sua equipe na Síria, Ashawi pediu que eles documentassem o terremoto com imagens aéreas e matérias com perspectiva humana. Sem internet e eletricidade na maior parte da Síria, pessoas da equipe foram até a fronteira do país para subir conteúdo no site e nas redes sociais.

Hadil Arja, fundadora do Tiny Hand e cofundadora do Frontline in Focus, aconselha jornalistas a fazerem o possível para seguirem sendo profissionais ao cobrirem as consequências traumáticas. "Os jornalistas na Síria e na Turquia devem ter a força de vontade e determinação para informar sobre os eventos e fatos com objetividade e profissionalismo extremos", diz. "Eles devem informar sobre o sofrimento das pessoas e escrever matérias humanitárias para transmitir a voz dos afetados."

 

صورةEstragos no carro da jornalista Haneen Al-Sayed

Verificação de informação

Joyce Hanna, verificadora de fatos da AFP, alerta que a desinformação prolifera durante desastres naturais. "Promotores de notícias falsas tiram vantagem de desastres que têm muitas fotos chocantes, como uma criança chorando depois de perder a família e cenas de crianças sob os escombros", diz. "Pessoas que espalham boatos compartilham vídeos antigos e assustadores que podem ter sido tirados de contexto para estimular as pessoas a compartilhá-los nas redes sociais."

Desde o terremoto, a equipe de Hanna tem usado técnicas como ferramentas de busca reversa de imagens e o corte de vídeos em cenas para verificar se o conteúdo publicado na internet é novo ou de desastres antigos.

"Também confiamos na nossa experiência jornalística, como adicionar palavras-chave para verificar informação e limitar a busca a um período específico de tempo, além de contatar nossos correspondentes no mundo para garantir a autenticidade de notícias e imagens", diz Hanna. "Não publique fotos ou vídeos durante desastres e terremotos até você verificar a credibilidade deles, para evitar a disseminação de rumores falsos."

 

ًصورةFoto: Haneen Al-Sayed 


Divulgação de fatos e dados

Mostapha Raad, jornalista da Scientific American, está cobrindo os abalos secundários sentidos pela população do Líbano após o terremoto. "Eu foquei na magnitude do terremoto e no impacto dele no Líbano e em países vizinhos", diz Raad. "Eu compartilho informação científica simplificada no Facebook, como falhas sísmicas no território libanês, para reconfortar os cidadãos e [acalmar medos]. Eu também digo às pessoas o que elas devem fazer para se protegerem." 

Raad aconselha jornalistas a consultarem fontes oficiais para obter dados exatos sobre desastres naturais, a verificar as contas de especialistas antes de compartilhar tweets ou outros posts dos mesmos nas redes sociais e a buscar orientação de cientistas, especialistas e centros de pesquisa especializados em terremotos e desastres naturais.

Ele também aconselha ter em mente que a desinformação pode causar danos às pessoas que estão sofrendo com o desastre e assegurar que quaisquer números que você apurar batam com os apresentados por outras fontes.

 

صورةFoto: Khalil Ashawi

Dicas práticas para cobrir o terremoto

A jornalista síria e instrutora Mais Katt dá os seguintes conselhos para jornalistas que cobrem desastres naturais:

  • Priorize sua segurança; ela é mais importante que ser o primeiro a dar um furo;
  • Evite ir a áreas de alto risco e siga as regras de segurança recomendadas por autoridades locais; 
  • Mantenha a ética jornalística e os padrões profissionais ao cobrir desastres;
  • Siga as regras a respeito da publicação de fotos de crianças e respeite a privacidade das famílias impactadas; 
  • Siga orientações profissionais ao entrevistar pessoas que estejam passando por traumas;
  • Verifique informações antes de publicá-las, já que crises são um solo fértil para a desinformação. 

Imagem principal por Karem Keelia, colaboradora do Frontline in Focus. Todas as imagens foram publicadas com permissão dos autores.

Este artigo foi originalmente publicado na IJNet em árabe.