Verificação de fatos em línguas locais: experiências de países francófonos na África

Jan 23, 2025 em Combate à desinformação
Jeunes africains

Na África, onde muitos idiomas nativos são utilizados, as iniciativas de verificação de fatos normalmente publicam seus conteúdos em formato escrito e primariamente em francês. Mas esses esforços são comprometidos pelos baixos níveis de alfabetização do público-alvo e pelo acesso restrito à internet.

Como resultado, os impactos da verificação de fatos na região seguem limitados. Enquanto isso, a desinformação segue se espalhando

Reconhecendo esse desafio, várias iniciativas de verificação de fatos estão produzindo conteúdo em idiomas locais e em formatos multimídia para se conectar com segmentos mais amplos da população.

Os limites do conteúdo escrito

"A maioria das pessoas não está disposta a ler conteúdo de verificação de fatos", diz Abdoulaye Guindo, coordenador do jornal maliano Benbere, que tem uma seção dedicada à verificação. "Em uma pesquisa, muitos dos respondentes expressaram preferência por conteúdo em áudio ou vídeo em línguas locais."

Desde 2019, o Benbere vem publicando verificações em cinco idiomas locais, incluindo o bambara, que é amplamente falado no sul do Mali; fulfa e dogon, falados nas regiões centrais; e songhay, prevalente no norte. "Nessas regiões, os idiomas locais são mais falados e o rádio é o meio mais popular. Isso nos ajuda a chegar a um número maior de malianos que não estão online", diz Guindo.  

A plataforma La Voix de Mopti, sediada na capital do Mali, Bamako, também usa podcasts para divulgar seu conteúdo de verificação. Em 2023, o veículo produziu podcasts em dois idiomas e os compartilhou em grupos do WhatsApp, explica o diretor editorial Dramé Yacouba. "Os grupos de WhatsApp são um terreno fértil para a difusão de informações falsas no Mali. Nós colaboramos com administradores de grupos do WhatsApp para identificar e desmentir notícias falsas", diz. 

A falta de acesso à internet é outro desafio enfrentado pelos verificadores. Na República Centro-Africana, por exemplo, onde a penetração da internet é muito baixa, o rádio ainda é uma ferramenta de comunicação vital. "Para chegar a essa audiência, nós transmitimos nosso conteúdo em emissoras de rádio no idioma sango, uma das nossas línguas locais", explica Britney Ngalingbo, diretora-executiva da Centrafrique Check.  

No Benin, o site Banouto lançou uma iniciativa de verificação de fatos entre 2021 e 2022 como parte de um programa apoiado pela Organização Internacional da Francofonia. "Nós transmitimos nosso conteúdo através de rádios parceiras", diz o diretor do veículo, Olivier Ribouis. Infelizmente, o projeto foi encerrado em 2023 devido à falta de recursos. "Embora o projeto tenha acabado e não tenhamos mais financiamento, uma das rádios parceiras continuou com a iniciativa de forma independente."

Em Burkina Faso, a Faso Check também recorreu ao rádio. A verificação de fatos da plataforma, feita em quatro idiomas locais, mooré, fula, dyula, e gourmatchema, é distribuída por meio de áudios curtos transmitidos em rádios parceiras. "Às vezes, são as comunidades que entram em cotanto conosco para falar dos temas que elas querem verificar", diz Ange Lévi Jordan Meda, chefe editorial e coordenador de verificação.

Avaliação de impacto

Avaliar o impacto da verificação de fatos pode ser difícil. "A verificação de fatos tem um impacto qualitativo que é difícil de quantificar ou avaliar em termos de tamanho da audiência", diz Ribouis.  

O Faso Check mede sua influência por meio do retorno vindo de clubes de ouvintes de rádio — fóruns nos quais os membros discutem assuntos e compartilham preocupações com rádios parceiras, e na maioria das vezes com transmissão ao vivo. "Com a agitação política e social em Burkina Faso, as pessoas estão cada vez mais cientes de como a desinformação pode prejudicar comunidades", explica Jordan Meda.

O Benbere emprega uma abordagem mais estruturada. "Nós usamos um formulário do Google e mantemos uma base de dados de assinantes", diz Guindo. "Nosso avaliador de monitoramento faz pesquisas após as transmissões do nosso conteúdo e interage diretamente com a audiência para coletar insights."

Impacto do conteúdo em idiomas locais

Os veículos já registraram benefícios animadores gerados pelo trabalho de verificação. No caso do Benbere, no Mali, Guindo observa que a mudança do conteúdo escrito para formatos em vídeo e podcast aumentou o engajamento da audiência significativamente. Isso se refletiu em mais visualizações no Facebook, X e YouTube. 

No Benin, Ribouis destaca as opiniões positivas dos ouvintes como um indicador fundamental do sucesso. "As respostas da nossa audiência eram animadoras. Assim que ouviam o conteúdo verificado, na maioria das vezes os ouvintes expressavam satisfação", diz. O retorno positivo da audiência vem sendo igualmente encorajador para o Centrafrique Check. "Já fazemos o trabalho há três anos e, graças às interações, recebemos mensagens de estímulo do público geral", diz Ngalingbo.

No entanto, apesar dos esforços de verificação, uma parcela significativa da população continua suscetível à disseminação de informações falsas. "Só o trabalho de verificação não é suficiente. O letramento de mídia é essencial para ajudar as comunidades a avaliarem criticamente o conteúdo acessado nas redes sociais", reforça Yacouba.  

Ribouis argumenta que as iniciativas de verificação precisam se expandir: "a falsidade se torna a regra onde a verdade está ausente".


Foto por Joshua Oluwagbemiga via Unsplash. 

Este artigo foi publicado originalmente na IJNet em francês.