A inteligência artificial generativa pode mudar fundamentalmente a forma como as pessoas trabalham.
Em alguns casos, isso já aconteceu – e a tecnologia está evoluindo rapidamente. Considere, por exemplo, o surgimento de modelos multimodais de IA, que podem combinar simultaneamente imagens, texto e fala para gerar um novo conteúdo.
Apesar das preocupações com a IA generativa – dentre elas, o potencial para espalhar desinformação e temores de que ela pode substituir empregos no jornalismo –, as lideranças de mídia devem considerar como usar a tecnologia para aprimorar seu trabalho. Se usada com responsabilidade e ética, a IA pode melhorar a forma como as notícias são produzidas e consumidas.
"O futuro da IA está só começando", diz Nikita Roy, bolsista do programa ICFJ Knight e apresentadora do Newsroom Robots, um podcast que traz conversas com líderes em IA e jornalismo. "A essa altura, as coisas estão ficando exponencialmente melhores praticamente toda semana."
Ao lidar com a IA de mente aberta e com uma dedicação para entender os seus usos, jornalistas podem compartilhar melhor informações valiosas com suas audiências e permanecerem competitivos em um contexto de mídia que está em constante evolução, diz Roy.
Confira a seguir dicas para jornalistas saírem na frente com a IA:
Aproveitando os benefícios da IA
A IA não está aqui para substituir o papel que os jornalistas desempenham em suas comunidades, diz Roy. Em vez disso, repórteres podem aproveitar a tecnologia para otimizar a produtividade e deixar suas matérias mais profundas, atraentes e dinâmicas.
"Como a IA pode apoiar os jornalistas na sua redação na produção de um trabalho mais interessante? Como você pode criar novas experiências com IA? Como você pode reimaginar as notícias com IA?" Todas essas são perguntas que jornalistas devem estar se fazendo no momento, aconselha Roy.
A IA pode ajudar os jornalistas a realizarem projetos que não seriam possíveis de outra forma. Isso pode ser especialmente útil em redações menores com uma capacidade menor de produção. Por exemplo, jornalistas podem usar comandos de linguagem natural no ChatGPT-4 para analisar grandes conjuntos de dados, visualizar informações e identificar tendências, e tudo isso pode gerar ideias de pauta.
Inovações futuras podem gerar ainda mais benefícios. Embora ainda não esteja disponível para o público, a Sora, uma nova ferramenta revelada pela OpenAI em fevereiro, promete criar vídeos a partir de textos em uma questão de segundos. A Sora pode auxiliar na produção de narrativas visuais, mas assim como outras ferramentas de IA generativa, ela causou preocupações acerca de suas possíveis consequências negativas, por exemplo, se ela irá perpetuar vieses.
Mas jornalistas não devem se apegar imediatamente aos aspectos negativos de novas ferramentas de IA, argumenta Emilse Garzón, jornalista digital e professora argentina especializada em IA e cibersegurança. "Nós temos que falar sobre as consequências sem sermos catastróficos quando não implica de fato uma catástrofe nem transformar em catástrofe para atrair cliques."
Roy diz que líderes de redações devem encorajar discussões sobre IA generativa dentro das equipes. Em toda a organização, treinamentos específicos para cada equipe podem ajudar a construir um conhecimento institucional e melhorar fluxos de trabalho.
Criar um canal no Slack para compartilhar "vitórias da IA" pode ajudar ainda mais a encorajar práticas de IA mais sólidas, sugere Roy. "Você vai estar criando uma cultura na qual as pessoas podem ser transparentes e abertas sobre como elas estão usando a IA generativa se estiverem dentro das diretrizes."
Uso ético da IA
O uso transparente e responsável de ferramentas de IA generativa pode promover o uso ético da mesma por outras pessoas. "A tecnologia não nos prejudica", diz Garzón. "O que nos prejudica é a forma como ela é usada, quem a cria e quem endossa o seu uso." No nível individual, quando Garzón usa ferramentas de IA generativa como a Midjourney ou aplicações do Canva alimentadas por IA para gerar imagens a partir de texto, ela comunica essa informação à sua audiência.
Roy argumenta que as redações devem implementar diretrizes editoriais de IA para padronizar as melhores práticas. Ter regras em vigor pode quebrar tabus sobre o uso de IA, esclarecer como as pessoas podem usar o recurso e lidar com preocupações éticas.
As diretrizes devem reforçar a importância do envolvimento humano no conteúdo gerado com assistência de IA, incluindo a verificação de fatos antes da publicação, e uma política de tolerância zero ao plágio. A IA nunca deve ser usada para criar matérias que são publicadas imediatamente, alerta Roy. "Tudo tem um uso certo e errado", diz. "Nós temos que entender como usar essas ferramentas de IA do jeito certo."
Cabe a cada redação definir o escopo do uso de IA por sua equipe. Enquanto a AP não permite que o ChatGPT seja usado em nenhum conteúdo publicado, outras redações podem vir a restringir o uso do ChatGPT somente na produção de reportagens originais.
"Essas diretrizes não precisam ser imutáveis", diz Roy. Elas podem ser revisadas periodicamente com base na evolução de novas tecnologias e nas necessidades de cada organização.
Estimulando o debate sobre IA
Jornalistas devem estar na linha de frente de muitas discussões sobre IA que acontecem atualmente, diz Garzón.
Dar dicas sobre como a IA pode ser usada para fazer um cerco à desinformação e aprofundar-se nas complexidades de como as pessoas devem ter cuidado com direitos autorais, proteção de dados e quem está por trás de tecnologias alimentadas por IA são todas discussões importantes nas quais repórteres podem se aprofundar em suas matérias.
Jornalistas devem apresentar uma variedade de perspectivas e nuances ao cobrir o assunto, em vez de simplesmente focar nos prós e contras, acrescenta Garzón. O dever é informar o público – e não dizer às pessoas o que pensar a respeito. "Nós devemos ter entre nós esses debates que às vezes escapam e vão além das nossas ideias ou linha editorial", diz. "O que precisamos garantir é que haja diversidade de opiniões, mesmo se essas opiniões não nos agradarem."
Ao explorarem tecnologias de IA, jornalistas também podem identificar onde a IA generativa está produzindo informação enganosa ou resultados com vieses. Isso pode promover um entendimento aprofundado de como os modelos de IA funcionam e como eles podem ser melhorados", diz Roy.
"Precisamos ser cidadãos informados", diz Roy. "É esperado e importante que façamos uma pesquisa extensiva e contextualização das matérias sobre os desenvolvimentos e evolução da IA atualmente para demonstrar respeito com as pessoas que confiam em nós."
Imagem via Linus Zoll & Google DeepMind / Better Images of AI / Modelos de imagem generativa / CC-BY 4.0.