As mulheres correspondem a pelo menos metade da população em muitos países e a porcentagem delas está aumentando. No entanto, muitos jornalistas e veículos não as enxergam ou as ouvem, disse Catherine Gicheru, bolsista do programa ICFJ Knight, durante um painel recente sobre gênero e jornalismo.
"O primeiro desafio é aceitar a realidade, ser humilde e aceitar que, como jornalista ou como veículo jornalístico, estamos fracassando na nossa responsabilidade como jornalistas quando dizemos que estamos sendo representativos", disse Gicheru, em uma fala no Fórum Internacional de Jornalismo em Atenas, na Grécia, organizado pela incubadora grega do Media Education and Development (iMEdD).
Gicheru é fundadora do Projeto de Mulheres Jornalistas Africanas (AWJP), uma rede de jornalistas e analistas de dados em sete países. Ela falou junto com Eliza Anyangwe, editora geral da equipe de reportagem do programa "As Equals", da CNN.
A seguir estão algumas dicas e reflexões da conversa das duas:
Mudança de perspectiva
Algumas redações, principalmente aquelas com mais recursos, implementaram "verticais" de gênero ou editorias em resposta ao fracasso histórico de oferecer uma cobertura inclusiva, disse Anyangwe. Mas mesmo em uma redação pequena é possível usar uma lente que pode resultar em uma cobertura mais enriquecedora e representativa. Uma abordagem, por exemplo, é olhar para quem é mais impactado por um problema.
Gicheru disse que muitos dos recursos hoje são direcionados à cobertura do clima e de conflitos, mas a reportagem também precisa focar no impacto desses problemas em pessoas de diferentes gêneros, principalmente mulheres. Do contrário, "estaremos deixando as coisas passarem", disse. "Estaremos perdendo a noção do que é realmente importante no fim das contas."
Gicheru, pioneira na mídia queniana, criou uma rede de mulheres jornalistas em Gana, no Quênia, na Nigéria, no Senegal, na África do Sul, na Tanzânia e em Uganda que se uniu para produzir uma cobertura orientada por dados de questões de saúde, gênero e economia com pouco espaço na mídia.
"A ideia não é não só pressionar para que se tenha mais mulheres em posições de autoridade", disse, "mas fazer uma mudança de fato no modo como vemos as coisas".
Notícias de impacto
Jornalistas são treinados para cobrir o excepcional, mas isso significa que muitas pautas sobre gênero ficam sem cobertura. "Isso significa que, na verdade, a violência diária ou discriminações diárias se tornam um lugar comum a ser informado", disse Anyangwe.
Ela disse que é importante abordar a cobertura de gênero com rigor jornalístico. Por exemplo, jornalistas devem se aprofundar no financiamento de campanhas de extrema-direita que usam o gênero para mostrar divisão e guerra cultural, destacar esforços para desmanchar a educação sexual abrangente e desmascarar violência online coordenada criada para silenciar as vozes de mulheres e pessoas não-binárias.
"Quando você trata o jornalismo de gênero não como algo frívolo ou, digamos, 'questões de mulheres', o que poderia estar em uma revista Comospolitan, mas de fato como uma cobertura de problemas sérios, se você o coloca dessa forma, então os formuladores de políticas são responsabilizados por aqueles problemas e precisam falar com elas", disse Anyangwe.
Fazer uma auditoria no recrutamento de pessoas e nas autorias das matérias, o que ajuda a determinar se a cobertura é representativa, é valioso, disse Anyangwe, já que sinaliza para a equipe da redação o que importa para o veículo e muda os incentivos aos editores para incluir uma diversidade de vozes.
Violência online
Mulheres jornalistas do mundo todo estão lutando com campanhas de violência online coordenadas e massivas, criadas para silenciá-las. Quem cobre gênero são os alvos principais. É importante abordar as plataformas de tecnologia e exigir uma atitude por meio de uma frente unida entre países, disse Gicheru, porque o problema é global e uma campanha global é a única chance delas ouvirem. Mas ela também disse que é imperativo que jornalistas deem passos individualmente (para materiais, consulte a Coalizão Contra a Violência Online).
"Você precisa ser capaz de saber como cuidar de você online", disse Gicheru. "Você precisa descobrir quais são as melhores formas de lidar com esses tipos de desafios com as limitações da sua comunidade, da sua sociedade e do seu espaço, e buscar solidariedade em diferentes países", disse. "Tenha muita atenção, seja prudente e tome essas precauções necessárias."
Argumentação
Argumentar a favor de uma cobertura de gênero melhor e expandida nas redações pode ainda ser um desafio, apesar de sua necessidade óbvia.
Anyangwe enfatizou que esse tipo de cobertura pode levar a um grande impacto e que esta é uma força motriz para muitos jornalistas. Gicheru disse que ela sempre destaca o impacto nos negócios ao se oferecer uma cobertura melhor e maior para metade da população.
"Se você não vai se motivar pela sua responsabilidade jornalística", disse Gicheru, "pense na sua sobrevivência".
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