Jornalistas do Quirguistão buscam música e poesia para alcançar audiência

Dec 17, 2024 em Inovação da mídia
Национальные певцы акыны сидят со своими музыкальными инструментами на фоне гор

No Quirguistão, jornalistas estão unindo forças com os akyns — cantores, contadores de histórias e poetas que improvisam e desempenham um importante papel na sociedade ao transmitirem a história oral de suas comunidades — para alcançar uma audiência maior e gerar impactos tangíveis.

Historicamente, os akyns são como os "influenciadores" do Quirguistão, explica a etnógrafa quirguiz Saadatkan Muratova. "Eles conscientizam sobre as questões mais importantes e suas músicas fazem as pessoas refletirem, chorarem, rirem e agirem", diz. Na maioria dos casos, os akyns conhecem a fundo uma gama variada de temas, têm experiência de vida significativa e percepção aguçada.

As chamadas aytysh, competições musicais entre os akyns, que são historicamente populares no Quirguistão e no Cazaquistão, na Ásia Central, estão aumentando sua popularidade atualmente, diz Nurbek Talantbekov, diretor do Teatro Nacional Manas. "Os shows se esgotam em questão de semanas."

O uso ativo que os akyns fazem das redes sociais está os ajudando a encontrar novas audiências. Por exemplo, o akyn Aaly Tutkuchev tem mais de 100.000 seguidores no Instagram; já o akyn Bayan Akmatov tem mais de 74.000 assinantes em seu canal no YouTube.

 

III ежегодный айтыш
A terceira aytysh anual foi realizada em Osh, no Quirguistão, em setembro de 2024, com o tema "Linguagem, Cultura e Patrimônio". Foto cedida pelo Media-K, um projeto da Internews Quirguistão

 

Uma colaboração recente entre o canal quirguiz de jornalismo investigativo Temirov Live e o grupo criativo Ayt Ayt Dese é um exemplo de como os jornalistas estão cada vez mais se valendo do papel tradicional dos akyns na sociedade quirguiz para chegar a novas audiências e divulgar os resultados de suas investigações.

"Nós queríamos achar um jeito melhor de manter as pessoas informadas. Minha esposa viu que no passado os akyns desempenhavam o papel dos jornalistas. Eles eram corajosos e sinceros em relação aos problemas sociais e aos defeitos de quem estava no poder", diz Bolot Temirov, fundador do Temirov Live. 

"Foi aí que tivemos a ideia de trazer a função histórica deles de volta à vida."

Trabalho conjunto de jornalistas e akyns

Na colaboração entre o Temirov Live e o Ayt Ayt Dese, os akyns incorporam as investigações jornalísticas do canal às suas músicas — no estilo de cantos tradicionais — e publicam o conteúdo em seus canais. Por exemplo, os akyns criaram uma composição inspirada em uma investigação do Temirov Live sobre Akylbek Zhaparov, o então vice-presidente do Gabinete dos Ministros do Quirguistão e suas ligações com paraísos fiscais em Malta.

Antes da colaboração, a maior parte da audiência do Temirov Live residia em áreas urbanas, diz Temirov, mas o trabalho com o Ayt Ayt Dese ajudou os jornalistas a atraírem pessoas de áreas rurais.

No entanto, o projeto também chamou a atenção das autoridades. No início deste ano, 11 jornalistas do Temirov Live e membros do Ayt Ayt Dese foram detidos. Em outubro, Makhabat Tazhibek foi condenada a seis anos de prisão e o akyn Azamat Ishenbekov condenado a cinco anos sob a acusação de que os materiais publicados pelo Temirov Live e o Ayt Ayt Dese continham convocações para protestos e rebeliões em massa.

Temirov acredita que as prisões estão ligadas ao trabalho de sua equipe. "Este não é um veredito para nós, é um veredito para as autoridades", diz. "Eles deixaram as máscaras caírem e não têm mais o direito moral ou legal de dizer que há liberdade de expressão no Quirguistão."

Tradição e inovação

Outros veículos também já fizeram parcerias com akyns.

Há cerca de três anos, por exemplo, a Internews no Quirguistão lançou o programa Bilim Aytysh para treinar akyns em letramento de mídia, produção de fotos e vídeos com celular e marketing nas redes sociais. A inciativa, conforme explica a coordenadora do projeto, Maksuda Aytyeva, ajudou 21 akyns a dominarem novas tecnologias e promoverem seu conteúdo. "Mas nós não nos envolvemos na escolha dos assuntos de suas apresentações", diz. "O akynismo e o improviso são um dom especial e a missão dos akyns é entregar uma determinada mensagem para os seus contemporâneos."

A pedido dos akyns que participaram do projeto, a Internews no Quirguistão deu continuidade ao treinamento e realizou uma "competição dedicada ao conhecimento" com temas sobre letramento de mídia e assuntos de gênero. 

Com o papel dos akyns como influenciadores crescendo rapidamente, Nazik Chekirova, diretora da Internews no Quirguistão, alerta que esse desenvolvimento também traz o risco da disseminação de desinformação. "Infelizmente, há partidos que tentam usar esse grande recurso para impor suas narrativas", diz.  

Apesar dessa preocupação, o akyn Bayan Akmatov, participante da competição Bilim Aytysh, diz que a mentoria recebida de akyns mais experientes o ajudou a aprimorar suas próprias habilidades enquanto aprendia sobre letramento digital.

"Antes do projeto, eu não estava ciente dos perigos da desinformação", diz Akmatov. "As habilidades e o conhecimento que eu ganhei me ajudaram a avaliar as informações. Além disso, muitos akyns aprenderam a administrar melhor suas páginas pessoais nas redes sociais."  


Imagem principal: ilustração de Asyl Osmonalieva.

Este artigo foi originalmente publicado no site em russo da IJNet.