A recente absolvição de Maria Ressa de quatro acusações de crimes fiscais, depois de cinco anos de assédio judicial realizado pelo Estado, representa uma rara vitória para a liberdade de imprensa nas Filipinas. Os advogados de Ressa esperam que isso sinalize uma nova direção para o presidente recém-eleito Ferdinand Marcos Jr., longe das políticas autoritárias de linha-dura do governo anterior de Rodrigo Duterte.
"Os fatos venceram hoje. A verdade venceu. A justiça venceu", disse Ressa após a decisão, que também absolveu das quatro acusações o Rappler, veículo que ela cofundou em 2012.
Os crimes incluíam três acusações de falha na declaração de renda tributável e uma acusação de evasão fiscal, todas datadas de 2015. "As acusações eram políticas – uma tentativa direta de silenciar uma jornalista. Mas hoje nós vimos a justiça sendo feita", disse Amal Clooney, uma das advogadas internacionais de Ressa.
Porém, a laureada com o Nobel ainda pode enfrentar décadas na prisão. Dos 23 processos abertos pelo Estado contra ela desde 2018, três ainda estão em andamento. Abaixo está a situação de cada um deles no momento.
Acusação de difamação cibernética
Em 15 de junho de 2020, Ressa e seu então colega de trabalho no Rappler, Reynaldo Santos Jr., foram condenados por difamação cibernética criminosa por corrigirem um erro de digitação em um artigo. O texto em questão, publicado em maio de 2012, incluía detalhes de suposta corrupção do empresário Wilfredo Keng e do ex-chefe do Judiciário Renato Corona.
A acusação de difamação cibernética foi feita contra Ressa e Santos Jr. com base na Lei de Prevenção de Crimes Cibernéticos, que sequer era uma lei ainda na época da publicação. Ela entrou em vigor quatro meses depois da publicação da matéria. Os promotores alegaram que a correção do erro de digitação — "evatão" para "evasão" — em 2014 significava que a matéria tinha sido efetivamente publicada outra vez.
Em julho, o Tribunal de Apelação confirmou a condenação e também aumentou a sentença máxima de prisão pela condenação de difamação criminal para seis anos, oito meses e 20 dias. Em outubro de 2022, o Tribunal de Apelação das Filipinas recusou-se a reconsiderar a condenação de Ressa, que apresentou seu recurso final à Suprema Corte. No momento, ela aguarda o veredicto.
Se a Suprema Corte mantiver o veredicto anterior, Ressa vai ficar presa no máximo seis anos, oito meses e 20 dias.
Processo fiscal
As quatro acusações fiscais das quais Ressa acabou de ser absolvida foram julgadas pelo Tribunal de Apelação Fiscal. Uma quinta acusação contra Ressa e o Rappler, que está sob a jurisdição do Tribunal Regional de Pasig, ainda está pendente.
A editora-executiva e confundadora do Rappler, Glenda Gloria, também foi denunciada nesse processo. A promotoria está no momento apresentando evidências do caso.
Acusação de propriedade estrangeira
Em janeiro de 2018, a Comissão de Segurança e Câmbio (SEC) das Filipinas revogou a licença de funcionamento do Rappler, ao decidir que um investimento da Omidyar Network, com sede nos Estados Unidos, constituía propriedade estrangeira do veículo, uma violação da constituição.
O Rappler e seus representantes legais argumentaram que o mecanismo usado para o investimento — por meio da emissão de Certificados de Depósitos Filipinos (PDRs) — é utilizado por outras empresas de mídia no país e não indica propriedade, já que não permite que o detentor interfira na gestão ou operações diárias da empresa.
Em março de 2019, a Procuradoria de Pasig acusou Ressa e o conselho administrativo do Rappler de violar a Lei Antimanipulação do país e o Código de Segurança, acusações relacionadas ao caso mencionado acima da SEC. A polícia prendeu Ressa três dias depois da decisão. Ela se declarou inocente em maio daquele ano.
Em outubro de 2019, o Tribunal Regional de Pasig decidiu que os promotores violaram o direito de Ressa e do conselho administrativo ao devido processo legal. Na mesma decisão, os dois casos — a violação da Lei Antimanupalação e do Código de Segurança — foram considerados como um só.
Em junho de 2022, um dia antes de Duterte deixar o cargo, a SEC manteve sua decisão de 2018, ordenando o fechamento do Rappler. O veículo está solicitando ao Tribunal de Apelação a emissão de uma ordem de restrição temporária contra a SEC para impedi-la de implementar a decisão.
Vídeo produzido pelo ICFJ e o CineDiaz como parte dos esforços da coalização Hold The Line.
Contexto geral
Por quatro anos, o governo de Duterte apresentou uma acusação forjada atrás da outra contra Ressa e o Rappler. Com a intenção de sobrecarregar a jornalista e seus colegas legal, financeira e psicologicamente, a tática é comumente empregada por líderes autoritários para silenciar seus críticos.
A absolvição de Ressa de um conjunto de quatro acusações traz uma ponta de esperança para o mundo e para as Filipinas.
"Nós esperamos que estejamos vendo o começo do fim da estratégia do governo anterior de instrumentalizar os tribunais como um meio de enfraquecer organizações jornalísticas independentes e prejudicar a credibilidade dos jornalistas", disse o Comitê Diretivo da coalização Hold The Line, coletivo de mais de 80 organizações internacionais. "Como o próximo passo imediato, pedimos que todos os processos remanescentes contra o Rappler e Ressa sejam encerrados e que a constante perseguição pare de uma vez por todas."
O trabalho já começou: "o amanhã começa hoje", como gosta de dizer o Rappler.
Este texto é uma atualização de um artigo de julho de 2020 que detalhava o assédio judicial contra Ressa desde 2018.
Imagem principal retirada do vídeo produzido pelo ICFJ e o CineDiaz.