Dicas para manter uma carreira sustentável na mídia

Dec 18, 2024 em Sustentabilidade da mídia
Newsroom studio

Com a indústria jornalística se debatendo com déficit de recursos financeiros, demissões, queda da confiança e tecnologias que se transformam rapidamente, jornalistas — de freelancers a líderes de redação — têm como prioridade a segurança profissional e financeira. 

 

 

De acordo com o relatório State of Journalism, produzido pelo Muck Rack, cerca de um a cada três jornalistas em 2024 expressaram preocupação com a falta de recursos financeiros e de confiança no jornalismo — uma porcentagem similar relatou ter sido demitida ou visto a empresa onde trabalha ser comprada por outra organização. Mais de dois terços afirmaram trabalhar mais de 40 horas por semana, enquanto menos da metade teve renda anual superior a US$ 70.000. Para contextualizar, a renda anual para se viver confortavelmente nas principais cidades dos EUA, onde muitos jornalistas residem, é em torno de US $96.500.

Esses fatores podem levar os jornalistas a altos níveis de estresse e esgotamento. "Eu acho que não é segredo para ninguém que o jornalismo é uma profissão estressante", disse Andrew Mercier, diretor editorial do Muck Rack, em uma sessão recente do Fórum de Reportagem de Crise da IJNet. "Em uma escala de um a dez, a maioria dos jornalistas [na pesquisa State of Journalism] se autoclassificaram no nível 7 em termos de estresse no trabalho."

Mercier teve a companhia de Samanta do Carmo, gerente executiva da Ajor, para discutir como jornalistas podem ficar bem e prosperarem em um ambiente profissional cada vez mais incerto. A seguir estão os conselhos deles:


Como trabalhar sob momentos incertos de transição

Com as redações passando por mudanças estruturais ou de equipe, jornalistas muitas vezes podem sentir que suas carreiras estão em um terreno instável. Do Carmo, cujo trabalho envolve apoiar gestores de redação de nível médio, enfatizou a necessidade de editores e gestores priorizarem a transparência quando os repórteres passam por momentos de incerteza.  

Ela observa que, no Brasil, líderes de redações, na maioria das vezes, se veem esgotados pelas condições da profissão e pelas flutuações financeiras, e podem ter dificuldade para fazer um planejamento de longo prazo. "Nossa cultura tem essa coisa muito importante de ser espontâneo, então aqui no Brasil é difícil para os líderes valorizar a estratégia", disse. 

Enquanto isso, incertezas cotidianas podem ser estressantes para os repórteres que eles comandam, podendo ficar ansiosos não só com as demissões, mas com "os momentos em que [os líderes] não têm estratégia, não têm decisão".

"É importante pensar sobre como uma liderança ruim em condições emocionais ruins às vezes pode comprometer toda a sustentabilidade de uma organização", disse do Carmo. 

Líderes de redações devem reconhecer o estresse ao qual seus funcionários estão submetidos — principalmente se eles estiverem lidando com demissões, sugeriu do Carmo, acrescentando que o diálogo aberto pode ajudar os repórteres a gerenciar os impactos emocionais e operacionais da demissão de colegas de trabalho.

Ela também recomendou que os líderes de redações motivem seus funcionários por meio de pequenos experimentos e pensamento centrado na audiência, em vez de contar com grandes projetos ou investigações cujo progresso pode ser mais gradual. Ao abraçar pequenos projetos — e assegurar pequenas vitórias — jornalistas podem inovar e se adaptar ao mesmo tempo em que mantêm seu dever com as necessidades da audiência. "Qual tipo de serviço, em um artigo por exemplo, sua audiência precisa nesta semana?", instigou do Carmo.

Repórteres devem ter clareza tanto de seus objetivos pessoais quanto dos da equipe. Nesse aspecto, gestores devem se esforçar para que os jornalistas sob sua supervisão sejam capazes de articular a estratégia da redação e o caminho para uma nova chefia, disse do Carmo. Essa comunicação clara mantém os repórteres motivados e independentes.

"Quando as pessoas sabem quais são os projetos, objetivos e métodos que estão buscando, é mais fácil lidar com transições e mudança", disse.

Ferramentas para freelancers

Para freelancers que trabalham sem a orientação de um veículo, há ferramentas disponíveis online que podem ajudá-los a gerenciar seu trabalho em uma área desafiadora e insegura. Mercier citou recursos como o Quem compartilhou meu link? do Muck Rack, que ajuda os jornalistas a monitorar métricas relacionadas ao alcance de suas matérias, e o Fonte de Fontes, de Peter Shankman, que conecta jornalistas com fontes especializadas.

Mercier também destacou os perfis do Muck Rack, que geram um portfólio para os jornalistas, muitos dos quais já têm trabalho demais para fazer. Os perfis rastreiam a internet e são atualizados automaticamente com as matérias assinadas pelos jornalistas (mas Mercier recomenda que os jornalistas verifiquem seus perfis regularmente para garantir que estejam atualizados, demonstrando assim seu engajamento). 

"Ao se mostrar mais engajado nessas ferramentas, incluindo o Muck Rack, isso imediatamente envia um sinal de que você é experiente, você está presente", disse Mercier.

Para quem estiver fazendo a transição para o trabalho freelance pela primeira vez, Mercier e do Carmo aconselharam a pensar fora da caixa na hora de criar portfólios profissionais, independentemente da plataforma usada. "Pense sobre as situações difíceis que você enfrentou e como você criou soluções para elas", disse do Carmo. "Esse tipo de raciocínio pode ser um portfólio também."

Muitos jornalistas freelance também produzem conteúdo de marketing para complementar sua renda, observa Mercier. Embora isso não pareça animador, ainda assim pode ser gratificante para um jornalista trabalhar com uma marca que se alinhe a uma missão que o profissional valoriza.

Mercier acrescentou que, à medida que jornalistas se expandem para plataformas como Substack e YouTube, é importante ficar de olho em como outros profissionais estão tendo sucesso nelas e considerar abordagens semelhantes.

Teste e implementação de novas tecnologias

Tendo em vista a evolução das redes sociais e os hábitos de uso das mesmas, e em meio à ascensão da IA, ambos os convidados recomendaram que os jornalistas mantenham a mente aberta para novas tecnologias e as encarem com cuidado.

Mercier encorajou os jornalistas a explorar a tecnologia o máximo possível diante da mudança de interesses do usuário. "O que já fizemos não necessariamente tem funcionado", disse, em referência ao engajamento da audiência em plataformas online. "Temos que testar algumas coisas aleatoriamente." 

Ele reconhece que testar é mais fácil na teoria que na prática, e fazer a gestão de novas redes sociais já tendo uma agenda rigorosa pode ser difícil. Consequentemente, jornalistas não devem se preocupar em estar presentes em todas as plataformas, mas devem ao menos estar cientes das opções e das audiências que atendem. 

As redações também deve estar dispostas a se envolver com novas tecnologias, segundo Mercier. Com as pessoas cada vez mais recorrendo às redes sociais para acessar notícias, os veículos devem ir atrás delas nessas plataformas — e experimentar para chegar a diferentes audiências de um modo que se adeque à sua cobertura, como adotar estratégias para o TikTok ou YouTube.

Do Carmo, por sua vez, sugeriu que jornalistas devem tirar um tempo para descobrir como suas ideias existentes podem se conectar a inovações e tendências. "Nós somos um setor muito criativo", disse. "Às vezes temos simplesmente que tirar um tempo para organizar nossas ideias." 

Apesar dos desafios enfrentados pela profissão, Mercier permanece sendo inspirado pelo trabalho duro dos jornalistas e seu comprometimento em educar o público. "Ainda há jornalismo incrível sendo feito em toda parte", disse. "Vamos focar nisso com a mesma intensidade dos ataques que estão vindo na direção dos jornalistas."

Recursos úteis

Fonte de Fontes, por Peter Shankman

Do Muck Rack:

Relatório Estado do Jornalismo 2024

Relatório Estado do Equilíbrio Vida-Trabalho no Jornalismo

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Foto por Brad Weaver via Unsplash.