No dia 28 de setembro, o furacão Ian, o quinto furacão mais forte na história dos Estados Unidos, chegou ao sudoeste da Flórida, devastando comunidades e forçando repórteres locais a cobrir mais um grande desastre climático.
Os jornalistas de um dos maiores veículos do estado, o Tampa Bay Times, estavam imediatamente nos locais atingidos, onde fizeram a cobertura da contabilização de vítimas fatais em decorrência das marés das tempestades e de suas consequências.
O repórter Zack Sampson e o fotógrafo Douglas Clifford estavam no grupo de jornalistas do Tampa Bay Times que cobriram o furacão Ian. Eles cobriram a chegada da tempestade em Fort Myers, na Flórida.
Para entender melhor o que é preciso para cobrir desastres naturais, eu conversei com Sampson, Clifford e a editora-chefe do Tampa Bay Times, Carolyn Fox, sobre suas estratégias de reportagem, dicas de segurança e como é sua abordagem na cobertura das populações impactadas por furacões.
Preparação para cobertura do furacão Ian
Como equipe responsável por acompanhar a chegada do furacão, o objetivo de Sampson e Clifford era estar o mais perto possível das áreas mais afetadas pela tempestade. Assim como em suas coberturas anteriores de furacões, a dupla chegou em Fort Myers com antecedência para fazer contatos. Dentre eles, moradores locais que eles identificaram como mais prováveis de serem afetados pela tempestade.
Os jornalistas estacionaram seu carro em um hotel a cerca de 19 quilômetros da praia de Fort Myers e observaram a rotação da tempestade e as rajadas de vento no radar para decidir qual área sofreria mais danos. "Depois da chegada do furacão, esperamos os ventos caírem para uma velocidade de cerca de 80 quilômetros por hora. É quando você normalmente consegue dirigir", diz Clifford.
A reportagem feita pelos dois foi publicada no dia seguinte à tempestade. Ela destacava a devastação causada pelo furacão em Fort Myers, onde deixou 14 mortos, antes de seguir para a Flórida e para as Carolinas.
Humanização de desastres naturais
Quatro ou cinco dias depois do furacão se movimentar para a Flórida, a equipe do Tampa Bay Times se reuniu para discutir quais histórias contar para além da chegada inicial do furacão.
Muitas das matérias publicadas durante e imediatamente após focavam no alto número de mortes — muitas por afogamento, marés de tempestades e inundações, de acordo com Sampson. O Tampa Bay Times havia registrado cerca de 100 mortes até 3 de outubro. Em 31 de outubro, haviam sido registradas 125 mortes na Flórida em decorrência da tempestade.
"Eu acho que o ponto principal foi que olhamos para os ângulos que deveríamos adotar na segunda semana de cobertura", diz Fox. "[Uma coisa] que eu sinto que o Tampa Bay Times faz incrivelmente bem são as pautas de acompanhamento que talvez outros [jornais] parem de dar atenção."
A equipe queria conectar os rostos de pessoas reais com os números de vítimas sendo informado e explicar por que e como elas morreram, diz Fox. Isso foi especialmente importante para os moradores de Tampa Bay lerem, já que a cidade normalmente não era afetada pelos principais furacões, o que fez com que alguns moradores não levassem o fenômeno a sério.
"Eles precisam entender a severidade de algo como uma maré de tempestade, e isso não pode ser menosprezado", diz.
Uma das matérias de Sampson celebrou a vida de Mitch Pacyna, uma vítima do furacão Ian que morreu durante uma maré de tempestade em Fort Myers. Para escrever o texto, Sampson e Clifford trabalharam com equipes de busca e resgate para encontrar a casa de Pacyna, enquanto jornalistas na redação buscavam nas redes sociais por informações sobre a vida da vítima.
"[Nosso objetivo era] tentar contar uma história sobre o fato de que pessoas morreram aqui porque, francamente, isso é o que importa para a maioria dos nossos leitores — eles precisam saber por que é preciso evacuar a área", diz Simpson.
Manutenção da segurança
Fazer uma cobertura em dupla é uma estratégia que o Tampa Bay Times usa para cobrir furacões, mas nem sempre foi assim, diz Clifford. Durante a última cobertura, a redação percebeu que ter um repórter e um fotógrafo juntos ajudava os jornalistas a tomarem decisões melhores sobre sua segurança na rua.
"Isso te dá um pouco mais de [coragem], um pouco mais de confiança quando você tem alguém para te ajudar a se guiar, ou simplesmente alguém para te ajudar a tomar uma decisão e decidir [por exemplo] se você vai seguir por uma rua inundada", diz Clifford.
De acordo com dicas do Comitê de Proteção aos Jornalistas, repórteres devem trabalhar em grupo ou pelo menos em dupla e preferencialmente em trio na cobertura de desastres. É importante também que esses jornalistas consigam trabalhar bem juntos, já que cobrir uma tempestade pode ser uma situação estressante.
Preparar-se fisicamente para ir a campo é crucial para a segurança do jornalista. Isso começa com o tipo de veículo que se planeja usar na rua. A maioria das vias vão ter inundações de até 60 centímetros de altura, portanto ter um veículo com tração nas quatro rodas na zona do desastre é crucial. Ter combustível suficiente é importante – Clifford e sua equipe levam consigo pelo menos o equivalente a um tanque cheio em recipientes para transporte seguro de gasolina que não deixam escapar gases.
Além disso, a equipe carrega um kit de furacões que inclui uma variedade de itens que podem ser vitais quando se está na rua e quando lojas e estabelecimentos estão fechados. Dentre os itens estão cinta de reboque, plug para reparo de pneu, bomba de ar, inversor de potência, carregador de bateria, corda, lona, fita adesiva, dentre outros.
Para cobrir a chegada da tempestade, Clifford diz que normalmente escolhe um hotel feito de concreto e aço com menos de cinco andares.
"Pela minha experiência, em todos os andares acima do quinto, as janelas começam a estourar, e é muito perigoso", diz. "Eu já estive em um cômodo onde as minhas janelas estouraram de verdade."
Aprofundando as matérias
Além do furacão Ian, o Tampa Bay Times também focou na cobertura do risco de maré de tempestade e inundação na área de Tampa Bay em uma série de reportagens especiais chamada Rising Threat.
Na reportagem, Sampson e o editor de dados Langston Taylor falaram com mais de 100 pessoas, incluindo moradores, professores, meteorologistas, especialistas em seguro, cientistas, advogados e funcionários do governo para entender o tamanho do perigo que a área enfrenta.
"Estamos fazendo muitas coberturas sobre furacões nos arredores de Tampa Bay", diz Sampson. "Há muito tempo não somos atingidos e temos focado na vulnerabilidade e nos perigos [em Tampa Bay]." De acordo com a série, Tampa Bay segue sendo "uma das áreas sob maior risco de destruição por furacões nos Estados Unidos", apesar de ter ficado de fora por muito pouco da rota de furacões várias vezes recentemente.
Para a equipe do Tampa Bay Times, fazer matérias que comuniquem sobre o risco e o perigo em potencial é tão importante quanto cobrir o impacto dos furacões. Isso pode ajudar a salvar vidas no caso de um próximo grande furacão.
"A missão é [fazer com que] as pessoas que moram aqui saibam levar a sério uma ameaça de furacão."