Como combater a desinformação direcionada à população asiática nos EUA

Jan 18, 2024 em Combate à desinformação
Graphic depicting asian americans and fake news

A desinformação está desenfreada nas comunidades de imigrantes dos EUA. E ela só está crescendo devido, em grande parte, a barreiras linguísticas, redes sociais e instrumentalização de medos arraigados. 

Ao mesmo tempo, muitos veículos não têm recursos para fazer verificação de fatos voltada a quem não fala inglês.

Hoje, os descendentes de asiáticos são o grupo racial que mais cresce no eleitorado dos EUA. Cerca de seis em 10 são imigrantes, enquanto apenas pouco mais da metade dos recém-chegados dizem dominar o inglês.

A desinformação em comunidades de origem asiática se espalha amplamente no rádio, YouTube e aplicativos populares como WeChat e WhatsApp. O WeChat, que é usado por cerca de 60% da população de origem chinesa nos EUA, é particularmente vulnerável à desinformação devido ao ecossistema hiperpartidário e conservador que recompensa conteúdo sensacionalista.   

Para aprender mais sobre o impacto da desinformação na população de origem asiática nos EUA e como combatê-la de forma efetiva e culturalmente consciente, eu entrei em contato com Nick Nguyen, cofundador e chefe de pesquisa do Viet Fact Check, e Kyle Van Fleet, sócia de comunicação estratégica da APIA Vote e chefe do programa de monitoramento de desinformação da empresa.

Barreiras linguísticas

Em muitas comunidades de asiáticos nos EUA, a linguagem é uma barreira significativa para receber informação factual.

Um menor domínio do inglês e menos veículos que operam nas línguas nativas dessa população pode fazer com que os imigrantes estejam mais suscetíveis a informação falsa e politicamente extremista divulgada por agentes maliciosos, segundo Van Fleet. Além disso, faltam iniciativas de verificação de fatos em idiomas asiáticos e as redes sociais podem ser lentas na remoção de informação falsa

"Devido ao fato de já haver uma escassez de jornalismo em geral, há cada vez menos fontes confiáveis, e essa lacuna foi preenchida por muitos ativistas hiperpartidários que estão se passando por jornalistas", diz Van Fleet. "Isso procede de fato dentro da comunidade asiática nos EUA."

É vital que os jornalistas entendam o papel significativo que o idioma desempenha na disseminação de desinformação. Para começar, as redações devem traduzir mais as suas reportagens para idiomas asiáticos, sugere Van Fleet, argumentando que jornalistas também estejam conscientes dos muitos grupos étnicos e idiomas asiáticos que precisam de informação e merecem representatividade.

Por exemplo, o Viet Fact Check, projeto da Organização Americana de Vietnamitas Progressistas, publica análises de verificação de fatos para a população de origem vietnamita nos EUA. O DesiFacts faz um trabalho semelhante em hindi e bengali, e o PiYaoBa verifica informações em chinês, para citar alguns exemplos.

Jornalistas e verificadores de fatos devem saber que os idiomas asiáticos podem diferir conforme a região do país e períodos de tempo, acrescenta Nguyen. "Uma das razões pelas quais eu acho que conseguimos durar tanto tempo é porque investimos em assegurar que o nosso conteúdo seja feito em vietnamita do sul idiomático do período anterior a 1975.

Exploração do conhecimento e do medo

Muitos veículos de verificação de fatos falham em reconhecer o nível de conhecimento que os imigrantes têm das instituições e processos eleitorais dos EUA. Por exemplo, imigrantes asiáticos que não frequentaram escolas nos EUA podem não ter aprendido sobre as especificidades das instituições dos EUA e como elas funcionam, diz Nguyen. "Isso pode viabilizar a implantação e disseminação de desinformação em torno de processos e resultados eleitorais.

"Às vezes há um entendimento diferente do que é democracia ou de como a governança deve supostamente ser", diz Van Fleet, acrescentando que, de modo mais amplo, os agentes de desinformação também têm como alvo os traumas de imigrantes asiáticos que vieram de países não-democráticos, em um esforço para gerar medo.

"Isso é também uma espécie de vulnerabilidade para a desinformação porque os traumas das pessoas, seus mal-entendidos ou perspectivas diferentes podem ser usados como armas para impor algum tipo de agenda hiperpartidária", diz.

Especificamente em comunidades de refugiados vietnamitas, as memórias do comunismo no Vietnã podem ser usadas como armas, segundo Van Fleet, para semear o medo do comunismo ou socialismo nos EUA. Em 2020, esses medos foram explorados para ajudar a sustentar alegações falsas sobre a fraude na eleição presidencial dos EUA naquele ano.  

"Quantidades significativas de desinformação miram no trauma histórico de ser um refugiado, o que atrai as pessoas para candidatos que elas veem como a melhor escolha para preservar a estabilidade, poder e prestígio dos EUA, já que elas não querem voltar a ser refugiadas", diz Nguyen.

Tendo em vista tudo isso, antes de se aprofundar em análises de verificação de fatos ou em tópicos complexos da política nos EUA, como a assistência à saúde ou economia, as redações devem estabelecer definições básicas das instituições e de processos políticos para seus leitores. 

A APIA Vote, por exemplo, oferece recursos úteis sobre o voto para indivíduos e organizações locais antes de eleições.

Foco nas comunidades

O combate à desinformação requer um esforço diário, argumenta Van Fleet. É importante contextualizar como a desinformação causa dano específico a um indivíduo ou comunidade. 

Vídeos que circulam amplamente no YouTube feitos por agentes maliciosos perpetuam narrativas de desinformação como alegações de fraude eleitoral nos EUA, e agregadores de notícias sobre crimes também são populares em meio à comunidade asiática nos EUA, com muitos deles produzindo conteúdo sensacionalista que busca dividir grupos. Essas narrativas podem ter efeitos danosos na comunidade asiática e em suas relações com os outros.

"O ponto principal é contextualizar o suficiente para ajudar as pessoas a entenderem como acreditar em uma falsidade vai prejudicá-las, em vez de simplesmente verificar um fato", diz Nguyen.

Colocar o foco na comunidade asiática nesses esforços é fundamental. Jornalistas e redações devem pesquisar sobre as comunidades que eles cobrem e incluí-las em conversas sobre desinformação. 

Fazer parcerias com organizações locais é um método para tal. A APIA Vote colabora com esses grupos em todo o país e compila conteúdos sobre narrativas prejudiciais para enviá-las a pessoas de confiança, que então comunicam as descobertas em nível local, por meio de programas ou relações diretas com pessoas da comunidade.

"Precisamos trabalhar com nossas organizações locais que tenham a confiança de suas comunidades, que não sejam vistas como organizações ou entidades partidárias", diz Van Fleet. "Vá se encontrar com a comunidade, vá conversar com a comunidade, vá entender a comunidade. Certifique-se de que você está engrandecendo e tornando central o que eles têm a dizer em vez de falar por eles." 


Imagem por Camelia Heins