A jornalista brasileira Diane Ziemann trabalhava em um jornal local em 2013 quando descobriu que estava grávida. Era um trabalho com muita pressão e Ziemann frequentemente trabalhava por longas horas, já que assumia diferentes funções na redação. Não era o lugar para uma futura mãe, ela pensou.
"Oficialmente eu era editora, mas estava acumulando responsabilidades porque a redação consistia em apenas eu, basicamente", diz.
Assim que Ziemman descobriu que estava grávida, ela decidiu pedir demissão e passou a ser freelancer em tempo integral. Com um bebê prestes a nascer em poucos meses e sem benefícios para apoiá-la naquele momento, ela precisou se organizar financeiramente.
Ziemman trabalhou como freelancer ao longo da gravidez e parou apenas por um mês antes de dar à luz. Ela não recebeu licença-maternidade; em vez disso, dividiu o seu tempo como pôde entre cuidar do filho recém-nascido e continuar com o trabalho freelance.
Hoje, mais e mais profissionais de mídia no Brasil estão se voltando para o trabalho freelance. De fato, três a cada dez brasileiros trabalham como autônomos, um número que cresceu pelo quinto ano seguido em 2021, de acordo com um estudo da Fundação Getúlio Vargas. Porém, freelancers perdem acesso a benefícios valiosos como licença-maternidade e férias, os quais eles receberiam em um emprego de tempo integral.
É aí que entra a Free the Freela, startup brasileira que tem o objetivo de assegurar que freelancers possam receber esses benefícios como parte de sua remuneração. Criada por Sarah Lucena em 2020, a empresa também quer oferecer uma plataforma mais segura e justa para encontrar, ofertar e aceitar trabalho.
Como funciona
A Free the Freela exige que qualquer trabalho acordado por meio da plataforma tenha um contrato assinado, protegendo tanto o freelancer quanto o cliente. Para cada trabalho fechado na plataforma, a Free the Freela cobra o cliente um extra de 10% que é alocado em um fundo para benefícios. Freelancers que tenham feito no mínimo 12 trabalhos intermediados pelo site ao longo de no mínimo seis meses se qualificam para receber os benefícios.
Os freelancers podem tirar férias remuneradas duas vezes ao ano e a licença parental pode ser usada uma vez no ano. O benefício da licença parental é proporcional aos trabalhos que o freelancer pegou através da plataforma. A Free the Freela permite que pais e mães tirem o mesmo tempo de licença. Também há cobertura para adoção e barriga de aluguel.
Valorizando talentos latino-americanos
A Free the Freela também tem o objetivo de se conectar com jornalistas, redatores, produtores de vídeo e designers latino-americanos e mais com clientes no exterior, especialmente nos Estados Unidos e Europa.
Ao facilitar contratos confiáveis e promover remuneração justa, a plataforma espera se tornar uma alternativa a plataformas populares de contratação sob demanda, como UpWork e Fiverr, que Lucena acredita terem levado a uma subvalorização de profissionais freelance.
"A ideia é também aproximar esses talentos latino-americanos de orçamentos melhores, como um orçamento europeu. O cliente paga em [sua] moeda local e o freelancer decide em qual moeda deseja receber", diz.
A Free the Freela também tem focado em clientes durante períodos de crescimento acelerado, como startups e organizações que estejam expandindo suas operações no exterior. A empresa atende clientes que trabalham, por exemplo, no The Economist Intelligence Unit, a divisão de pesquisa e análises do grupo The Economist.
O futuro do mercado freelance no Brasil
Quando Lucena começou a montar a equipe para ajudá-la a criar e administrar a Free the Freela, ela descobriu que países latino-americanos — Chile, Argentina e Uruguai — também estão cada vez mais indo na direção do trabalho freelance. "Muitas pessoas enxergam isso como uma tendência, mas na verdade é uma realidade", diz.
No Brasil, a situação piorou nos últimos anos mesmo para trabalhadores de tempo integral, devido a reformas trabalhistas que falharam em melhorar as condições de trabalho. "Esse processo de desmanche das leis trabalhistas levou muitas pessoas a não verem mais vantagem em contratos de trabalho formal. Não faz sentido mais, mas ao mesmo tempo a outra opção, que seria o trabalho freelance, ainda não é adequada", diz Lucena.
Mesmo assim, a empreendedora brasileira é otimista com o que o trabalho freelance proporciona aos profissionais quando as condições são estabelecidas corretamente. "Esse formato de trabalho mais flexível permite que as pessoas experimentem trabalhar com coisas diferentes para clientes diferentes, mas também proporciona a elas a liberdade e autonomia de ser capaz de construir uma vida que não está mais focada no mundo corporativo, que ainda mantém práticas ultrapassadas", diz Lucena.
A Free the Freela foi selecionada recentemente para um programa de aceleração com a Founder Institute e recebeu investimento da AI Global, empresa europeia de capital de risco e serviços financeiros. Lucena planeja usar o financiamento para expandir as equipes de tecnologia e produto para otimizar o serviço da plataforma. "Nosso plano é nos consolidarmos como a plataforma de referência para profissionais experientes na América Latina", diz.
Foto por Isabela Kronemberger no Unsplash.