O que o jornal O Globo, fundado há 94 anos, e o BuzzFeed Brasil, fundado há cinco anos, têm em comum? Recentemente, é um esforço conjunto para aumentar a produção de vídeo para impulsionar o engajamento.
Os dois veículos —um que floresceu por quase um século como uma fonte de notícias exclusivamente impressa e o outro um meio digital desde o início— tomaram decisões editoriais estratégicas para impulsionar seu conteúdo em vídeo. O Globo está produzindo vídeos de notícias em estilo de documentário, enquanto o BuzzFeed Brasil se uniu à sua equipe do BuzzFeed Vozes para produzir conteúdo de vídeo que reflete a diversidade das comunidades que eles pretendem alcançar.
O Globo
Claro, O Globo é um dos principais veículos de notícias do Brasil há quase 100 anos, com circulação combinada de impresso e digital superior a 330.000 hoje — a principal publicação do país no final de 2019.
Mas isso por si só não garantiu seu sucesso na produção de vídeo. Afinal, enquanto hoje seu foco principal é digital, o DNA de O Globo é de um jornal impresso, disse o editor executivo André Miranda à IJNet. "Como um jornal impresso pode se transformar em uma empresa de produção de vídeo?", ele se perguntou. "Como consegue ser rentável?"
O Globo começou a produzir conteúdo de vídeo há cerca de 15 anos e, em 2010, o jornal criou um departamento de vídeo. A nova equipe começou a publicar vídeos de mídia social de um minuto, concentrando sua distribuição no Facebook. No entanto, estabelecer uma estratégia de conteúdo coerente era difícil.
“Foi um desafio, porque sabemos que quando você tem apenas um tópico em sua produção, é mais fácil encontrar uma audiência na internet. Mas não podemos fazer isso porque somos um jornal de 94 anos. Nós cobrimos todos os assuntos e não podemos mudar isso agora", disse Miranda.
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Com a esperança de alcançar novos públicos, O Globo reformulou sua estratégia de vídeo em 2017. O jornal voltou sua atenção para o YouTube e começou a produzir vídeos de notícias documentais, aprofundando as questões. Os vídeos variam de apenas alguns minutos até 30 minutos.
No final de 2017, por exemplo, O Globo publicou “A guerra brasileira”, um documentário animado que discute o alto índice de violência no país. Durante a eleição presidencial de 2018 no Brasil, O Globo criou uma série com o ator Marcelo Adnet que usou humor para cobrir o período altamente polêmico e polarizado do país. A série obteve mais de 40 milhões de visualizações no YouTube, Facebook e em seu site de notícias, segundo Miranda.
A abordagem de O Globo se situa em algum lugar entre o típico jornal de TV e o cinema, destinado a atrair usuários na internet, onde se encontra a maioria dos consumidores de notícias atualmente. “Tentamos pegar nossa experiência de jornalismo e transformá-la; usar nossa experiência de jornalismo de uma forma mais próxima de uma narrativa documental”, afirmou Miranda. O Globo conseguiu patrocinadores para seus vídeos e os exibiu nos cinemas como parte de sua estratégia de lançamento.
Antes da reformulação, o canal de O Globo no YouTube tinha apenas 4.000 assinantes, observou Miranda. Hoje, o canal tem mais de 335.000 assinantes. Aproveitando esse crescimento, O Globo publica links para artigos relacionados em seu site em todos os vídeos postados no YouTube que melhoram o tráfego para o site. Eles também incorporam vídeos em artigos relacionados, ajudando a aumentar o tempo que os leitores passam no site, explicou Miranda.
Mais significativamente para O Globo, os vídeos atraem um público mais jovem para o site. Embora 36% dos leitores do site tenham menos de 35 anos, isso aumenta para 57% com o público do YouTube. O Globo usa os vídeos para canalizar os espectadores mais jovens para os outros produtos do jornal, convertendo esse tráfego em assinaturas.
Miranda disse: "Nosso objetivo é atrair esses assinantes."
BuzzFeed Brasil
O lançamento da nova marca de diversidade do BuzzFeed Brasil, o BuzzFeed Vozes, no ano passado ofereceu ao meio uma oportunidade de colaboração estratégica: diversificar seu conteúdo de vídeo e levantar o Vozes do chão.
“Tentamos cobrir algo novo porque era o começo do BuzzFeed Vozes”, disse Camila Sá, gerente de projetos editoriais. Dirigido por jornalistas não brancos, o Vozes publica conteúdo no Facebook e Instagram com o objetivo de alcançar os brasileiros de minorias diversas. A incorporação de vídeo na estratégia da nova marca apresentou um potencial atraente. "Queríamos fazer algo que fizesse sentido para o público, que fosse mais próximo deles e falasse a mesma língua."
Em setembro, o BuzzFeed Brasil e Vozes produziram uma série de mini-documentários em três partes, A Voz Delas, destacando as artistas brasileiras de hip hop Sharylaine, Negra Li e Tasha e Tracie Okereke. “[O hip hop é] principalmente um ambiente controlado por homens. Os homens decidem tudo e têm as letras famosas, têm os salários mais altos e tudo mais”, disse Sá. "Achamos que seria muito emocionante falar sobre as vozes das mulheres nesse ambiente."
Os três vídeos, todos com menos de 10 minutos, alcançaram 43% de participação no Facebook, segundo Sá. O envolvimento médio de vídeos no Facebook geralmente cai abaixo de 6%.
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Em novembro, a equipe de vídeo lançou outra série popular de mini-documentários sobre a realeza africana que viveu no Brasil durante a escravidão. A série teve um aumento de 78% em relação ao engajamento típico em vídeo do site, disse Priscila Mendes, da equipe criativa.
Por meio do Vozes, o BuzzFeed Brasil continua experimentando diferentes formatos de vídeo para estimular o engajamento. Recentemente, eles lançaram uma série quinzenal sobre a cultura pop brasileira, a Hitosfera, inspirada nos famosos artigos de listas do BuzzFeed. A série apresenta episódios curtos sobre as principais séries de TV da década passada e "notícias que fizeram que 2019 não fosse um desastre total".
Eles também publicam vídeos curtos que a equipe chama de "curtas sociais", como este de Péricles, um famoso cantor brasileiro fazendo um movimento de dança brega funk. Os vídeos são inspirados ou destinados a serem usados como memes da internet. Eles costumam ter desempenho acima da média, disse Mendes.
O BuzzFeed Brasil produz três vídeos por semana, incluindo um vídeo semanal do Vozes. No geral, o engajamento em vídeo do canal gira em torno da média do Facebook, entre 3% e 6%. A experiência com o conteúdo do Vozes, no entanto, ofereceu à equipe uma ideia do que é possível com o conteúdo de vídeo estratégico adaptado às redes sociais.
"O BuzzFeed Vozes não é apenas uma plataforma que nos deu voz", disse Sá. "É algo que também podemos usar para informar e ajudar a dar voz às pessoas."
Ambos Globo e BuzzFeed Brasil participaram do acelerador de vídeo do Facebook Journalism Project em São Paulo, coordenado pelo Centro Internacional para Jornalistas, um parceiro do Facebook.
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