Correspondente na Venezuela por vários anos, o jornalista francês Jean-Baptiste Mouttet testemunhou diretamente a desconfiança dos cidadãos em relação à mídia. "Muitos leitores não confiavam em mim porque estava fazendo matérias sobre tortura e política econômica", diz.
Mas ao participar como palestrante em conferências sobre a Venezuela na França, Mouttet observou menos desconfiança da audiência diante de seu trabalho em comparação com a desconfiança que ele havia vivenciado em relação à sua escrita, o que ele atribuiu às características ao vivo do evento. "Foi muito melhor, porque a audiência entendeu de onde minhas fontes vinham e o trabalho que eu tinha feito", diz.
Mouttet também percebeu a falta de conexão de seus amigos em relação à grande mídia. "Eles não se sentiam legítimos o bastante para lerem o Le Monde, por exemplo. A tipografia, o layout, tudo isso pode transmitir uma sensação elitista que pode ser assustadora", diz. "Eu comecei a pensar sobre como eu poderia informá-los e foi mais fácil convidá-los para um evento onde nós poderíamos falar sobre notícias bebendo algo."
Atualmente, mais da metade dos franceses são céticos em relação às notícias que consomem; dúvidas sobre os vieses e independência dos jornalistas estão entre os fatores que contribuem para isso.
Em um esforço para desenvolver a confiança do público, tornar o jornalismo mais acessível e se aproximar mais da audiência, Mouttet lançou em setembro de 2022 o Mediavivant, ou "Mídia Ao Vivo", uma iniciativa de jornalismo ao vivo em Marseille.
Matérias ao vivo
Todos os meses, o Mediavivant convida um jornalista de Marseille para apresentar uma matéria que tenha produzido, sobre assuntos que abrangem notícias locais, nacionais e internacionais. Em uma apresentação recente, por exemplo, um jornalista destacou uma investigação sobre a poluição de uma área industrial próxima a Marseille.
Por cerca de 45 minutos, os jornalistas apresentam suas matérias, mostrando documentos de apoio e materiais visuais, conforme necessário. Eles também podem entrevistar especialistas como historiadores, advogados e testemunhas de algum acontecimento. Após as apresentações, a equipe do Mediavivant faz a moderação de debates entre o público, os jornalistas e suas fontes. No momento dessas discussões, os jornalistas e entrevistados deixam o palco para se sentarem de frente para a audiência. "Queremos que as pessoas se sintam legitimadas a fazerem perguntas. É por isso que saímos do palco, para ficar de igual para igual", diz Mouttet.
Em julho de 2021, Mouttet apresentou pela primeira vez uma matéria produzida por ele, intitulada Marseille: 1943, sobre a deportação de imigrantes e judeus em Marseille por autoridades nazistas e francesas em 1943. Quando ele repetiu a apresentação dessa matéria em fevereiro de 2023, Mouttet destacou a importância do local de onde estava falando com seu público.
"A área em que estamos hoje foi destruída depois das buscas", ele diz, explicando como mais de 20.000 pessoas foram abordadas e expulsas de suas casas, incluindo 700 que foram depois deportadas para campos de concentração. Os nazistas destruíram vizinhanças, deixando poucas lembranças físicas das deportações ou da memória dos eventos – uma questão que a apresentação de jornalismo ao vivo tinha o objetivo de remediar.
"É interessante ver que, para cada matéria, as reações do público são diferentes. Por exemplo, com a matéria Marseille: 1943 [apresentada diante de sobreviventes do episódio], nós sentimos que as pessoas estavam dando depoimentos", diz Mouttet. "Enquanto que com a matéria sobre poluição, tivemos perguntas de moradores que queriam ter mais detalhes sobre as consequências em sua saúde."
Envolvimento dos jovens
Para curar a relação complicada entre a mídia e o público e ser mais atrativo para os mais jovens, o Mediavivant também realiza projetos de letramento midiático. Entre os esforços estão duas parcerias com escolas de Ensino Médio na região de Marseille, e um futuro projeto de letramento midiático com uma prisão da área.
"A ideia é dar às pessoas as ferramentas para fazer suas próprias investigações", diz Mouttet. "Quando os estudantes fazem suas próprias matérias, é trabalho deles demonstrar como obtiveram a informação. Isso faz com que eles tenham que ir atrás e verificar a informação." Um dos grupos de Ensino Médio apresentou sua reportagem investigativa ao público no fim de março.
Letramento de mídia e de informação
Mouttet acredita que as matérias ao vivo podem ser vistas como uma ferramenta de letramento de mídia e de informação. Por exemplo, durante a apresentação sobre as deportações em Marseille, Mouttet mostrou imagens arquivadas das deportações, ao mesmo tempo em que destacou que elas foram tiradas pelos soldados nazistas, refletindo assim o ponto de vista dos soldados sobre a operação. Com isso, ele enfatizou a importância de questionar a origem da documentação de apoio.
O Mediavivant quer ser mais atrativo para pessoas que normalmente não acompanham o noticiário. Tudo, da escolha do local à estratégia de comunicação, é voltado para esse objetivo. Por exemplo, a equipe usa panfletos, pôsteres e eventos do Facebook para promover as apresentações. No podcast Mediarama, Alix de Crécy, chefe de estratégia digital e desenvolvimento, explicou que ela teve que romper com "todos os pré-requisitos que aprendeu trabalhando com a grande mídia."
"Eu sempre trabalhei em redações que têm um DNA muito forte e são muito conhecidas", diz Crécy. "Estamos aprendendo como introduzir esse DNA, fazer com que sejamos compreendidos."
No futuro, o Mediavivant espera levar a iniciativa para outras cidades na França. "Por que não fazer lançamentos em outros lugares?", diz Mouttet.
Foto por Miguel Henriques via Unsplash.