Uma rede de jornalistas na África Oriental lançou o primeiro projeto de geojornalismo da África com foco em água. Através de uma plataforma chamada InfoNile, jornalistas estão usando dados e mapeamento para melhor cobrir questões relacionadas aos recursos hídricos ao longo da bacia do Nilo.
O Nilo é o rio mais longo da África, cobrindo mais de 6.853 km em 11 países, incluindo a Tanzânia, Uganda, Ruanda, Burundi, República Democrática do Congo, Quênia, Etiópia, Eritreia, Sudão do Sul, República do Sudão e Egito. É um dos recursos hídricos mais importantes da África e a única fonte de água doce para muitos desses países. À medida que a demanda de água na região aumenta, importantes questões transfronteiriças em torno do acesso e disponibilidade de água estão surgindo para as mais de 300 milhões de pessoas que dependem dela. No entanto, as reportagens permanecem amplamente fragmentados e focadas por país, às vezes piorando o conflito de água na região.
Lançado em 2017, o InfoNile busca abordar esses assuntos mapeando as histórias sobre a água na bacia do Nilo para ajudar o público a entender melhor as questões relacionadas à água e ao meio ambiente. O projeto usa um modelo único, incorporando dados, mapas científicos, imagens de satélite e imagens de drones para uma visão mais abrangente dos eventos ao longo da bacia do Nilo. É liderado pelo editor do Vision Group, Fredrick Mugira, de Uganda, e por Annika McGinnis, uma jornalista freelance, anteriormente da Reuters, também sediada em Uganda. A plataforma é parceira de 31 organizações de notícias e mais de 100 jornalistas ambientais através da rede Water Journalists Africa, que republica conteúdo dos países da bacia para um público mais amplo.
A plataforma atualmente contém conjuntos de dados e mapas da bacia hidrográfica, com histórias locais incorporadas como camadas nos mapas. A equipe desenvolveu mapas de blocos de petróleo e gás, barragens e pântanos na bacia do Nilo, bem como um mapa do índice da seca que mede a gravidade da seca em diferentes áreas. Cada mapa é acompanhado por histórias multimídia que ajudam a ampliar a compreensão do público sobre o impacto na população e economia da região.
A plataforma permite que usuários baixem os dados e compartilhem todos os mapas em seus próprios sites usando um código de incorporação.
“Nosso objetivo é ter uma plataforma de fácil utilização para os formuladores de políticas, cidadãos e cientistas entenderem a dimensão mais ampla dos problemas da água no Nilo”, diz McGinnis. "Também incentivamos o jornalismo cidadão, e os usuários têm a opção de enviar uma reportagem pelo site InfoNile."
Para estabelecer seu modelo, a equipe fez parcerias com várias organizações, incluindo o Code for Africa, Internews, Earth Journalism Network e IHE Delft Institute for Water Education para fornecer subsídios de treinamento e reportagem aos jornalistas que trabalham no projeto. “Nós tivemos sucesso apresentando jornalistas locais ao conceito de combinação de dados, mapas e narrações interativas online -- algo que a maioria deles não havia feito antes”, diz Mugira.
O editor de dados do ICFJ Knight e Code for Africa, Jacopo Ottaviani, trabalha em estreita colaboração com o InfoNile, fornecendo suporte de dados para jornalistas na rede.
“A equipe de dados do Code for Africa trabalha com jornalistas do InfoNile para criar visualizações de dados para suas matérias”, diz Ottaviani. “Também estamos envolvidos em ajudar a liberar mais dados sobre o Nilo para tornar seus códigos abertos e acessíveis a jornalistas e cidadãos em geral.”
A equipe de dados está atualmente trabalhando na extração de dados de documentos PDF mantidos pela iniciativa de dados do Nilo para uso na plataforma. A equipe espera usar esses dados para desenvolver mais mapas baseados em temas como secas, inundações e mudanças na precipitação na bacia do Nilo; biodiversidade e espécies ameaçadas de extinção; e a disparidade entre o crescimento populacional e a inadequação da água na região.
O InfoNile também recebeu financiamento de suas organizações parceiras, o que lhes permitiu conceder subsídios de reportagem a 17 jornalistas para a produção de histórias relacionadas à água. Entre elas estão uma matéria sobre uma erva daninha que crescia descontroladamente; a infestação do jacinto de água no lago Tana, na Etiópia; a seca do lago Tanganica, na Tanzânia; uma reportagem de jornalismo de soluções sobre uma lagoa que salva o rio Mara da poluição da mineração de ouro; e uma série de histórias com foco no surto de cólera de 2018 na Tanzânia.
A equipe espera levantar mais fundos para apoiar o jornalismo e as operações do projeto. “Temos pelo menos três jornalistas trabalhando em cada um dos 11 países da bacia do Nilo, exceto na Eritreia”, diz Mugira. “Também temos uma equipe de intérpretes trabalhando para traduzir as matérias em suaíli, árabe e amárico, para permitir a publicação cruzada entre nossos parceiros.”
A equipe dá crédito a várias ferramentas e recursos por ajudá-los a construir uma plataforma de geojornalismo eficiente, incluindo o tema JEO WordPress, que permite a usuários visualizar conjuntos de dados geocodificados e literalmente "mapear" histórias como camadas em mapas.
“Nossos mapas são criados em MapBox ou CartoDB e integrados ao site WordPress”, diz McGinnis. “Usamos o Shorthand para contar histórias multimídia, que é uma ferramenta que nos foi apresentada [por Ottaviani]. O Digital Globe é outra ferramenta útil que usamos para localizar imagens de satélite colocando coordenadas para uma pesquisa rápida. Também usamos Juxtapose, uma ferramenta desenvolvida pelo Knightlab para apresentar imagens que mostram mudanças ocorridas na bacia do Nilo ao longo do tempo.”
Um bom exemplo de como a equipe usa essas ferramentas é "Swamp City", uma história multimídia que mostra como a urbanização destruiu um dos pântanos mais críticos de Kampala. Outro projeto de reportagem transnacional, “An Ancient River Divided”, incorpora também podcasts e documentários para uma exploração profunda do conflito em torno do Nilo.
“Nosso objetivo final é explorar plataformas e tecnologias de jornalismo inovadoras e ajudar a construir uma geração de jornalistas ambientais africanos com conhecimento de dados”, diz Mugira.
Imagem sob licença CC no Flickr via Michael Gwyther-Jones