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Fundo para o jornalismo como alternativa ao ‘filantrocapitalismo’

Mar 4, 2025 发表在 Sustentabilidade da mídia
Tecnologia mundo

Autor de estudos que analisam a relação entre as big techs e as organizações jornalísticas, o pesquisador Mathias Felipe de Lima Santos, professor de Jornalismo na Universidade Macquarie (Austrália), defendeu em entrevista ao IJNet a criação de um fundo para o jornalismo como uma das principais soluções para garantir a sustentabilidade do ecossistema de notícias.

Alguns dos principais achados das pesquisas conduzidas por Santos indicam que o financiamento das organizações jornalísticas pelas big techs fomenta a dependência e estende o conceito de filantrocapitalismo em escala global, apesar de sua narrativa de aprimorar a inovação tecnológica para o futuro da mídia.

“Essas empresas de tecnologia trazem ideias que são do capitalismo, do mundo da startup, e querem aplicar para as empresas de mídia. Então, vão doar dinheiro para se envolverem em projetos de tecnologia", diz Santos. "Só que isso vem numa mentalidade de que essas empresas [de jornalismo] já têm o know-how; que são startups; que podem fazer inovação”.

Ele atuou em 3 pesquisas sobre o tema. A primeira aborda o financiamento pelo Google News Initiative na América Latina. A segunda expande o assunto para África e Oriente Médio. Por fim, a terceira consolida as descobertas e se chama “O filantrocapitalismo do Google News Initiative na África, América Latina e Oriente Médio: reflexões empíricas”. Esta última foi baseada em 36 entrevistas com beneficiários do programa de inovação. “Tinham organizações que estavam muito básicas mesmo, precisando de desenvolvimento de um site, até outras que estavam começando a experimentar com inteligência artificial", disse o pesquisador.

Filantrocapitalismo

No conceito de filantrocapitalismo, grandes investidores aplicam práticas empresariais para gerar benefícios econômicos e sociais simultaneamente. “A ideia do filantrocapitalismo era exatamente mostrar que essa filantropia, essa forma de ajudar as organizações de mídia, também é uma forma de aliviar as pressões regulatórias que essas organizações estão tendo. Estamos num momento em que a União Europeia puxou para ter mais regulação. O Brasil, a Austrália e o Canadá também puxam para regular mais”, disse Santos.

Usando o exemplo do Google, as pesquisas mostram como as nig techs pautam o que as organizações de mídia desenvolverão. Elas “criam uma agenda de tecnologia que, às vezes, as organizações não têm habilidade, mas vêem como uma oportunidade de atrair dinheiro; para sustentar o modelo de negócio por 1 ano.”

De acordo com Santos, os editais de programas financiados por big techs dizem que a iniciativa deve gerar novas receitas, atrair mais audiência ou combater a desinformação. Ou seja, tudo sobre como essas empresas de mídia podem ganhar asas e sobreviver. No entanto, a duração de no máximo 1 ano joga contra esse objetivo. 

“Encontramos nos estudos que o financiamento é muito útil, porque poucas instituições financiam projetos de tecnologia [ao jornalismo]. Só que não há oportunidade de aplicar para uma continuação", explica ele. Em outras palavras, os projetos jornalísticos raramente conseguem sair da versão “beta”, porque as tecnologias exigem recursos e investimento contínuo, sendo que essas empresas nem sequer dominam o conhecimento técnico. Quando adquirem essa capacidade, esgota-se o programa e o financiamento. Em outros casos, terceirizam a operação, o que também envolve um custo que torna o projeto insustentável. 

“Acabam criando sistemas cheios de bugs, não conseguem publicar [o trabalho] ou criar uma versão além da beta. No final, acaba saindo do ar”, diz o pesquisador.

Problemas identificados 

  • O financiamento pelas big techs está remodelando o jornalismo e influenciando as agendas de inovação das organizações de mídia.
  • Existe um risco de as organizações de mídia se tornarem dependentes desses financiamentos, o que pode afetar sua independência editorial.
  • Muitas organizações de mídia veem esses financiamentos como uma oportunidade de sustentar seus negócios por 1 ano, mesmo sem ter as habilidades necessárias para os projetos propostos.
  • Após os programas, muitas organizações não conseguem continuar os projetos por falta de recursos.
  • Há uma crescente dependência das organizações de mídia em relação às big techs para financiamento e desenvolvimento tecnológico.
  • As organizações ainda podem se tornar dependentes de ferramentas das próprias big techs, como ocorre com os mecanismos do Google (Ad Manager, busca e rankeamento do site, Reader Revenue e outras).

Possíveis soluções

  • Criar um fundo nacional para financiar o jornalismo, distribuindo recursos de forma equitativa.
  • Desenvolver projetos de inovação de longa duração com suporte contínuo.
  • Maior apoio às organizações durante os programas de inovação, com mentores que realmente sejam referências técnicas nas áreas necessárias, e não apenas jornalistas com mais tempo de carreira.
  • Incentivar a colaboração entre organizações de mídia para aumentar seu poder de barganha junto às grandes corporações.
  • Diversificar as fontes de receita das organizações jornalísticas.
  • Adaptar-se às novas tecnologias, experimentando novas formas de produzir e distribuir conteúdo.

Segundo o pesquisador, a primeira coisa a definir é se haverá regulação das plataformas digitais e financiamento contínuo ao jornalismo a partir de um fundo. Isto seria o ideal, com repartição dos valores de maneira justa, contemplando pequenas, médias e grandes empresas. 

“Muitas organizações falaram que se sentiam muito agradecidas que não tinha burocracia como no financiamento feito por entidades filantrópicas, mas se sentiram muito sozinhas no desenvolvimento. Não tiveram suporte próximo de um mentor que tenha conhecimento no produto que essa organização quer desenvolver”, disse. 

Mesmo com um fundo, nada impediria que novos programas de inovação fossem realizados, mas com aperfeiçoamentos para torná-los mais produtivos. Neste caso, a duração deveria ser revista, assim como a possibilidade de ampliação do contrato e a designação de mentores com o devido conhecimento técnico. 


Foto: Canva