Este artigo é parte de nossa cobertura online de reportagem sobre COVID-19. Para ver mais recursos, clique aqui.
No final de março, a Organização Mundial da Saúde desencorajou as pessoas a usar máscaras em público, a menos que apresentassem sintomas semelhantes aos da gripe. Menos de uma semana depois, os Centros de Controle de Doenças dos EUA mudaram essa recomendação.
Em janeiro, quando a COVID-19 estava começado a chegar às costas da Europa e das Américas, o conselho mais difundido era simplesmente lavar as mãos por 20 segundos. Três meses depois, um terço da população mundial está confinada.
Estamos vivendo uma realidade aparentemente extraída de um romance de ficção científica distópica. Agora, as pessoas estão assustadas e procuram respostas. Com muito ainda desconhecido sobre a COVID-19, muitas dessas respostas não estão prontamente disponíveis. Enquanto isso, dados e conselhos de especialistas mudam com frequência.
Conversei com jornalistas da Vox, Mother Jones e New York Times sobre como eles relatam os fatos em constante mudança da pandemia.
[Leia mais: Jornalistas de favelas informam e fazem ações de prevenção contra o novo coronavírus]
Confie nos especialistas que estão fazendo o trabalho
O repórter da Vox, Umair Irfan, escreveu um artigo sobre as dezenas de vacinas em andamento para combater o coronavírus -- exatamente quando os Estados Unidos alcançaram a maioria dos casos confirmados no mundo. Ele e dois colegas reuniram informações dos Institutos Nacionais de Saúde dos EUA, da Coalizão de Inovações em Preparação para Epidemias e do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas, também dos EUA, entre outras instituições e empresas que trabalham para encontrar uma vacina.
Irfan considerou seu relacionamento com pesquisadores, cientistas e profissionais médicos valioso para verificar e desenvolver uma compreensão mais profunda das informações que ele reporta em um artigo. Isto é especialmente verdade quando se trabalha dentro de um prazo.
"Eles estão tão ocupados quanto nós, se não mais", disse Irfan. "Mas, na maioria das vezes, depois de criar um relacionamento com uma fonte, as pessoas são mais receptivas. Isso é bom para uma rápida verificação de fatos aqui e ali."
A jornalista de dados da Mother Jones, Sinduja Rangarajan, também considerou essencial consultar o trabalho realizado por profissionais.
"Dependo muito mais do trabalho de cientistas, epidemiologistas e instituições e seus dados, em vez de coletar dados e fazer toda a análise", disse Rangarajan. "Trata-se de algo para o qual não temos tempo."
[Leia mais: Como escrever sobre perdas humanas durante pandemia de COVID-19]
Cheque os fatos antes do prazo de publicação e entenda que provavelmente mudarão depois que você publicar
Muitas reportagens em torno da COVID-19 incluem estimativas e projeções, desde projeções de mortes até quando as economias serão reabertas. Com tantas variáveis influenciando os números, mesmo uma previsão aparentemente sólida pode ser alterada logo após ser feita.
“Obviamente, eu faço o melhor que posso para ser o mais correto possível”, disse Rangarajan, “mas [olhando as fontes de dados] pude ver que a informação não estava atualizada porque estava mudando muito rapidamente."
Rangarajan toma nota em suas matérias do dia em que os dados foram coletados ou quando as previsões foram feitas e a data em que estão sendo relatadas. Ela não atualiza suas matérias todos os dias; as informações estão mudando tão rapidamente que simplesmente não é viável. É melhor deixar claro em suas matérias que as informações estão sempre sujeitas a alterações, disse ela.
Por sua vez, Irfan tende a não confiar muito nos números. "Eu atualizo as matérias à medida que as informações evoluem, mas, como essa é uma história tão veloz, aprendemos a não usar números de empresas, a menos que sejam absolutamente necessários para a história", disse ele.
Seja honesto com os leitores
Rajangarian prioriza a transparência em suas reportagens sobre a pandemia. "Estou sendo muito franca com o leitor de que essa é uma figura específica que tirei dessa área em particular", disse Rangarajan.
Por exemplo, uma matéria que ela escreveu no início de abril sobre os suprimentos estaduais de hospitais, agora inclui a seguinte nota: o coronavírus é uma notícia de rápido desenvolvimento; portanto, parte do conteúdo deste artigo pode estar desatualizado.
"Se houver algo significativo, eu informarei meus leitores. Mas acho que o mais importante é que eles saibam o que estão vendo. De onde eu peguei esse número? É a partir de hoje? De que fonte? E sou muito, muito transparente”, disse Rajangarian.
Emma Goldberg, pesquisadora do New York Times, concordou. “Estou me certificando de confiar nas informações mais atualizadas e informadas para as minhas reportagens. Mas acho que também é importante que os repórteres sejam claros sobre os limites de nosso próprio conhecimento do que está por vir nessa situação em rápida mudança.”
Linguagem simples é eficaz. "É muito cedo para dizer por que Nova York foi atingida com mais força — e se as primeiras medidas de contenção pelas autoridades da Califórnia estão dando resultado", segundo um artigo que Goldberg e um colega originalmente publicaram em 30 de março e atualizado em 14 de abril.
A pandemia do novo coronavírus é sem dúvida uma situação historicamente única para o mundo. Como jornalistas, estamos trabalhando em um período prolongado e sem precedentes de informações em constante mudança. Sendo assim, nosso dever de reportar os fatos com transparência permanece tão crítico como sempre.
"Estou muito ciente do fato de que essa é uma das histórias que continuaremos cobrindo por um tempo, mesmo depois que tudo estiver sob controle", disse Rangarajan. "No momento, o valor que podemos adicionar é começar a tentar entender o mundo ao nosso redor e como está mudando e divulgando isso. Mas, obviamente, nada está escrito em pedras."
Imagem sob licença CC no Unsplash via Ben Garratt