O que fazer quando você sentir que precisa dar um tempo do jornalismo

Jan 17, 2023 em Jornalismo básico
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Não é de hoje que o estresse e a ansiedade são prevalentes entre profissionais do jornalismo. Um artigo da Columbia Journalism Review de 1999 observava que quase 40% dos editores nos Estados Unidos "relatavam problemas de saúde relacionados ao trabalho, desde insônia a alcoolismo e hipertensão". Não havia redes sociais na época, e poucas redações sequer estavam online. Mesmo assim, profissionais de mídia trabalhavam por longas horas e cobriam temas difíceis, dentre outros estressores ocupacionais.

Em 2015, o Dart Center for Journalism & Trauma descobriu que entre 4% e 59% dos jornalistas têm transtorno de estresse pós-traumático dependendo de sua editoria ou localização. A pandemia da COVID-19, agitação social e uma gama de crises econômicas globais desde então exacerbaram a situação.

O que jornalistas podem fazer para cuidar de sua saúde mental hoje — incluindo avaliar se precisam dar um tempo? Abaixo estão alguns conselhos de mentores de carreira que trabalham com profissionais de jornalismo do mundo todo.

O que não te ensinam na faculdade de jornalismo

Phoebe Gavin, coach de carreira e liderança, está "vendo uma aceleração do burnout ocupacional e de sintomas adjacentes ao burnout", diz. Ou, pelo menos, "reações e descrições de como as pessoas estão vivenciando o trabalho adjacentes ao burnout".

Ela explica que isso é o resultado de muitas camadas de estressores que jornalistas experimentam como parte de seu trabalho. A profissão regularmente se envolve com assuntos difíceis – mais notadamente em anos recentes com a pandemia, protestos e guerra. Além disso, há a incerteza econômica que continua a assombrar a profissão.

A Self-Investigation, fundação centrada no bem-estar dos jornalistas, busca encorajar os jornalistas a focar no seu próprio bem-estar. Uma das instrutoras da fundação, Aldara Martitegui aponta a pandemia como uma das principais razões para a situação atual. Para ela, muitos jornalistas que não estavam acostumados com coberturas de alto risco de repente se viram em um lugar novo e estranho. "Pela primeira vez, tivemos que informar sobre uma realidade dura e difícil que estava ao mesmo tempo nos afetando", explica. A crise, ela diz, distanciou os jornalistas do mero papel de observador e os transformou em partes afetadas também.

"Muitos de nós vimos que não tínhamos as ferramentas para lidar com uma situação assim", diz Martitegui. "Isso levou os jornalistas a serem mais abertos à possibilidade de [reconhecer que] nos faltam as ferramentas emocionais que não nos ensinam na faculdade." 

Comunicando seus limites

A Self-Investigation, Martitegui explica, tenta criar um espaço para os jornalistas se tornarem cientes das condições nas quais eles funcionam. Isso também diz respeito a identificar o que nós precisamos para exercer o jornalismo no qual acreditamos e fazer isso "de um lugar com clareza mental, em um estado mental calmo, não agitado." 

Martitegui diz que algumas questões podem surgir a partir disso:

  • "É útil eu estar sempre conectado à informação [e] às redes sociais?"
  • "Como isso está afetando minha vida?"
  • "Qual tipo de jornalista eu quero ser?"
  • "Eu posso ser esse jornalista no veículo onde estou trabalhando?" 

Um dos principais desafios que a equipe da Self-Investigation tem testemunhado entre jornalistas é a falta de capacidade de se expressarem. "Vemos muita frustração nos jornalistas que estão sobrecarregados pela quantidade de trabalho que assumem e eles se sentem incapazes de dizer 'chega, já deu, não consigo fazer isso'. Há muito medo", diz.

Isso também acontece com freelancers, que podem temer rejeitar um projeto com medo de que não vão receber um convite novamente.

Gavin concorda. "Realmente, isso se resume a limites e expectativas, e a assegurar que se sabe quais são [os seus]", diz. Jornalistas devem comunicar o que lhes parece correto. "Eles não podem esperar que o parceiro ou chefe ou alguém da equipe magicamente saibam do que precisam." 

O papel da indústria

Gestores devem ser receptivos aos limites e expectativas de seus funcionários e estarem dispostos a discutir o que "faz mais sentido para você como indivíduo ao mesmo tempo em que serve nossa audiência e mantém nosso negócio", diz Gavin.

Esse pode não ser o caso em todos os veículos. Por isso, é importante pesquisar e "identificar as redações que passam por rotatividade de profissionais e aquelas que estão cientes que isso é um problema".

Algumas pessoas em cargos de liderança estão começando a perceber como o estresse está afetando sua equipe. Com os jornalistas fugindo para outras áreas de trabalho, editores reconhecem que estão perdendo talento. "Há uma preocupação porque as pessoas estão realmente experimentando burnout e querem deixar a profissão", diz Martitegui.

Talvez, ela propõe, é isso que está aumentando o interesse de gestores no bem-estar emocional e saúde mental de seus jornalistas. "O jornalismo precisa de jornalistas saudáveis. [Ele precisa facilitar] o estado mental adequado para se fazer jornalismo."

Dicas adicionais

Tire as coisas da sua cabeça

Dedique tempo a escrever o que você está fazendo, como você se sente e como você gostaria que as coisas fossem, recomenda Gavin. "Quando estiver no papel, você pode de fato fazer um pouco mais de análise de uma distância um pouco mais emocional do que quando as coisas estão só martelando na sua cabeça", diz. Pergunte-se: quais desses problemas eu posso tomar uma atitude e influenciar? Quais são as suposições que estou fazendo sobre mim e sobre os outros?

Saiba seu valor

Quanto mais você se conhece, mais você é capaz de se vender como um colaborador valioso. "Quanto mais estratégico você é no desenvolvimento de suas habilidades e do seu portfólio [e] quanto mais estratégico você é na construção da sua rede de contatos, mais você vai ter oportunidades para escolher", diz Gavin.

Seja específico

"Construir nosso vocabulário emocional e nosso conhecimento sobre o que o burnout de fato é, para além da descrição com base nas palavras da moda na cultura pop, é muito útil, pois entendemos o que precisamos fazer", ela acrescenta.

Pratique a assertividade

Há dois ingredientes para isso – respeito e firmeza, diz Martitegui. Ela deu um exemplo para ajudar jornalistas a comunicarem isso: "Entendo que você precisa disso. Eu entendo a sua necessidade, que isso é importante para você. Mas eu não posso fazer isso e não irei fazê-lo porque isso implica que eu não vou descansar."

Converse com colegas

Isso pode ajudar a combater desmotivação e inquietude. "Isso nos ajuda a nos conectarmos novamente com aqueles valores, princípios e objetivos [jornalísticos] e sentirmos aquela chama e paixão pela profissão novamente", diz Martitegui.


Foto por Zac Durant via Unsplash.

Este artigo foi atualizado em 25 de janeiro de 2023.