A crise climática pode ser a maior história de nossa vida, e a indústria de notícias está cada vez mais lidando com o fato de que a mudança climática afeta todas as facetas da vida.
Em 2019, Rosalind Donald escreveu para a Columbia Journalism Review que “as mudanças climáticas são uma história econômica e uma história de saúde pública; o aquecimento global molda as cadeias de abastecimento, os recursos hídricos, a infraestrutura tecnológica, a perda e o desenvolvimento comunitário, e assim por diante. No entanto, a cobertura do clima tem sido historicamente relegada à ciência e ao meio ambiente, fora do campo das hard news.”
As mudanças climáticas também não afetam a todos da mesma forma, e é por isso que uma imprensa diversificada e culturalmente competente é vital para cobrir e implementar soluções climáticas.
Para abordar esse problema foi lançado o Uproot Project, uma rede coletiva composta por e para jornalistas ambientais negros. O Uproot Project é dedicado a promover a carreira de jornalistas que têm sido historicamente sub-representados no jornalismo ambiental e científico e pode oferecer novas perspectivas para o setor.
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O Uproot Project começou como uma ideia de Andrew Simon, diretor de programação de liderança do Grist, uma agência de notícias sem fins lucrativos que cobre o clima. Yessenia Funes, membro do comitê de direção, editora de clima da Atmos Magazine, disse que Simon reuniu um grupo de jornalistas ambientais negros em Seattle em 2019 para ter uma ideia se havia ou não uma maior necessidade e demanda por uma organização profissional para apoiar e elevar jornalistas de origens marginalizadas que cobrem essas notícias.
A pergunta foi respondida com um sonoro sim.
Vale ressaltar que existem organizações como a Society for Environmental Journalists, a National Association of Science Writers e Climate Matter. O Projeto Uproot é único em sua missão principal de apoiar jornalistas de comunidades sub-representadas.
O comitê de direção do Uproot Project é composto por Funes, Naveena Sadasivam, Justin Worland, Yvette Cabrera, Paola Rosa-Aquino e Manola Secaira. Os primeiros meses do projeto se concentrarão em se tornar uma organização financeiramente independente do Grist, entendendo o que os membros mais precisam e como o Uproot Project pode fornecê-los. Funes disse que os objetivos do projeto incluem dar orientação, ferramentas, treinamentos, workshops e quaisquer outros materiais que possam ser úteis para jornalistas negros que estão cobrindo as mudanças climáticas — e especialmente para jornalistas negros emergentes que estão tentando se firmar na indústria.
“Há uma injustiça que muitas comunidades não brancas enfrentam quando lutam contra a crise climática e em nossa respectiva indústria, estamos vendo uma falta de representação de vozes não brancas no espaço ambiental, mas estamos vendo isso acontecendo em todos os lugares”, disse Funes. “Aqueles de nós que cobrem o meio ambiente sabem que muitos de nós são negros ou indígenas, ou pessoas de cor, mas as pessoas que conseguem ter sua assinatura nas grandes revistas, que ganham as reportagens de capa sobre mudanças climáticas geralmente são homens brancos mais velhos.”
Funes explicou que a falta de repórteres e editores ligados a comunidades vulneráveis se mostra nas reportagens, onde as comunidades são exotizadas e deturpadas. Às vezes, são retratadas como ignorantes ou mal informadas, e isso mostra quando os membros da comunidade estão dizendo uma coisa, mas os funcionários estão dizendo outra: apenas um lado é aceito como autoridade. “Uma coisa é certa: as velhas narrativas do jornalismo ambiental nos falharam”, dizia a descrição do evento de lançamento. “É hora de desenraizá-las e começar a plantar as sementes para novas histórias que fazem justiça a todas as comunidades.”
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“As histórias políticas que saem muitas vezes deixam de fora as vozes das comunidades que vão sentir os impactos das políticas propostas pelo governo federal”, disse Funes. “Muitas das histórias que se conectam com as comunidades, muitas vezes contam histórias que pintam as comunidades como vítimas apenas, em vez de elevar a força e o trabalho que essas comunidades estão fazendo para resolver a crise climática ou qualquer devastação ecológica que esteja enfrentando. Isso vem da falta de compreensão de qualquer um desses repórteres ou editores que podem não ter suas próprias conexões com essas comunidades.”
O Uproot Project quer seguir o modelo da Ida B. Wells Society for Investigative Reporting, uma organização que se concentra em aumentar e reter jornalistas investigativos negros na indústria de notícias. O projeto foi lançado oficialmente em março com uma discussão com Julian Brave NoiseCat, jornalista e vice-presidente da Data for Progress, cujo trabalho se concentrou principalmente em como os povos e culturas indígenas podem oferecer soluções para os problemas mais urgentes do mundo. O evento foi gratuito e aberto a jornalistas de todos os níveis e independentemente das experiências da editoria.
“Parte do que queremos ajudar a comunicar é essa conexão de que o meio ambiente não precisa ser uma história separada para cobrir”, disse Funes. “Qualquer história que você possa pensar, pergunte-se, como as mudanças climáticas afetarão isso? Quais são os custos ambientais associados a isso? Quase sempre há algo a ser levado em consideração lá. Queremos que as pessoas sejam mais criativas sobre como cobrimos isso, então não é tão reativo. Parte da razão pela qual esses problemas acontecem é que as pessoas não sabem sobre eles até que existam.”
Este artgo foi publicado originalmente no Nieman Lab e republicado an IJNet com permissão.
Hanaa’ Tameez é redatora do Nieman Lab. Anteriormente, ela trabalhou no WhereBy.Us e Fort Worth Star-Telegram.
Imagem sob licença CC no Unsplash via John O'Nolan