O tráfico de vida selvagem está prosperando. Suas gangues de criminosos crescem em petulância e sofisticação à medida que o acesso à internet cria um corredor para que traficantes de vida selvagem cometam crimes ecológicos hediondos. No entanto, esse tema é pouco reportado e apresenta grandes desafios para jornalistas que investigam os becos escuros e as vastas células do crime.
As preocupações com o comércio ilegal de animais selvagens estão crescendo entre os profissionais do meio ambiente e defensores da biodiversidade em face do compromisso tímido de muitos governos em todo o mundo para combater o crime. No entanto, há um novo compromisso da parte deles para melhorar suas várias abordagens.
Atualmente, o comércio ilegal de animais selvagens é estimado em cerca de US$23 bilhões anuais, demonstrando seu impacto na economia mundial. E o impacto que o crime do tráfico de vida selvagem pode ter sobre a saúde pode ser surpreendente, especialmente porque alguns estudos sugerem uma possível ligação entre o tráfico de pangolins e a origem do coronavírus.
Em uma sessão virtual da Conferência de Jornalismo Investigativo da África 2020, tive a oportunidade de ouvir Fiona McLeod, diretora fundadora da organização Oxpeckers de jornalismo investigativo ambiental. Ela apresentou ferramentas que os jornalistas podem adotar enquanto investigavam crimes contra a fauna.
O objetivo das ferramentas, ela acrescentou, é rastrear e expor criminosos e sindicatos na África e além. Ela destacou que a Oxpeckers desenvolveu bancos de dados abrangentes de infrações ecológicas e está trabalhando com parceiros para contar histórias e disponibilizar recursos ao público.
“Sabemos que o comércio ilegal de animais selvagens está acontecendo, então nosso objetivo é tornar os dados mais acessíveis”, disse McLeod. “Ao manter esses dados exclusivos ou ocultos, não há responsabilidade, não há compreensão por parte do público e não há adesão ao que estamos fazendo.”
Abaixo estão algumas ferramentas, desenvolvidas pela Oxpeckers, para ajudar jornalistas interessados em investigar o comércio ilegal de animais selvagens.
[Leia mais: Jornalistas na África e Ásia colaboram para investigar comércio ilícito de animais silvestres]
Rhino PoachTracker
Com um clique no botão, esta ferramenta revela estatísticas sobre incidentes de caça furtiva de rinoceronte na África do Sul, especificamente de mortes de rinocerontes e prisões de caça furtiva no país desde 2010. A ferramenta é baseada em dados originais coletados em tribunais, agências de aplicação da lei e web scraping pela Oxpeckers, que são agregados e filtrados para serem apresentados de forma interativa e acessível.
A Oxpeckers lançou a ferramenta na África do Sul, preenchendo a lacuna depois que ficou claro que o governo, que anteriormente fornecia as estatísticas, ficou aquém e não podia mais fazê-lo regularmente, criando um vazio de informações precisas e oportunas acessíveis.
Processos judiciais referentes a rinocerontes
Esta ferramenta agrega dados sobre os processos judiciais envolvendo caçadores de rinocerontes na África Austral. Depois de desenvolver uma ferramenta que rastreia as mortes de rinocerontes e prisões relacionadas (acima), a Oxpeckers achou que era uma boa ideia desenvolver outra ferramenta para rastrear processos judiciais, para que os usuários pudessem ver as prisões de caça furtiva através do rastreador. Os dados para alimentar esta ferramenta são coletados pela Oxpeckers agregando conjuntos de dados existentes armazenados em diferentes lugares.
Um jornalista experiente em dados pode usar essa ferramenta para descobrir informações para contar histórias, enquanto funcionários do governo e grupos de defesa também podem fazer uso dela.
[Leia mais: Dicas e fontes para cobrir o tráfico mundial de vida selvagem]
#WildEye
Existem duas versões desta ferramenta: #WildEye Europe e #WildEye Asia. Essas ferramentas rastreiam apreensões, prisões, processos judiciais e condenações relacionadas a crimes contra a vida selvagem nas respectivas regiões. Os usuários podem filtrar os mapas com base em diferentes categorias de dados e pesquisar por países, animais e datas específicos. Se estão interessados em um caso específico, os usuários podem se inscrever aos alertas para receber atualizações.
Ambas as ferramentas são de código aberto, o que significa que estão publicamente disponíveis e podem ser acessadas e usadas por qualquer pessoa. #WildEye funciona permitindo ao usuário solicitar, compartilhar e desenvolver histórias. Os dados vêm de registros de tribunais ou de pedidos de liberdade de informação e são examinados por uma equipe de investigadores montada pela Oxpeckers.
Usando as ferramentas
Jornalistas de todo o mundo têm usado essas ferramentas para contar suas histórias de investigação ambiental. A jornalista e editora do Haluan.co na Indonésia, Rezza Aji Pratama, junto com sua colega Wan Ulfa Nur Zuhra, especialista em visualização de dados e editora executiva da Rede de Jornalismo de Dados da Indonésia, investigou como uma pena mais pesada na nova legislação do país poderia deter os crimes contra animais selvagens. Elas usaram #WildEye para tornar a investigação possível, e a história foi publicada na Oxpeckers.
Em outro exemplo, o jornalista chinês Bao Choy, membro do Environmental Reporting Collective, analisou os dados de 2019 e 2020 disponíveis em #WildEye para explorar o tipo de sentenças que os contrabandistas de Pangolin receberam na China. A reportagem revelou que os infratores do tráfico de pangolins na China receberam sentenças leves que provavelmente não impediriam o comércio ilegal.
Choy esperava que a história desencadeasse uma ação por parte das autoridades e tribunais chineses para tomar medidas mais rígidas contra os contrabandistas de pangolins pós-COVID, mas nada foi divulgado.
Wole Elegbede é jornalista multimídia e diretor de projetos do Press Attack Monitor, uma plataforma que expõe violações da liberdade de imprensa na Nigéria. Ele foi escolhido pelo Programa de Jornalismo (Wits Journalism) da Universidade de Witwatersrand, em Joanesburgo, na África do Sul, como membro da Conferência de Jornalismo Investigativo Africano 2020, organizada pelo Wits Journalism.
Imagem sob licença CC no Unsplash via Kevin Folk.