Quando despublicar uma matéria? Estudos examinam práticas de remoção de conteúdo

por Christine Schmidt
Sep 17, 2019 em Jornalismo digital
Anônimo

A internet não dura para sempre para todo mundo.

Os meios de notícias são notoriamente ruins em guardar seu trabalho. Arquivar a matéria na qual você derramou sangue, suor e tudo o mais é um passo crucial para ter um impacto duradouro. Mas 19 das 21 organizações de notícias de um estudo realizado no início deste ano não tomaram nenhuma providência para guardar seu conteúdo online (não, salvá-lo no Google Doc ou Github não conta). Como escrevi na época: "Para um campo que gosta de se considerar o autor do primeiro rascunho da história, a grande maioria desses autores não prioriza como salvar e compartilhar essa história para o futuro".

Mas outra questão igualmente importante é despublicar: uma agência de notícias que escolhe remover um artigo da internet, geralmente a pedido de uma pessoa mencionada na matéria, geralmente relacionada a um crime. Há o argumento a se fazer de poupar menores de idade por uma ofensa boba de anos atrás quando se candidatam à faculdade ou procuram emprego, mas também há a questão de apagar o primeiro rascunho da história. Você não sabe quem vai precisar dessa informação em que contexto no futuro.

Há uma área bastante cinzenta entre esses dois pontos, e Deborah Dwyer passou os últimos anos analisando-a. Ela é uma doutoranda na Universidade da Carolina do Norte em Chapel Hill e está escrevendo sua dissertação sobre a ética e a praticidade de despublicar. Com base no estudo de Kathy English em 2009 sobre o mesmo tópico, Dwyer revisitou a questão com uma dúzia de entrevistas qualitativas e uma pesquisa com mais de 100 líderes de redações em 2017 e encontrou o mesmo resultado: muito poucos veículos de comunicação têm uma política ou padrões gerais rigorosos. Muito poucas empresas realmente sabem o que estão fazendo ao despublicar.

“Sabemos como as pessoas lidam com correções: há uma política. O que não necessariamente comunicam é como lidam com a publicação e remoção da visão pública", disse Dwyer.

Ela define despublicar como:

O ato de excluir conteúdo factual publicado anteriormente online em resposta a uma solicitação externa motivada por razões pessoais, como vergonha ou preocupação com a privacidade.

Aqui está um resumo do que ela encontrou até agora:

  1. 80% dos veículos de comunicação pesquisados ​​haviam estabelecido políticas de despublicação, mas quase a metade não era por escrito e apenas 2% eram compartilhados fora da redação.
  2. Mesmo dentro da redação, a política não era clara: 14% das redações incluíam diretrizes de despublicação em um manual ou guia oficial da equipe, um terço disse que as pessoas aprenderam sobre despublicação no trabalho informalmente e 40% disseram que só souberam disso quando um problema surgiu.
  3. Quem tem a palavra final? Geralmente, é o editor-chefe e/ou o editor-gerente, mas não são eles que controlam o site. Sim, a equipe de TI: 64% dos entrevistados disseram que a TI era capaz de remover conteúdo autonomamente (18% não tinham certeza se a equipe podia ou não). Cerca de um terço disse não ter certeza se o departamento de TI sabia que eles tinham uma política.
  4. Quando o conteúdo é removido, não está claro onde exatamente ainda está. Menos de 5% dos entrevistados disseram manter um sistema para rastrear as solicitações e o processo de tomada de decisão para a publicação de conteúdo. Quarenta e oito por cento disseram que não têm um sistema ou mesmo guardam os e-mails pedindo pela  despublicação.
  5. Três quartos dos pedidos de despublicação estavam relacionados a crimes.
  6. Metade das redações que despublica itens atualiza o conteúdo com uma observação sobre sua remoção, e algumas escrevem um artigo de acompanhamento, especialmente ao se tratar de um processo judicial. (Essas acusações foram retiradas ou as condenações foram extintas? Aqui está uma postagem rápida que será exibida primeiro nos resultados de pesquisa.) Mas cerca de um quarto delas remove o conteúdo em questão sem nenhuma notificação aos leitores. Alguns também têm certos tipos de artigos "pôr do sol" ou são automaticamente despublicados depois de alguns anos.
  7. Curiosamente, Dwyer descobriu que algumas redações pedem aos solicitantes das despublicações que forneçam uma documentação dos motivos da mudança, geralmente documentos legais, mas outros fazem o trabalho braçal ou pedem a um repórter para investigá-lo. Duas instâncias envolveram pessoas que corriam risco de suicídio relacionadas ao conteúdo que desejavam despublicar; uma das redações exigia a certificação de um terapeuta declarando que a publicação era um problema.

Algumas redações, na tentativa de serem mais compassivas, optaram por não cobrir crimes de menor escala ou publicar fotos policiais. Se você não publicar a cobertura de crimes menores em primeiro lugar, não precisará despublicá-la mais tarde. Mas também formaram sistemas para avaliar sua cobertura retroativamente.

“Começamos isso em julho: se você fosse acusado de um crime menor — tirando crimes violentos e outras coisas — e fosse ao juiz e usasse o sistema pelo qual os contribuintes pagam para que seu registro seja selado, tiraríamos seu nome das matérias. Você tem que fornecer a prova [de que esteve no juiz] porque, uma vez selada, não conseguimos ver a ordem de selamento ”, disse Chris Ninn do Cleveland.com/Advance Ohio ao Nieman Lab no ano passado. "Realmente se resume a: quanto tempo alguém tem que pagar por um erro?"

O que se esquece é realmente esquecido? Quem pode ser esquecido? Como diferentes mídias lidam com a despublicação?

“Este não é um problema de tecnologia. Esse é um problema para a sociedade responder: estamos dispostos a colocar o passado das pessoas em contexto e permitir que elas mudem?”, disse Dwyer. Ela ressaltou que todos esses cenários de despublicações envolvem indivíduos até agora; quando empresas ou governos começam a solicitar a despublicação, o caso é diferente. (Essa também é uma situação muito mais complicada em países com leis referentes ao direito de ser esquecido.)

Depois de estudar isso nos últimos anos, Dwyer agora propõe ter um comitê de despublicação. Mas ela também alertou que as pessoas que tomam essas decisões precisam entender a tecnologia envolvida na despublicação e também precisam ser transparentes com os leitores e funcionários que podem um dia querer saber para onde foi a matéria.


 Este artigo foi publicado originalmente pelo Nieman Lab. Foi republicado na IJNet com permissão.

Imagem principal sob licença CC no Unsplash via Celal Erdogdu