Jornalistas cobrem impacto da COVID-19 entre trabalhadores migrantes na Cingapura

Nov 18, 2020 em Reportagem sobre COVID-19
Interior de um alojamento onde trabalhadores migrantes ficaram isolados durante COVID-19

Quando a COVID-19 explodiu na Cingapura no início de 2020, o país fechou. Os trabalhadores migrantes, que representam mais de 20% da população, geralmente vivem em dormitórios. Quando o país entrou em confinamento, esses trabalhadores ficaram isolados em seus pequenos quartos com acesso limitado a recursos e um medo constante de contrair o vírus em ambientes fechados.

Os ativistas chamaram esta de a maior crise humanitária da Cingapura, e os jornalistas rapidamente começaram a trabalhar para iluminar as condições horríveis desses trabalhadores.

Os repórteres Toh Ee Ming e Kelly Ng estavam entre os jornalistas que decidiram cobrir o assunto.

“Queria ver como poderíamos acrescentar algo ao tema, mas havia um excesso de saturação de informações. Estávamos tentando encontrar uma nova maneira de acrescentar algo à história. Na época, não havia muita informação sobre o aspecto da saúde mental”, disse Ee Ming. “Queríamos mostrar como, incluindo as formas mais leves, os trabalhadores migrantes estavam enfrentando as condições desodoras."

[Leia mais: Cobrindo o impacto da pandemia na comunidade surda no Haiti]

 

Sua reportagem, que documenta as histórias de trabalhadores migrantes que moravam em dormitórios na Cingapura durante a COVID-19, foi publicada no Southeast Asia Globe em outubro. A matéria se concentra especificamente no custo psicológico do isolamento e foi selecionada como uma das principais reportagens compartilhadas em outubro no Fórum de Reportagem sobre a Crise Global de Saúde, um projeto criado pela IJNet e nossa organização mãe, o Centro Internacional para Jornalistas (ICFJ, em inglês).

Migrant workers living in dorms line up to receive food
Trabalhadores migrantes que vivem em dormitórios fazem fila para receber alimentos. Foto cortesia de Islam Rockybul. 

 

"Esta matéria foi, antes de mais nada, uma história humana abordando um problema muito real apenas exacerbado pela pandemia. A variedade de ângulos diferentes que os repórteres cobriram, incluindo as vozes dos próprios migrantes, mais as fotos impressionantes, resultaram em uma reportagem longa e interessante", disse a diretora de engajamento comunitário do ICFJ, Stella Roque.

Ambos os repórteres cobriram trabalhadores migrantes no passado, o que lhes permitiu utilizar contatos já estabelecidos com trabalhadores em dormitórios onde a comunicação pode ser difícil. Os jornalistas também usaram a mídia social para se conectar com a comunidade de trabalhadores migrantes que, como outros, recorreram à tecnologia para se manter em contato.

“Como a Cingapura estava em confinamento, só podíamos nos comunicar com eles por meio de mensagens de texto ou telefonemas, o que acho um pouco lamentável em parte”, disse Ng. "Eu realmente gostaria de poder me encontrar cara a cara."

[Leia mais: 12 aplicativos para gravar entrevistas remotas]

 

Pessoas que moram nos dormitórios relataram se sentirem presos devido às condições insalubres de moradia, má qualidade da alimentação e isolamento. Reconhecer o estresse mental que essas circunstâncias criaram -- junto com o medo de pegar o vírus -- era uma prioridade para Ng e Ee Ming.

“A pandemia, em geral, acaba sendo um evento muito angustiante para muitos de nós, e acho que ainda mais para esses trabalhadores migrantes de baixa remuneração, porque não é segredo que suas condições de vida não são as melhores”, disse Ng. “Eles foram um dos primeiros [grupos] a serem confinados e por períodos de tempo ainda mais longos com condições muito mais restritivas do que o resto de nós.”

Esta matéria ajudou os jornalistas a iluminar a situação dos trabalhadores migrantes, ao mesmo tempo que demonstrou a resiliência e o compromisso dos trabalhadores uns com os outros, que muitas vezes podem ser perdidos em narrativas de vitimização.

Islam Rockybul does yoga in the dorms.
O trabalhador migrante Islam Rockybul faz ioga, o que às vezes faz em chamadas de vídeo com sua esposa. Imagem cortesia de Islam Rockybul.

 

Por exemplo, Islam Rockybul, um trabalhador migrante e coordenador de segurança entrevistado para a matéria, faz videochamadas com mais de 100 trabalhadores que supervisiona e com suas famílias para manterem contato. Ele e sua esposa em Bangladesh também fazem videochamadas para praticar ioga juntos.

Zakir Hossain Khokan, outro trabalhador migrante entrevistado para a matéria, foi diagnosticado com o vírus em abril. No entanto, isso não o impediu de coordenar doações de produtos de higiene e materiais de leitura de sua cama de hospital. Ee Ming o entrevistou por mensagens de voz, mas ela disse que foi difícil enviar apenas uma pergunta e resposta por vez.

Zakir Hossain Khokan shares an image of himself in the hospital after contracting COVID-19
Zakir Hossain Khokan compartilha esta foto de si mesmo no hospital após contrair COVID-19. No entanto, ele continuou a ajudar a coordenar doações essenciais. Imagem cortesia de Zakir Hossain Khokan.

 

Após a publicação, um amigo que trabalha como médico para comunidades migrantes incentivou Ng e Ee Ming a compilar uma lista de recursos para trabalhadores migrantes, uma vez que as informações de organizações não governamentais podem ser escassas. O recurso resultante se chama Dear Migrant Brothers e está disponível para download pelos trabalhadores via código QR.

Apesar do reconhecimento das condições precárias que os trabalhadores receberam durante a pandemia, alguns estão preocupados que haverá pouco efeito duradouro na forma como as comunidades de migrantes vivem em dormitórios superlotados.

“Muitos deles mencionaram que sentiram que o ciclo de notícias havia mudado”, disse Ee Ming. “Eles se sentem meio desiludidos porque parece ter voltado ao normal, [mas] eles ainda estão amontoados em dormitórios de oito a 20 homens, e ainda estão amontoados na parte de trás dos caminhões.”

Ela acrescentou: “Um trabalhador disse que acha que não aprendemos nada com a COVID-19, o que foi muito assustador para mim.”


Todas as imagens neste artigo são cortesia de Toh Ee Ming e Kelly Ng.

Chanté Russell, formada recentemente pela Universidade Howard, é estagiária em programas do Centro Internacional para Jornalistas (ICFJ, em inglês).