Eventos de alto risco e de alto interesse, como protestos, levantes, guerras e desastres naturais, geram uma demanda extremamente alta por notícias a qual uma cobertura com informação verificada não necessariamente consegue acompanhar. Alguns analistas da desinformação chamam isso de “incidentes de informação” ou “crises de desinformação”. A disseminação mundial da COVID-19 no início de 2020 é um exemplo de um incidente de informação global e prolongado.
A guerra Rússia-Ucrânia é um exemplo especialmente perigoso, com um cenário de informação digital repleto de desinformação não intencional, como postagens equivocadas nas redes sociais, e intencional, como a propaganda russa.
O segundo tipo é muitas vezes chamado de “desinformação” e diz respeito a informações falsas intencionalmente criadas e disseminadas para promover um objetivo. (Em linhas gerais, tudo é colocado sob o guarda-chuva da “informação falsa”.) Em uma thread recente no Twitter, o perfil de jornalismo First Draft News destacou a diferença, dizendo que isso pode afetar não apenas a reportagem e o consumo de informações, mas também a forma como as pessoas envolvidas são vistas.
— First Draft (@firstdraftnews) February 28, 2022
A thread compartilha uma série de dicas sobre imagens, vídeos, relatos e linguagem geral para cobrir eventos de alto risco. Isso inclui táticas que foram abordadas em artigos anteriores, como o uso do RevEye para pesquisa reversa de imagens e do Internet Archive para fazer backup de páginas da internet. A equipe também sugere a criação de camadas sobrepostas em imagens, que adicionam texto a uma imagem para indicar que ela é falsa ou enganosa.
Muitas das orientações e conselhos de especialistas (ou conselhos “especializados”) vêm das redes sociais, como esta thread da Bellingcat. Para salvá-la, você pode usar um complemento do Twitter chamado Thread Reader. Basta marcar o @ThreadReaderApp em uma resposta a um tweet da thread ou em um tweet que cita a thread. Com isso, será criado um link que você pode guardar para ler mais tarde, e ele será adicionado ao grande repositório de threads salvas do Thread Reader. Se você não salvou uma thread logo que ela foi compartilhada, é possível pesquisar tópicos mais antigos usando a função de pesquisa.
Você precisa ter uma conta no Twitter para usar o Thread Reader, porque é preciso twittar para o complemento funcionar. E se você conectar sua conta, a ferramenta oferece um painel onde é possível organizar suas threads salvas usando hashtags ou seu próprio sistema de arquivamento.
Mas o Thread Reader só arquiva threads - ele não salva um único tweet. Para acompanhar o fluxo de tweets individuais, você pode optar por ferramentas como o TweetDeck ou InoReader.
O TweetDeck é conhecido por muitos jornalistas como a ferramenta principal para ler e escrever tweets, geralmente a partir de várias contas. É também uma das ferramentas mais poderosas para encontrar tweets relevantes. Por exemplo, é uma das únicas ferramentas que permite classificar ou filtrar resultados por um número mínimo de curtidas ou retuítes, permitindo que você peneire muitos (em alguns casos, centenas ou milhares) de tweets de baixo valor ou pouco interesse. Assim como o Thread Reader, a ferramenta foi comprada pelo próprio Twitter, o que facilita a integração da conta.
O Inoreader é uma ferramenta nova que cria um painel com tweets, postagens no Facebook, tópicos do Reddit e alertas do Google. Com uma conta Pro, você pode adicionar o Telegram e newsletters. Como o Telegram é um aplicativo de mensagens popular em muitos países, isso torna o InoReader especialmente útil se você estiver cobrindo informações locais em situações como a guerra na Ucrânia.
Eventos que tomam conta do noticiário, como a guerra Rússia-Ucrânia, geram uma quantidade excessiva de informações que circulam rápido, o que naturalmente cria muitas oportunidades para o fluxo de desinformação. No início deste ano, a organização de verificação de fatos Full Fact lançou uma versão atualizada de seu Modelo para Incidentes de Informação – basicamente, é um manual para governos, empresas de internet e profissionais de mídia que enfrentam o que a Full Fact chama de “crises de desinformação”.
Em vez de listar uma série de ferramentas práticas, como fez o First Draft News, a Full Fact fornece um modelo meticuloso de como as lideranças podem refletir sobre a crise e planejar uma resposta. O modelo inclui um glossário e incorpora pesquisas e feedback de outras organizações de verificação de fatos respeitadas, como Chequeado e Africa Check.
Uma ferramenta parecida é o Manual de Verificação publicado pelo datajournalism.com. Descrito por outros pesquisadores como “um material de referência sobre verificação”, o manual é um guia pronto para uso para fazer a checagem de fatos sempre que houver notícias de última hora, e não somente nas situações em que há notícias propensas à desinformação.
Para cobrir a guerra Rússia-Ucrânia em si, jornalistas também precisam lidar com o aumento da ameaça da propaganda política (desinformação com inspiração política), além do usual excesso de rumores, declarações, alegações e argumentos publicados nas redes sociais.
“Há uma grande demanda por informações sobre o mistério em torno de como os hackers e trolls da Rússia trabalham”, escreveu Aric Toler, pesquisador do Bellingcat, em um artigo de 2020 intitulado “Como (não) cobrir a desinformação russa”. “Mas o resultado disso frequentemente se volta para clichês vazios e, ironicamente, desinformação.”
Toler recomenda aprender mais sobre os veículos russos e avaliar se perfis nas redes sociais não estão envolvidos com atividade de robôs antes de usá-las como fontes para qualquer tipo de conteúdo. O Stanford Cyber Policy Center publicou seu próprio Manual de Redação para Cobertura de Propaganda, com ferramentas e políticas que podem ser implementadas na redação como um todo.
Mesmo jornalistas que não cobrem a guerra Rússia-Ucrânia podem aplicar essas diretrizes em outras situações nas quais o governo é um dos jogadores do jogo da desinformação. Apesar de a propaganda não ser frequentemente o foco da educação anti-desinformação, já que ela é só uma parte pequena do problema, os jornalistas devem buscar estar preparados.
Este artigo foi publicado originalmente pelo Reynolds Journalism Institute da Universidade do Missouri.
Foto por Issy Bailey no Unsplash.