Eu presenciei muitas mudanças no processo de apuração sendo jornalista freelancer por quase 25 anos. Desde o envio de matérias via fax ao envio de um email pela primeira vez, ao uso do Skype e Zoom para entrevistas, a tecnologia mudou a produção de notícias de forma significativa e rápida.
Uma nova tendência que tenho testemunhado recentemente, especialmente em países fora dos Estados Unidos, é a ascensão daquilo que gosto de chamar de "jornalismo no WhatsApp".
Criado em 2009, o WhatsApp é o serviço de mensagens mais popular em mais de 100 países. Ele tem mais de 2,5 bilhões de usuários ativos e é um dos poucos aplicativos com mais de cinco bilhões de downloads.
Como jornalistas usam o WhatsApp
Muitos jornalistas usam o WhatsApp para entrevistar fontes usando o recurso de mensagens de voz, especialmente em locais onde linhas telefônicas não são confiáveis.
"Eu uso bastante, especialmente para cobrir notícias no Iêmen, já que é difícil conseguir uma linha telefônica confiável por lá. Eu acabo enviando as perguntas pelo WhatsApp e recebo as respostas em texto ou áudio", diz Amjad Tadros, jornalista vencedor do Emmy e repórter da CBS em Amã, na Jordânia.
Enquanto isso, Nabih Bulos, correspondente estrangeiro no Oriente Médio para o Los Angeles Times, diz que usa o WhatsApp em suas reportagens pelo menos "50% do tempo".
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"Eu uso o WhatsApp nas minhas reportagens, seja para procurar canais de notícias que enviam alertas, seja para entrar em contato com pessoas onde a conexão com a internet é boa, mas o serviço telefônico não, ou ainda para manter contato com as fontes", conta Bulos à IJNet. "É essencial, simplesmente essencial."
Bulos diz que usou o WhatsApp na Síria para contatar as pessoas, já que o número de WhatsApp permanece com o proprietário quando ele se muda para outro país. "Quando cobri a crise migratória em 2015, encontrávamos pessoas pela estrada. Quando elas finalmente conseguiam uma conexão com a internet, podíamos entrar em contato com elas via WhatsApp", explica.
De acordo com Matt Navarra, consultor de mídias sociais e analista da área, o WhatsApp pode ser uma ferramenta valiosa para jornalistas por diferentes razões:
- Usar o WhatsApp para fazer perguntas a uma fonte, testemunha ou especialista traz um ótimo senso de intimidade e informalidade entre o jornalista e o entrevistado. É útil especialmente quando a pessoa entrevistada se sente ansiosa ou é cautelosa nas respostas.
- As mensagens do WhatsApp são criptografadas, o que é particularmente importante quando se está conversando com informantes ou fontes cujas circunstâncias demandam confidencialidade rigorosa e privacidade. Os jornalistas podem perceber que usar o WhatsApp deixa a fonte à vontade, ao contrário de uma ligação, email ou entrevistas presenciais, que podem fazê-la se sentir mais vulnerável.
- As mensagens de áudio do WhatsApp podem fornecer aos jornalistas respostas mais ricas e com nuances, o que pode faltar em uma resposta escrita.
- O WhatsApp pode ajudar jornalistas que fazem reportagens em trânsito ou que estão com um prazo apertado. O WhatsApp e outros aplicativos de mensagens criptografadas permitem que jornalistas obtenham, com rapidez e segurança, detalhes para uma matéria que podem ser instantaneamente repassados aos colegas na redação.
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As desvantagens
Usar o WhatsApp para fazer reportagens traz seus próprios riscos e desvantagens.
"Meu problema com o jornalismo no WhatsApp é que muitos jornalistas confiam exclusivamente nele para falar com pessoas que eles não conhecem pessoalmente", diz Bulos. "Foi o caso especialmente da Síria, já que o acesso era um problema. Os jornalistas entravam em contato com uma pessoa que dizia estar em uma determinada área. Não há como provar que ela estava naquela área."
A principal preocupação de Bulos é a facilidade de enganar usando o WhatsApp. "Você pode cair na armadilha de ser enganado e fazer algo bem idiota".
Manter a privacidade e confidencialidade com o WhatsApp é outro problema.
"Os jornalistas precisam manter os níveis mais altos de segurança para dispositivos móveis para proteger a privacidade e confidencialidade das trocas de mensagens no WhatsApp entre eles e a fonte para uma matéria", explica Navarra. "Isso pode ser atenuado com a ativação de recursos de segurança adicionais, como o FACE ID [ferramenta de reconhecimento facial] para abrir o WhatsApp, e com senhas e PINs complexos nos aparelhos. O uso de mensagens temporárias também pode ser útil quando se discute informação sensível em conversas no WhatsApp."
Para Tadros, uma das desvantagens do uso do WhatsApp para reportagens é a perda da natureza espontânea da reportagem e as conversas no estilo bate-bola. "Além disso, a fonte de alguma forma tem a vantagem de pensar antecipadamente nas respostas e elas acabam ficando insossas", aponta.
Foto por Dima Solomin no Unsplash.