Iniciativa ajuda mídia africana a entrar no mundo dos dados

Jul 25, 2023 em Jornalismo de dados
A man and a woman looking at a notebook.

Que jornalista gosta de números? 65% dos jornalistas no mundo se consideram sem habilidade para produzir reportagens com dados, de acordo com a pesquisa de 2022 State of Data Journalism.

Na África, o projeto Media Hack Collective (MHC) está tratando do problema, treinando jornalistas com conhecimentos práticos ligados a habilidades e ferramentas de jornalismo de dados. Desde o seu lançamento, em 2020, o MHC já treinou mais de 200 jornalistas na África do Sul, Nigéria, Quênia, Zimbábue e Uganda.

"Há relativamente pouco jornalismo de dados feito no continente, e se pudermos encorajar outras pessoas a tentarem usar dados em suas reportagens como resultado do que fazemos, consideramos isso um sucesso", diz Alastair Otter, cofundador do MHC.

Jornalismo de dados durante a pandemia

Frustrado com a falta de jornalismo de dados no continente, Otter e a colega também jornalista Laura Grant lançaram o MHC no início da pandemia de COVID-19. "Ambos trabalhamos em grandes redações, mas não tivemos a oportunidade de praticar o jornalismo de dados de forma significativa. O MHC foi uma oportunidade de fazer parte do trabalho que gostaríamos de fazer", diz Otter.

Com o surgimento da pandemia, a dupla viu uma oportunidade de produzir reportagens de dados de impacto em torno das implicações do vírus. Eles construíram um painel interativo que monitorava os casos de COVID-19 na África do Sul, e que depois se expandiu para outros países.

"O valor das habilidades de jornalismo de dados veio à tona durante a COVID-19. Nós percebemos que as visualizações que compartilhávamos estavam ajudando as pessoas a entender como a pandemia estava progredindo", diz Otter.

Em outubro de 2021, o MHC realizou uma masterclass de jornalismo de dados e um programa para capacitar estudantes de jornalismo com habilidades críticas para fazer reportagens de dados. Os participantes aprenderam como buscar, extrair e analisar conjuntos de dados, produzir matérias orientadas a dados e usar infográficos e ferramentas de visualização para apresentar dados. Os participantes receberam subsídios para produzir reportagens de dados.

"Vemos muitas pessoas que treinamos fazendo um ótimo trabalho, então há a sensação de que temos um impacto", diz Otter.

Desenvolvimento de habilidades de jornalismo de dados

O aspecto mais valioso dos cursos do MHC, de acordo com Grant, reside na forma como eles desenvolvem a capacidade dos jornalistas de ler e entender dados.

"É sobre dar às pessoas confiança para saber que se elas encontrarem uma estatística – como uma taxa de aprovação escolar – elas vão conseguir analisar os dados originais ou explorar os dados em um gráfico e encontrar uma tendência que pode contextualizar uma matéria", explica Grant. "É um passo de cada vez. A quantidade de matérias e a qualidade da narrativa só vão melhorar com o tempo."

O MHC também oferece apoio técnico e editorial para ajudar seus alunos a produzir matérias de dados em seus trabalhos. "Muitas vezes, quando as pessoas que treinamos voltam para suas redações, elas são uma das poucas pessoas com habilidades de dados. Às vezes elas são as únicas pessoas", diz Otter. "As expectativas de entrega podem ser grandes. Pode levar um tempo para se produzir uma matéria baseada em dados, e há pressão nas redações para entregar matérias rápido. Oferecemos suporte para nossos ex-alunos caso precisem."

Oge Udegbunam, aluna da masterclass de 2021, conseguiu produzir mais matérias baseadas em dados para a sua editoria de agricultura na Premium Times. "O curso me ajudou a melhorar minhas habilidades de análise de dados. Agora eu consigo entender e interpretar melhor documentos orçamentários e produzir matérias a partir deles para fazer o governo prestar contas", diz.

O curso do MHC foi "instrutivo e fundamental" para Abiodun Jamiu, ajudando-o a usar dados para cobrir conflitos no norte da Nigéria, e humanizar suas matérias para além dos números de mortos e feridos. "Pessoalmente, eu aprendi que números têm impactos. Cada número representa a existência de uma pessoa", diz. "Esses números devem ser humanizados e simplificados de forma que os cidadãos possam se identificar e entender para tomar decisões embasadas."

Para ajudar a audiência a entender melhor as notícias por meio do jornalismo de dados, em 2021 o MHC lançou o The Outlier, uma publicação que usa infográficos, gráficos e outras ferramentas de visualização de dados para contar histórias que afetam a vida cotidiana das pessoas em uma variedade de questões, incluindo saúde, política, educação, mudança climática e economia.  

"Nós focamos inicialmente na produção diária de gráficos pequenos para ajudar as pessoas a entenderem as questões do dia num relance", diz Otter. 

Desafios

Poucas redações na África podem arcar com os custos de treinamentos de jornalismo de dados para seus repórteres, diz Otter, acrescentando que também é difícil ensinar os aspectos complexos do jornalismo de dados para um grupo grande de jornalistas, principalmente online.

O acesso à informação no continente é outra grande barreira. "Normalmente, o jornalismo de dados na África é difícil por causa dos recursos limitados, mas principalmente porque há fontes de dados muito limitadas", diz.

Para lidar com os desafios, o MHC criou um curso gratuito introdutório por email que familiariza os jornalistas com alguns fundamentos do jornalismo de dados.

"Nós focamos em ensinar o básico para que possamos apresentar o maior número possível de pessoas ao jornalismo de dados e dar a elas as habilidades suficientes para começar a usar dados no trabalho diário", diz Otter. "Nosso objetivo com o curso é fazer o que pudermos para exibir o jornalismo de dados africano e ajudar outros profissionais a entrarem nessa área."


Foto por MART PRODUCTION.