Como fazer uma cobertura com mais equidade de gênero

Jan 24, 2023 em Diversidade e Inclusão
Three women at a table

O jornalismo ainda é amplamente dominado por homens no mundo todo.

Luba Kassova, escritora, pesquisadora e estrategista de audiência, detalhou esse desequilíbrio em um estudo recente orientado a soluções intitulado From Outrage to Opportunity: How to Include the Missing Perspectives of Women of All Colors in News Leadership and Coverage ("Da Indignação à Oportunidade: Como incluir as perspectivas ausentes de mulheres de todas as etnias na cobertura e liderança jornalística" em tradução livre), encomendado pela Fundação Bill & Melinda Gates. O estudo foca na Índia, no Quênia, na Nigéria, na África do Sul, no Reino e nos Estados Unidos.

Kassova se juntou a Tessy Igomu, chefe da editoria investigativa do Punch Newspapers, da Nigéria, em um webinar recente realizado pelo Fórum de Reportagem de Crises Globais do ICFJ para discutir como jornalistas podem produzir conteúdo com mais equidade de gênero.

 

 

"As mulheres estão sendo sub-representadas na liderança jornalística, como protagonistas na coleta e cobertura de notícias e menos mulheres tendem a consumir notícias", disse Kassova. "Há [muitas] áreas que precisamos acertar para produzir jornalismo com equidade." 

A seguir estão outros pontos principais:

Mulheres na cobertura jornalística

O estudo "Da indignação à oportunidade" examina a representatividade das mulheres na cobertura como colaboradoras, a relevância de reportagens para as mulheres e como elas são retratadas no noticiário. Ele faz isso identificando sete questões estruturais que afetam as mulheres desproporcionalmente em comparação aos homens: renda, saúde, poder, confiança, segurança, autoridade e etarismo.

As descobertas do estudo mostram que a cobertura de questões sobre igualdade de gênero diminuiu desde o começo da pandemia de COVID-19, sem nenhuma grande organização jornalística mensurando sistematicamente como a sua cobertura retrata as mulheres. A participação das mulheres na cobertura da mídia continua atrás dos homens em todos os seis países analisados.

"Nós não devemos sempre olhar para nós mesmas da forma como homens se referem a nós", disse Igomu.

Ao mesmo tempo, a cobertura jornalística das questões estruturais mencionadas acima enfrentadas por mulheres jornalistas é efetivamente ausente. Apenas uma entre 5.000 matérias contém termos relacionados a essas sete disparidades de gênero, enquanto somente uma em 200 matérias contém termos relacionados a gênero.

"Não podemos medir igualdade de gênero somente por meio da representação. Também temos que ver como as mulheres são retratadas, se há um retrato equitativo", disse Kassova. "Há um longo caminho a ser percorrido até que as perspectivas das mulheres sejam ouvidas no jornalismo [e] há muito pouca crítica em relação às questões estruturais que as mulheres enfrentam."

Ela acrescentou: "O que corrobora essa disparidade são normas sociais e a menos que elas sejam desafiadas, a disparidade permanece intacta [e] sem cobertura jornalística."

Mulheres na liderança do jornalismo

A presença de mulheres em cargos de liderança no jornalismo é uma área importante na qual a representatividade está falhando. O estudo de Kassova mostra que as mulheres são sub-representadas na maioria dos cargos de liderança editorial de nível sênior, principalmente em editoriais de mais relevância, como saúde, economia e negócios, relações internacionais e política.

"Essa cultura sobre o que constitui uma notícia é muito dominada por homens", disse Kassova. "Por isso é importante ver quem está editando as notícias." 

Mulheres em cargos editoriais de nível sênior enfrentam barreiras fundamentais que enfraquecem suas vozes. A relativa falta de mulheres em cargos similares, bem como a persistência de normas sociais que frequentemente determinam quais gêneros cobrem quais assuntos, estão entre os principais obstáculos que as mulheres líderes no jornalismo enfrentam.

Mulheres negras na África do Sul, nos Estados Unidos e Reino Unido são significativamente mais marginalizadas que outras mulheres devido ao racismo estrutural e a falta de suporte para seu crescimento na carreira, de acordo com o estudo.

A maioria dos editores entrevistados também afirmaram que acabar com a diferença salarial que afeta as mulheres deveria ser uma prioridade em detrimento de medidas de equidade. Isso inclui, por exemplo, acabar com a disparidade de segurança, apesar da realidade segundo a qual mulheres jornalistas enfrentam mais preocupações com a segurança no trabalho do que os colegas do sexo masculino. 

O caminho para uma cobertura com mais equidade de gênero

A cobertura pode se tornar mais equitativa por meio de uma variedade de medidas. Introduzir narrativas inclusivas, criar uma editoria de raça ou gênero, aumentar a cobertura das sete disparidades de gênero mencionadas acima, mensurar como as mulheres são retratadas em determinado veículo e focar em audiências femininas são todos passos concretos que podem ter um impacto. 

"Esta é uma grande oportunidade para jornalistas produzirem uma cobertura mais equitativa e atraírem uma audiência mais feminina para reduzir a disparidade de gênero e aumentar sua receita", disse Kassova. O problema não vai ser resolvido só com a contratação de mais mulheres; é preciso haver intervenções em todas as partes da cadeia de valor do jornalismo."

Apesar desses desafios, Igomu destacou que as mulheres devem permanecer determinadas a fazerem parte da mudança de perspectivas no noticiário.

Até que esses desafios sejam superados, ela disse, "a possibilidade de nós de fato ocuparmos esses altos cargos pelos quais temos lutado é pequena." 


Foto por Christina @ wocintechchat.com via Unsplash.