Relações públicas e jornalismo coexistem em um difícil ato de equilíbrio, em que ambos contam um com o outro como parte de um ecossistema de comunicação.
Antes, o jornalismo era o jogador mais forte no relacionamento, mas agora, como resultado dos cortes nas redações, as assessorias estão se tornando mais dominantes. E essa relação pode minar a confiança já limitada nas notícias.
Relações públicas e jornalismo
Relações públicas são definidas como a prática de usar estratégias de comunicação para construir relacionamentos entre organizações (como empresas, instituições e governo) e o público.
Tradicionalmente, uma das conexões mais importantes para os profissionais de relações públicas é o jornalismo. Assessores de imprensa contam com suas conexões jornalísticas para ajudar a divulgar suas mensagens, e jornalistas recorrem aos assessores para ajudar a encontrar histórias interessantes, preencher cotas e cumprir prazos. Na verdade, de acordo com a Sociedade Canadense de Relações Públicas, os assessores de imprensa tendem a interagir mais com jornalistas do que com qualquer outro grupo profissional.
Essa relação funcionou por muitos anos porque os jornalistas estavam em vantagem. Os jornalistas tinham uma cultura que os deixava desconfiados dos assessores, o que ajudava a manter a indústria de relações públicas sob controle. Quem decidia o conteúdo era o jornalista, e ele não se contentava necessariamente com a declaração que o profissional de relações públicas lhe enviava.
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Em troca, os profissionais de relações públicas podem estar razoavelmente seguros de que a cobertura terá a confiança do público. Ao escolher o que cobrir e como cobrir, o jornalismo mantém as relações públicas responsáveis. Se os assessores de imprensa fizerem qualquer coisa para ameaçar seu relacionamento com os meios de comunicação, eles não poderão trabalhar com eficácia.
No entanto, nos últimos anos, como resultado da consolidação da mídia e da ascensão das redes sociais, a relação entre assessoria e jornalismo mudou. Embora essa mudança pareça favorecer as relações públicas, na realidade resultou na diminuição da confiança nas notícias, e isso é ruim para todos. Quando o delicado equilíbrio entre jornalismo e relações públicas é perturbado, acabamos com um ecossistema de informações que é menos confiável porque é impulsionado por objetivos organizacionais e não pelo interesse público.
Uma mudança de equilíbrio
Agora, o jornalismo depende cada vez mais das relações públicas para sobreviver. As notícias locais estão enfrentando uma pressão sem precedentes da consolidação da mídia e do negócio das redes sociais. Com o esgotamento dos empregos de jornalismo na América do Norte, muitos jornalistas talentosos e treinados e jornalistas de sucesso estão aceitando empregos em relações públicas para poder pagar as contas.
Ao mesmo tempo, muitas redações com pouco dinheiro estão se voltando para advertorials ou conteúdo patrocinado para compensar a redução das receitas. Como resultado, uma parte maior da mídia está envolvida na divulgação de conteúdo de relações públicas, que geralmente é uma informação parcial e incompleta que favorece os clientes corporativos da assessoria.
Por exemplo, quando informações importantes como a eficácia da vacina contra a COVID-19 são apresentadas ao público diretamente a partir de comunicados à imprensa, fatos científicos importantes podem ser minimizados ou deixados de fora da descrição do problema. Isso pode contribuir para minar a confiança do público tanto na notícia quanto na organização por ela coberta. Embora os assessores desempenhem um papel importante para garantir a confiança entre as organizações e o público, algumas práticas da assessoria podem levar ao declínio da confiança nas notícias.
Outras táticas de áreas cinzentas das relações públicas, como astroturfing, direcionam a atenção da mídia para histórias que os jornalistas talvez não consideram muito interessantes. Astroturfing envolve o uso de mídia social para criar apoio popular online falso para uma organização ou problema. Os meios de comunicação geralmente cobrem uma história que parece estar recebendo muita atenção nas redes sociais. As empresas de assessoria antiéticas costumam explorar esse fato comprando curtidas, ações e engajamento, criando um falso hype para um produto, pessoa ou organização específica que, de outra forma, não seria coberta.
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Repensando o relacionamento
O jornalismo não é perfeito, mas encontrar o equilíbrio entre relações públicas e jornalismo é benéfico para ambas as partes. À medida que esse equilíbrio muda em favor das relações públicas, fica mais difícil para o público confiar nas notícias. Isso leva a táticas de relações públicas mais agressivas, minando ainda mais a confiança do público. Todo mundo perde.
Medidas podem ser tomadas para reequilibrar a relação entre jornalismo e relações públicas. O jornalismo deve ser fortalecido, incluindo notícias locais, para que os jornalistas tenham os recursos para recusar o conteúdo patrocinado e resistir às pautas das relações públicas. Isso significa que todos temos um papel a cumprir no pagamento do jornalismo que valorizamos, e novos modelos de financiamento devem ser desenvolvidos para ajudar a fornecer recursos para o jornalismo independente e de pequeno porte.
Para tanto, redes de empreendedorismo como o indiegraf e outras oportunidades para o jornalismo independente precisam ser apoiadas com treinamento em empreendedorismo de mídia, recursos do governo para apoiar empreendedores de jornalismo e também por nossos próprios hábitos.
Jornalistas que são corajosos o suficiente para se tornarem empreendedores também abrindo suas próprias publicações precisam que paguemos por seu conteúdo por meio de Substack, Patreon ou outros serviços de assinatura. Isso terá um impacto em cascata, pois esses jornalistas empreendedores criam pequenos negócios que podem oferecer novas oportunidades de trabalho para outros jornalistas e estudantes de jornalismo.
Finalmente, as associações profissionais de relações públicas, como a Sociedade Canadense de Relações Públicas ou a Sociedade de Relações Pública dos Estados Unidos, precisam fazer mais para punir empresas de má reputação que usam táticas como astroturfing para criar falsa influência. Ao fortalecer o jornalismo e limitar as relações públicas, podemos redefinir o equilíbrio e criar um ecossistema de mídia mais saudável para todos.
Jaigris Hodson é professor de estudos interdisciplinares da Royal Roads University.
Este article é republicado do The Conversation sob licença Creative Commons license. Leia o artigo original (em inglês).
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