Uma esperança na cobertura de conflitos da Nigéria

Sep 2, 2021 em Temas especializados
Lagos, Nigeria

Ao longo dos anos, a Nigéria tem sido afetada por vários desafios de insegurança — particularmente a insurgência do Boko Haram, violência étnica, banditismo e sequestros perpetrados por vários grupos. Apesar dos efeitos devastadores e ameaças à economia do país e ao bem-estar, subsistência e vida dos cidadãos, os problemas abrangentes de insegurança e seus impactos em certas comunidades não têm obtido cobertura suficiente da mídia.

Conforme a IJNet mostrou, o HumAngle está preenchendo essa lacuna. Lançada em março de 2020, a publicação digital nigeriana trabalha com notícias de última hora, reportagens especiais e análises de especialistas sobre situações emergentes de conflito e insegurança no lago Chad Basin, nordeste da Nigéria, e em outras regiões do país. O veículo tem escritórios e repórteres na África Ocidental, África Central e no Sahel.

O cofundador e editor-chefe do HumAngle, Ahmad Salkida, explica que o veículo quer criar narrativas fortes sobre o significado da crise e do jornalismo na África. "Há uma lacuna enorme na nossa mídia. Nenhuma publicação está tratando da insegurança com a seriedade que ela merece", diz Salkida, que também é repórter investigativo com mais de 20 anos de experiência cobrindo conflitos, crises e insurgências na África Ocidental.

"Nenhum veículo impresso ou digital está operando à frente dos terroristas, o que deixa todos desamparados. A lacuna é grande, e essa lacuna tem ressonância global, porque a insegurança na África afeta o mundo todo."

 

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O HumAngle é a única plataforma de mídia do seu tipo na Nigéria e na África como um todo, sendo pioneira e desafiando a maneira como conflitos e crises humanitárias recebem cobertura. O veículo tem publicado narrativas únicas e em primeira mão sobre como conflitos e insegurança afetam o cidadão comum — apesar de estar em meio a uma pandemia, quando a atenção dos leitores tem estado mais focada na COVID-19.

"Muitos investimentos e tempo foram direcionados para colocar de pé uma redação como a HumAngle, com sua reportagem de nicho, mas houve um lockdown", conta Anita Eboigbe, editora executiva do HumAngle. "Mas à medida que fomos revolucionando o cenário da mídia, conseguimos encarar o desafio para emergir. Até o momento, conseguimos destacar histórias e perspectivas reais de pessoas afetadas pela insegurança, para além das estatísticas. Tudo com impactos positivos para essas pessoas e suas comunidades". 

Anita Eboigbe, HumAngle's Managing Editor. Photo: Muhammed Akinyemi.
Anita Eboigbe, editora executiva do HumAngle. Foto: Muhammed Akinyemi.

 

Ao empregar formatos multimídia, temas com elementos humanos e sinalização de crise, o HumAngle produz reportagens independentes, com credibilidade e baseadas em fatos sobre casos de crises potenciais e existentes para uma vasta audiência na África. Com uma abordagem de baixo para cima em suas reportagens — e que faz jus ao seu nome — o veículo também conta histórias sobre o sofrimento e resiliência de populações vulneráveis, pessoas deslocadas internamente e aquelas que vivem em comunidades destruídas por conflitos e de difícil alcance, a partir de um ângulo humano.

O HumanAngle conseguiu isso através de séries como o podcast Vestiges of Violence, The Crisis Room, Newsreel, The Deradicalised, and IDP Diaries — todos com foco em notícias sobre crises e histórias trágicas que moldam diretamente as condições nas quais pessoas estão vivendo no nordeste da Nigéria e no resto do país.

Em meio às consequências da pandemia para as redações, o HumAngle recebeu ameaças incessantes na tentativa de intimidar a publicação a continuar cobrindo conflitos. O veículo, no entanto, manteve seu foco temático com o apoio de parceiros e financiadores. 

 

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Honrando seu slogan, "sem fronteiras, sem limitações", o HumAngle inclusive cresceu para incorporar uma editoria de jornalismo de soluções focada em contar histórias sobre crises humanitárias como insegurança alimentar, crise climática e direitos humanos — todas pouco tratadas pela mídia na região. Ao fazer isso, a publicação moldou narrativas, ajudando os leitores a entenderem melhor as consequências associadas à insegurança.

Para Imrana Alhaji Buba, nigeriano especialista em conflito e fundador da Youth Coalition Against Terrorism (YOCAT), a cobertura de insegurança e atividade terrorista é bastante promissora para que o público entenda seus impactos. Ele acredita que há uma necessidade para que emerja um meio de comunicação que foque exclusivamente na cobertura de conflitos e insegurança na Nigéria e em toda a África.

Ele concorda que o HumAngle está desempenhando este papel, ao se tornar uma das fontes mais confiáveis para notícias e análises sobre as atividades de terroristas e criminosos no país e na região. "Muitos pesquisadores e consultores contam com a publicação, uma vez que podem ter acesso a fontes primárias de notícias e reportagens em outros idiomas como francês, árabe e hauçá", diz Buba. "Também acredito que as notícias e reportagens podem ser úteis para fazer inferências sobre motivações e estratégias em que grupos terroristas se baseiam, contribuindo para que muitos pesquisadores e analistas possam usar as reportagens para analisar os grupos e recomendar medidas políticas adequadas para as tragédias humanas e situações trágicas na região."   

O HumAngle planeja continuar a abrir mais fronteiras na sua narrativa e cobertura tanto nos assuntos quanto na audiência, ao mesmo tempo em que foca no desenvolvimento de sua equipe de repórteres que trabalha para dar vida às pautas. "Temos uma equipe incrível. O trabalho diário provou isso. Ao longo do próximo ano, eu quero que a gente tenha uma cultura organizacional vibrante, na qual cada um cresça em sua carreira e sinta estar em um ambiente seguro, mesmo apesar da natureza do nosso trabalho jornalístico", afirma Eboigbe. 

"Também queremos expandir a maneira como nos relacionamos com nossa audiência e fazer com que as pessoas nos vejam como amigos de confiança que estão trazendo as notícias mais confiáveis sobre insegurança, conflito e desenvolvimento. Queremos que elas queiram saber o que estamos fazendo a cada segundo. Para além do impacto que geramos, estamos focados no nosso público."


Foto por Nupo Deyon Daniel no Unsplash.