Como jornalistas podem gerenciar estresse e sobrecarga digital

por Donethe Cyprien
Jul 10, 2020 em Reportagem sobre COVID-19
Ovos com carinhas pintadas mostrando emoções diferentes

Em parceria com nossa organização-matriz, o Centro Internacional para Jornalistas (ICFJ, em inglês), a IJNet está conectando jornalistas com especialistas em saúde e líderes de redação por meio de uma série de seminários online sobre a COVID-19. A série faz parte do Fórum de Reportagem sobre a Crise Global de Saúde do ICFJ.

Este artigo é parte de nossa cobertura online de reportagem sobre COVID-19. Para ver mais recursos, clique aqui.

A tecnologia é uma parte essencial do trabalho do jornalista, mas também pode ser um estressor importante, especialmente quando repórteres fazem malabarismos para lidar com as pressões adicionais da pandemia de COVID-19.

"Não tivemos um período como este na história em que temos tanto estímulo há tanto tempo e sem parar", disse Mar Cabra, candidata à bolsa Acumen e jornalista vencedora do Prêmio Pulitzer. “Recebemos todos esses estímulos e todas essas notificações pipocando na nossa frente. E isso está realmente mudando a maneira como nossos cérebros estão operando, porque nossos cérebros não são projetados para tantos estímulos tão rápidos.”

Cabra e Kim Brice, uma treinadora de liderança pessoal especializada em redução do estresse baseada em mindfulness [atenção plena] e que trabalhou como ativista em liberdade de mídia, conduziram um treinamento recente que destacou técnicas específicas que podem ser usadas para lidar com o estresse de maneira mais saudável. Foi a primeira sessão do The Self-Investigation, um programa organizado por Cabra e Brice com o apoio do Centro Internacional para Jornalistas (ICFJ, em inglês), Open News e Online News Association (ONA).

Elas conversaram com jornalistas de diferentes partes do mundo que compartilharam desafios semelhantes, como dificuldades em trabalhar em casa, sobrecarga digital, maior ansiedade e insegurança no trabalho. "Temos apenas um corpo", disse Brice durante o webinar. “E nosso corpo nos leva na vida. É o seu corpo que permite que você faça tudo o que é capaz, que permite sentir tudo o que é capaz de sentir a cada segundo do dia, desde o momento em que você nasceu até o momento em que morre. E é o único corpo que temos. Então, vale a pena aprender a ouvi-lo.”

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Cabra, ex-editora de dados do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ, em inglês), fez parte da equipe vencedora do Prêmio Pulitzer do Panama Papers. Apesar de trabalhar com uma grande equipe, com jornalistas de todo o mundo, ela se sentia muito infeliz por dentro.

"Depois de mais ou menos um ano, depois de publicar o Panama Papers, eu fiquei esgotada e não vi outra opção senão largar o emprego para encontrar o que me deixava feliz", disse Cabra, que trabalhou com Brice para se recuperar do esgotamento.

Ela aprendeu que a tecnologia tem um efeito maior sobre nós do que se conhece comumente. Muitas pessoas, por exemplo, sofrem de "apneia da tela" enquanto usam computadores ou telefones. A respiração delas se torna mais superficial ou até pode parar, ela disse.

 

Quatro habilidades para gerenciar o estresse

Brice disse que os jornalistas já empregam em seus trabalhos a experiência necessária para gerenciar o estresse: coleta de fatos, prática de habilidades, mentalidade curiosa e aberta, e motivação.

Para o primeiro ponto, a autoconsciência é fundamental, disse Brice. Se você não sabe o que está fazendo, não saberá o que mudar. Durante metade do nosso período de vigília, estamos no piloto automático. Temos muitas tendências sobre as quais não temos consciência.

"Vale a pena aprender a perceber em tempo real quando essas [reações automáticas] estão surgindo, especialmente se elas não servem a você", disse ela. "Então, você pode chegar a uma posição para escolher e fazer algo diferente."

Também é importante prestar atenção ao que você faz, porque "nos tornamos o que praticamos". Brice diz que os jornalistas precisam observar os comportamentos em que ficam presos durante situações estressantes e aprender a praticar uma maneira de responder que seja mais favorável.

É essencial também ser curioso e aberto sobre si mesmo, para que você possa exercer autocompaixão. Em um estudo feito com veteranos de guerra no Iraque e no Afeganistão, soldados que eram mais autocompassivos tinham menos probabilidade de sofrer de transtorno de estresse pós-traumático do que os soldados que tinham pouca ou nenhuma autocompaixão, disse Brice. Existe uma ligação direta entre autocompaixão e saúde física, mental e emocional.

[Leia mais: Tire um tempo para se recuperar de um trauma ou esgotamento]

 

A última habilidade necessária é a motivação. Um jornalista não conseguirá gerenciar a sobrecarga e estresse digital, a menos que esteja motivado a tornar sua saúde tão importante quanto seu trabalho.

"Decidir por si mesmo: por que vale a pena para mim?" disse Brice. “Para praticar para o próximo mês, se você for iniciar nessa jornada sozinho ou com a gente, por que quer fazer isso? [Pense:] O que é realmente importante para mim que eu gostaria de mudar? Porque não é apenas útil para mim, mas útil para o que faço no mundo e também será útil em todos os meus relacionamentos.”

Lidando com a sobrecarga digital

Cabra incentivou jornalistas a pensar em como limitar suas interações com a tecnologia, para que possam recuperar o controle de seu tempo e atenção. Uma maneira de fazer isso é decidir quais notificações são essenciais e quais não são. Outra é apenas verificar o e-mail em horários designados ao longo do dia.

Entre as muitas dicas disponíveis para ter uma relação mais saudável com a tecnologia, Cabra enfatizou uma que é acessível a todos: se dar tempo suficiente para pensar se você deseja executar essa ação -- como verificar o Twitter -- naquele momento. As práticas oferecidas pelo "The Self-Investigation" ensinam os jornalistas a estarem mais conscientes disso e a mudarem seu comportamento.

Ela também sugeriu a compra de dois telefones: um para o trabalho e outro para uso pessoal, quando possível. Quando se trata de estabelecer limites com a tecnologia com seus colegas, Cabra diz que é melhor começar a incentivar a todos, desde aqueles nas posições mais inferiores até nas mais superiores.

"Como dizemos, o que trazemos para a mesa é contagioso", disse Brice. "Então, se você está trazendo para a mesa uma forma de trabalho mais calma e diferente, talvez isso possa realmente inspirar outras pessoas se você estiver disposto a aceitar isso."

Quando se trata de trabalhar em casa, Brice enfatizou a comunicação.

“Uma das principais coisas que posso dizer é comunicar, comunicar, comunicar. E o que quero dizer é primeiro parar por um momento e descobrir por si mesmo, o que eu preciso? O que eu preciso? E comunique isso.

Cabra e Brice também disseram que é importante encontrar e realizar com mais regularidade as atividades que fazem você se sentir bem: tirar você da sua cabeça e ajudá-lo a se sentir mais aberto e conectado consigo mesmo e com os outros.

"The Self-Investigation" terá encontros semanais de 30 minutos em julho em que jornalistas poderão aprender e praticar técnicas de gerenciamento de estresse com os treinadores e outros jornalistas todas as terças-feiras às 10h (horário de Nova York) e quintas-feiras às 14h (horário de Nova York). Registre-se aqui. O programa terá uma segunda edição em espanhol em setembro. 


The Self-Investigation é patrocinado pela Stars4Media, cofundado pela União Europeia.

Imagem principal sob licença CC no Unsplash via Tengyart.