Jornalista na Guatemala preso há um ano e a imprensa continua sob ataque

Aug 1, 2023 em Liberdade de imprensa
Flag of Guatemala

Assassinar jornalistas pode custar caro. Pode atrair atenção demais.

Ser criativo com a lei para fazer jornalistas desaparecerem e interromper o trabalho deles, nem tanto.

Hoje, cada vez mais, autocratas como Alejandro Giammattei, na Guatemala, tiram proveito de medidas legais para reprimir a mídia independente. Isso dá a eles uma aparente cobertura que outras medidas mais linha-dura não poderiam oferecer.

No último ano, o caso de Jose Rubén Zamora na Guatemala tem sido emblemático desse tipo de repressão contra jornalistas e redações que tem se enraizado no mundo todo. Preso em julho de 2022 por acusações falsas, Zamora passou os últimos doze meses atrás das grades em um esforço das autoridades guatemaltecas de sufocar seu trabalho.

"O governo – a administração Alejandro Giammattei – o manteve refém por 365 dias", disse o filho de Zamora, José Zamora, em uma coletiva de imprensa realizada na última quarta-feira pelo Comitê de Proteção aos Jornalistas (CPJ) para marcar o aniversário da prisão. 

 

Journalism is not a crime: José Rubén Zamora flyer

 

Depois de três meses de prisão preventiva e um julgamento durante o qual seus advogados foram perseguidos, Jose Rubén Zamora foi condenado e sentenciado a seis anos de prisão no mês passado por acusações de lavagem de dinheiro. O veículo dele, elPeriódico, foi forçado a fechar as portas em maio devido a pressões financeiras e legais exercidas pelo governo.

"Eles o prenderam injustamente por acusações espúrias e o fizeram enfrentar esse processo que é uma absoluta violação do devido processo legal, e isso precisa ter um fim", disse o filho de Zamora, que é chefe de comunicação e impacto no Exile Content Studio.

Também estiveram junto dele na coletiva de quarta-feira Bertha Michelle Mendoza, jornalista guatemalteca exilada, e Carlos Martínez de la Serna, diretor de programas do CPJ. Sara Fischer, repórter sênior da Axios, moderou o evento. 

A Guatemala é a única democracia na América Latina com um jornalista na prisão, observou Zamora. Sob o governo Giammattei, foram registrados mais de 750 ataques contra jornalistas. Pelo menos 20 jornalistas guatemaltecos fugiram do país. 

"[Giammattei] tem poder sobre todas as instituições", alertou Mendoza. "Ele tem os tribunais – a Suprema Corte, a Corte Constitucional, o Tribunal Superior Eleitoral, a Procuradoria Geral – os quais está usando para perseguir e prender injustamente não só jornalistas mas também operadores judiciais, ativistas, defensores de direitos humanos e até cientistas políticos que dizem coisas que vão contra a narrativa que ele quer impor." 

Devido ao seu trabalho, Mendoza se tornou ao longo dos anos um alvo frequente de ataques, tanto online quanto presencialmente. Ela se exilou nos Estados Unidos depois de investigar Giammattei por supostos subornos de contratantes do estado, resultando em matérias publicadas na CNN em espanhol e no El Faro em fevereiro de 2022. Ela explica que fugiu depois que Jose Rubén Zamora a alertou que a procuradoria-geral parecia ter a intenção de prendê-la.

"O país está passando no momento por uma crise histórica, graças à ditadura de Alejandro Giammattei, que forçou dúzias de jornalistas, operadores judiciais e defensores de direitos humanos a fugirem", disse. "Outros seguem no país sob terríveis ameaças de serem perseguidos por simplesmente dizerem a verdade."

Uma resposta mais firme e consistente da comunidade internacional à repressão do governo Giammattei contra jornalistas é imperativa, instaram os participantes.

A administração Trump, em particular, fortaleceu os esforços anti-imprensa e enfraqueceu a mídia pelo mundo, disse Martinez de la Serna. "Precisamos perguntar a nós mesmos se teríamos visto isso acontecer se os governos [...] fossem consistentes na defesa da liberdade de imprensa no mundo."

Ele ainda advertiu que a resposta à prisão de Zamora no ano passado foi muito lenta. É preciso deixar claro que a situação atual é inaceitável.

"Toda a situação da liberdade de imprensa na América Central está em jogo", disse Martinez de la Serna. "Na Guatemala, em Honduras, em El Salvador. Até na Costa Rica há alguns sinais preocupantes disso, apesar de a situação ser diferente. Exigir a libertação – a justiça devida no caso de Rubén Zamora – é uma mensagem essencial para o futuro da região."

O filho de Zamora fez coro a essas preocupações, as quais ele chamou de "efeito dominó". 

"Nós temos visto isso no mundo todo, da Rússia às Filipinas, Venezuela, Nicarágua, El Salvador, México e Guatemala", disse.

As eleições iminentes no mês que vem oferecem algum motivo para otimismo, apesar de estarem envoltas em incerteza. Em um resultado inesperado, o candidato anticorrupção Bernardo Arévalo do Partido Semilla avançou para o segundo turno em 20 de agosto, contra a ex-primeira dama de direita, Sandra Torres, do partido Unidad Nacional de la Esperanza (UNE). Esforços para rejeitar os resultados do primeiro turno das eleições foram condenados por observadores independentes e provocaram protestos no país.   

"Há um feixe de esperança hoje em relação ao Semilla e há também um despertar do povo guatemalteco precisamente porque esse pequeno grupo de funcionários corruptos deram mais visibilidade ao candidato do Semilla", disse Mendonza. "O candidato, Bernardo Arévalo, tem uma plataforma anticorrupção e se essa plataforma ganhar, definitivamente haverá mudança."

Enquanto isso, jornalistas precisam continuar com seu trabalho, reforçou Zamora. "Garantam que essas matérias não parem e que esses regimes repressores saibam que o mundo está de olho."


José Zamora é membro do conselho de diretores do ICFJ.

Foto por Shalom de León via Unsplash.