Dicas para reportagem sobre migração durante a pandemia

por Lucía Ballon-Becerra
Apr 6, 2021 em Reportagem sobre COVID-19
Globo

Em parceria com a nossa organização-matriz, o Centro Internacional para Jornalistas (ICFJ, em inglês), a IJNet está conectando jornalistas com especialistas em saúde e líderes de redação por meio de uma série de seminários online sobre COVID-19. A série faz parte do Fórum de Reportagem sobre a Crise Global de Saúde do ICFJ em inglês, espanhol, português e francês.

Este artigo faz parte de nossa cobertura online sobre COVID-19. Para ver mais recursos, clique aqui.


A COVID-19 resultou em consequências econômicas e de saúde devastadoras para muitas pessoas em todo o mundo — especialmente para as mais vulneráveis.

As populações migrantes, fugindo das adversidades em casa, enfrentaram riscos elevados em suas viagens em busca de melhores oportunidades. Há mais desempregados e muitos ficaram detidos no meio do caminho. Ao mesmo tempo, muitos migrantes estiveram na linha de frente na luta contra o vírus.

“Olhe ao seu redor”, disse Yasmina Guerda, oficial de comunicações de saúde pública da Organização Internacional para as Migrações (IOM, em inglês). “Os migrantes estão por toda parte [e] — onde quer que estejam— estão buscando soluções [para a crise de COVID-19]. ”

Como os jornalistas devem abordar o tema migração durante a pandemia? Quais são as questões em torno da migração que os repórteres devem esclarecer?

O gerente da comunidade do Fórum de Reportagem sobre a Crise Global de Saúde do ICFJPaul Adepoju, conversou com Guerda e Saskia Kok, chefe de proteção e assistência a migrantes da IOM na Nigéria, para discutir os esforços da organização, compartilhar dicas sobre cobertura de migração e destacar recursos úteis de reportagem.

 

Aqui estão algumas lições importantes do webinar.

Sobre a IOM e como funciona

  • A IOM é uma organização intergovernamental, associada à ONU, que trabalha em escritórios em todo o mundo para fornecer assistência humanitária a migrantes e aconselhar governos sobre a gestão da migração.
    Os programas nacionais da IOM fornecem reintegração sustentável e apoio à reabilitação para migrantes que retornam. Eles ajudam migrantes vulneráveis, incluindo requerentes de asilo reprovados, vítimas de tráfico e crianças desacompanhadas ou separadas.

Sobre o Programa da IOM na Nigéria

  • A IOM colabora estreitamente com o governo da Nigéria para melhorar as estruturas de gestão da migração e monitorar indicadores importantes no país, por exemplo, em torno do deslocamento. Eles trabalham para melhorar a solidez de seus dados relacionados à migração e como se comunicam sobre problemas de migração. Eles incorporam as informações que coletam em relatórios publicados regularmente.
  • Nos últimos três anos, a IOM ajudou que retornassem à Nigéria mais de 21.000 migrantes de uma variedade de países, como Níger, Mali, Alemanha e Marrocos, e especialmente (83%) da Líbia. Esses foram “retornos voluntários”, disse Kok.
  • Mesmo antes da COVID-19, pelo menos 70% dos repatriados estavam expostos a vulnerabilidades, como violência, exploração e abuso durante suas viagens. Ao retornar, os migrantes nigerianos tinham necessidades médicas, psicossociais e socioeconômicas específicas. O apoio à reintegração na comunidade visa aliviar essas dificuldades para os repatriados.

[Leia mais: Como o jornalismo de qualidade pode ajudar populações migrantes durante a pandemia]

Sobre as populações migrantes e o impacto da COVID-19

  • A COVID-19 devastou economias em todo o mundo, empurrando muitas pessoas para níveis socioeconômicos mais baixos. A falta de oportunidades econômicas e de emprego é uma grande força migratória: embora a migração tenha diminuído no início de 2020, os especialistas esperam que os fluxos migratórios aumentem dramaticamente no futuro próximo, à medida que as restrições a viagens forem suspensas.
  • Restrições de viagens e regulamentações mais rigorosas de saúde e segurança prejudicaram as economias e os padrões de migração. Isso resultou em um aumento de migrantes retidos e intensificou as tensões econômicas que enfrentam, incluindo perda de renda.
  • Os migrantes muitas vezes não têm acesso a serviços de saúde, especialmente durante o trânsito. A COVID-19 exacerbou os riscos que eles normalmente enfrentam durante suas viagens também: muitos migrantes se encontraram em condições que os deixaram preocupantemente expostos ao vírus mortal.
  • A IOM Nigéria conduziu recentemente uma análise, que revelou que 96% dos migrantes nigerianos estavam financeiramente pior do que antes da pandemia, disse Kok. Além disso, 91% dos migrantes nigerianos indicaram que seu estado psicossocial havia se deteriorado devido à COVID-19 e suas consequências. 

Sobre a coleta de dados de migração relacionados à saúde

  • É difícil rastrear métricas de saúde, como taxas de infecção e mortalidade, específicas para populações migrantes, já que as unidades de saúde não coletam e segregam essas informações.
  • Os migrantes têm menos probabilidade de fazer o teste de COVID-19 e procurar assistência médica por medo de estigmas, deportação ou por falta de documentação adequada. Isso também afeta a precisão dos dados relacionados à saúde sobre os migrantes.
  • É importante observar que "migrante" é um termo abrangente que cobre uma ampla gama de circunstâncias de migração. As experiências variam de acordo com o país e as condições de viagem; como resultado, a IOM não pode fornecer dados globais sobre o impacto da COVID-19 na migração.

[Leia mais: Jornalistas cobrem impacto da COVID-19 entre trabalhadores migrantes na Cingapura]

Sobre pautas para cobrir

  • Os migrantes estão na linha de frente da resposta à COVID-19, fornecendo serviços em setores essenciais, como saúde, produção de alimentos e transporte. Sua reportagem também deve ter como objetivo destacar essas histórias.
  • Os grupos de migrantes podem correr maior risco durante o trânsito. No entanto, muitos migrantes realizam exames de saúde completos antes de embarcarem em suas viagens, o que ajuda a reduzir esse risco. Pesquise fatos que desmascarem alegações estigmatizantes que ligam migrantes a doenças.
  • Investigar sobre como as campanhas de vacinação estão se desenvolvendo pode ajudar os governos  a prestar conta de sua ações. Embora os governos possam planejar tornar as vacinas acessíveis a todos os grupos, é importante monitorar o que está acontecendo na prática. Isso inclui esclarecer se os migrantes estão, de fato, sendo vacinados ou se têm acesso adequado às informações para entrar na fila.

Recursos mencionados durante o webinar

  • Displacement Tracking Matrix do IOM apresenta dados sobre os impactos da mobilidade da COVID-19, métricas de deslocamento e monitoramento do fluxo de migração. Você também pode encontrar relatórios sobre tendências específicas de cada país e fluxos regionais e globais.
  • Online Bookstore do IOM produz políticas de migração e publicações de pesquisa.
  • O site Refugee and Migrant Health da Organização Mundial de Saúde oferece recursos, notícias e dados sobre a saúde de migrantes. 
  • O Conselho Norueguês de Refugiados, uma organização de proteção dos direitos dos migrantes, e o Conselho Dinamarquês de Refugiados, uma organização humanitária sem fins lucrativos, compartilham recursos como relatórios, notícias, fatos e números.
  • Pesquise grupos da diáspora no país e organizações da sociedade civil para obter informações mais específicas sobre migração

Lucía Ballon-Becerra é assistente de programa do ICFJ.

Imagem sob licença CC no Unsplash via Lucas George Wendt