Uma década atrás, a fundadora do TrollBusters, Michelle Ferrier, teve que tomar uma decisão difícil.
Durante dois anos, a jornalista foi atormentada por cartas com ameaças e insultos raciais. Quando as mensagens se tornaram mais tóxicas, Ferrier escolheu deixar seu emprego como colunista de jornal na Flórida e mudou com sua família para outro estado.
Naquela época, seu atormentador usou o serviço postal americano para enviar cartas cheias de diatribes venenosas. Embora os métodos tenham mudado, o assédio continua a ser um problema para mulheres jornalistas. Hoje os trolls online são os culpados por trás da "progressão do ódio", como descreve Ferrier.
De acordo com o Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ), o assédio cibernético é uma ameaça crescente para quem trabalha na indústria de notícias. Os ataques cibernéticos vêm via Twitter e outras mídias sociais "em quase todos os países onde a internet existe."
"Se você tem uma voz e uma plataforma, você se torna um alvo. É o novo território de caça", diz Ferrier, que se inspirou em sua própria experiência traumática para agir.
Em janeiro de 2015, esta professora de jornalismo da Universidade de Ohio fundou o TrollBusters, um autodenominado "serviço de resgate" para mulheres jornalistas que sofrem assédio cibernético. Ela trabalhou com uma equipe internacional de mulheres para ajudar a desenvolver ferramentas e serviços para intervenções direcionadas quando os trolls atacam.
O site oferece uma ampla gama de ferramentas, incluindo um sistema de monitoramento de redes sociais, curso de higiene digital e infografia que definem vários cenários de ameaças. Ferrier explica como a equipe de S.O.S. virtual do TrollBusters trabalha.
"Quando uma vítima [de assédio online] nos contata, obtemos o seu consentimento para operar dentro de seu canal e emitir o que chamamos de uma advertência. Isso permite que o troll saiba que estamos monitorando a situação. Em seguida, criamos uma cobertura de proteção em torno da vítima, enviando mensagens positivas para seu canal para dar força emocional e mostrar apoio. É importante que elas saibam que não estão sozinhas", diz ela.
No ano passado, o TrollBusters forneceu treinamento em segurança digital a mais de 300 jornalistas (80 por cento mulheres) e monitorou mais de 150 profissionais de mídia para ajudar a parar o abuso online. Seu curso de higiene digital e infografia foram baixados mais de 3.000 vezes.
Ferrier diz que ataques contra jornalistas tendem a diferir daqueles que o público em geral sofre. São anônimos, altamente coordenados e geralmente envolvem mais de uma pessoa. Aparecem rapidamente e continuam ao longo do tempo. Ela observou que "mobs inteligentes" também visam a mídia.
Uma matéria do New York Times descreve um mob inteligente como um "grupo auto-organizado de pessoas que operam como enxame de abelhas ou revoada de pombos". Usam celulares e comunicação instantânea "para se comportar da mesma forma que os bichos de uma colmeia", formando uma resposta coletiva a uma situação. As mobs inteligentes podem ter efeitos poderosos, de acordo com o Times.
O TrollBusters recomenda uma posição pró-ativa. O site afirma: "Quando você vê ameaças online, assédio cibernético ou outro comportamento de troll contra mulheres jornalistas, envie um S.O.S. e nós seremos os primeiros a responder online, enviando a você, ou a quem estiver sob ataque, mensagens positivas, abraços virtuais ou serviços de reparação de reputação."
Quando uma vítima de trolling busca ajuda, o TrollBusters "rastreia o Twitter, Facebook e outros canais sociais à procura de menções suas. Quando detectamos uma ameaça, fornecemos recursos e mensagens que diminuem o efeito da agressão online e ajudam você a permanecer online."
Pedir ajuda implica em preencher um formulário seguro e curto para iniciar o processo de monitoramento e suporte.
O curso de higiene digital foca em prevenir o assédio antes mesmo de começar. Abaixo está uma amostra do conteúdo do curso. Cada dica está vinculada a uma lição que fornece informações e recursos adicionais:
Use um manto de “anonimato” ou rede virtual privada (VPN) para se manter invisível
Configure uma verificação de duas etapas em suas contas para ter uma camada adicional de segurança
Crie senhas fortes e use um administrador de senhas para criar frases de acesso
Não use informações sobre você que estejam prontamente disponíveis como questões de segurança
Navegue na web usando o HTTPS Everywhere, um navegador de código aberto e gratuito
Seja seletivo ao convidar aplicativos de terceiros para usar seus dados
Use criptografia de disco completo no seu computador e no seu telefone
Para Ferrier, criar o TrollBusters foi catártico, uma maneira de atacar o mal invisível.
Ela começou a receber mensagens de ódio quando era a primeira mulher colunista afro-americana no Daytona Beach News-Journal. As cartas continuaram chegando entre 2005 e 2007. À medida que o medo por si mesma e por sua família crescia, ela instalou um sistema de segurança em sua casa, começou a usar disfarces em público e aprendeu a usar uma arma.
Finalmente, ela contou ao editor: "Não consigo mais viver assim" e se demitiu. Ferrier descobriu mais tarde que as ameaças vinham de um supremacista branco.
Em outubro de 2017, a International Women's Media Foundation (IWMF) recebeu uma subvenção para realizar uma pesquisa sobre o assédio online de mulheres jornalistas. Ferrier, que possui um Ph.D. da Universidade da Flórida Central, é a principal pesquisadora do projeto.
"Estamos ouvindo histórias e depoimentos de mulheres jornalistas americanas regularmente que experimentam um aumento no assédio online. Os dados coletados através desse estudo nos permitirão realmente entender o tamanho e escopo do problema", diz Elisa Munoz, diretora executiva da IWMF.
"Consideramos isso como uma ameaça real à liberdade de expressão e à segurança dos jornalistas. Embora esse estudo particular esteja focado na mídia nos EUA, esperamos reproduzir esse esforço globalmente."
Imagem sob licença CC no Pexels via Fernando Arcos