O fotógrafo sírio que mostrou uma guerra ao mundo

por Alanna Dvorak
Oct 30, 2018 em Jornalismo multimídia

Karam al-Masri nunca planejou se tornar um jornalista.

Em 2011, o residente de Aleppo era um estudante do segundo ano de direito quando protestos começaram na Síria, após as revoluções no Egito e na Tunísia. Usando seu celular, ele capturou foto e vídeo de manifestações contra o regime de Bashar al-Assad. Quando o conflito virou uma guerra civil, al-Masri continuou seu trabalho, documentando a violência em sua cidade. Ele atualizou seus equipamentos e, depois de entrar em contato com a Agence France-Presse (AFP) em 2013, tornou-se um fotógrafo profissional.

Suas fotografias freelance para a AFP viajaram pelo mundo, aparecendo em organizações como o New York Times, a revista Time, o Washington Post e mais. E logo chegaram os prêmios: a Time colocou uma das suas fotos em sua lista "Top Ten Photos of 2016"; ele ganhou o grande prêmio de fotojornalismo da Fundação Varenne e ficou no terceiro lugar do Prêmio Fotográfio de Instambul 2016.

Mas esses reconhecimentos tiveram um preço. Não só Al-Masri viu sua cidade amada se destruir, mas também sofreu tragédia pessoal e sofrimento.

Em abril de 2011, o governo sírio prendeu Al-Masri pelos posts que fez no Facebook. Detido por um mês, ele permaneceu em prisão solitária e sofreu tortura. "O regime queria que eu dissesse que estava trabalhando para agentes estrangeiros", explicou Al-Masri.

Depois, em novembro de 2013, membros do Estado Islâmico sequestraram e encarceraram al-Masri simplesmente porque ele era um fotógrafo documentando o que estava acontecendo em Aleppo, um pecado grave, de acordo com o ISIS. Novamente, ele ficou num confinamento solitário, sobrevivendo com uma ração de meia fatia de pão e três azeitonas. Quando ele foi libertado seis meses depois, não só encontrou Aleppo devastada, mas descobriu que sua casa tinha sido atingida por uma bomba de barril, que tirou a vida de sua mãe. Semanas depois, outra bomba matou sua tia. Mais tarde, atiradores da Síria o atingiram duas vezes: na perna e na mão.

No entanto, al-Masri voltou a tirar fotos obstinadamente, ainda mais decidido a mostrar ao mundo as atrocidades sofridas por Aleppo, particularmente quando a mídia estrangeira fugiu em meio a sequestradores do ISIS e a violência crescente.

Em dezembro de 2016, ele foi forçado a deixar a Síria e, com a ajuda da AFP, está buscando asilo em Paris. A IJNet conversou com o jornalista de 26 anos e vencedor do Prêmio Knight de Jornalismo Internacional para entender como é cobrir uma crise no terreno.

IJNet:  O que o fez começar a documentar o conflito?

al-Masri: No começo, comecei a fazer vídeos para o meu canal no YouTube. Meus vídeos eram apenas de manifestações, não havia conflitos ou nada assim. Eu queria que o mundo visse o que estava acontecendo na rua porque não havia jornalistas estrangeiros. Os principais meios de comunicação diziam: "Não há nada acontecendo; a Síria está bem; poucos vão a manifestações."

E você continuou a fazer isso depois que a violência começou. Por quê?

A guerra tornou-se uma guerra de verdade, não [mais] protestos ou uma revolução. O regime começou a atacar a população com bombas e mísseis. Tornou-se muito difícil de cobrir. Mas queria que meu trabalho chegasse a todo o mundo. Sem essas imagens e vídeos, talvez o regime matasse todos nas áreas fora do controle de [al-Assad].

Você tinha experiência de fotografia antes da guerra?

Não, não, não. Eu fui autodidata. Olhei para fotos de jornalistas estrangeiros de todo o mundo. E comecei a tirar fotos como elas. Enviava fotos para a AFP e me diziam que não eram boas. E então, com tempo e experiência, tornei-me profissional. Passei três anos tirando fotos. Se você estuda na universidade, levará três, quatro ou cinco anos para aprender fotojornalismo. Eu aprendi nas ruas.

Quais são seus planos para o futuro?

Espero continuar meu trabalho como jornalista. Estou pensando em voltar para o terreno novamente. Vou pedir à AFP para me enviar de volta a uma zona de guerra. Estou entediado em Paris. Eu prefiro ir a algum lugar do Oriente Médio, como o Iraque, o Iêmen, a Líbia, talvez o Bahrein, qualquer zona de guerra.

O que significa para você ganhar o Prêmio Knight de Jornalismo?

Estou muito feliz em receber este prêmio. Isso significa que meu trabalho chegou a pessoas do mundo todo.

Imagem principal sob Alanna Dvorak. Imagem secundária por Karam al-Masri.