Os riscos para a segurança dos jornalistas e sua capacidade de trabalhar crescem diariamente, desde a repressão estatal e ataques legais a conflitos armados e violência online. "É como se, neste momento, uma tempestade estivesse caindo sobre a mídia independente", diz Anastasia Rudenko, fundadora e editora-chefe do veículo ucraniano Rubryka.
Muitos jornalistas que fazem parte da rede global do ICFJ estão sendo afetados por esses problemas, inclusive com ameaças diretas contra eles próprios e suas famílias, vigilância estatal sofisticada e intimidação legal. Mas, apesar dos riscos, eles demonstram resiliência extraordinária e continuam fazendo o trabalho vital de informar suas comunidades. "Nós seguimos fazendo nosso jornalismo porque acreditamos que ele é essencial, não só como uma ferramenta de informação, mas como uma forma de proteger a dignidade e a capacidade de ação das pessoas", diz José J. Nieves, editor-chefe do veículo cubano El Toque.
No mês em que se celebra o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, nós pedimos a alguns dos jornalistas com os quais trabalhamos que compartilhassem os desafios que estão enfrentando em relação à liberdade de imprensa e o que tem permitido que eles sigam em frente com o seu trabalho.
José J. Nieves
Editor-chefe do El Toque e bolsista do programa ICFJ Knight Fellow
País de origem: Cuba (atualmente exilado)
Um dos maiores desafios que enfrentamos recentemente é a expansão e intensificação da repressão patrocinada pelo estado além das fronteiras de Cuba. Apesar de eu viver exilado desde 2019, as ameaças nunca pararam. Na verdade, elas ficaram mais sofisticadas e abrangentes, inclusive com ameaças diretas contra mim e minha família.
Nos últimos dois anos, o governo cubano aumentou os ataques contra o El Toque de forma pública e privada. De um lado, há uma campanha orquestrada de descredibilização pública que contribui para construir uma falsa narrativa com o de criminalizar nosso trabalho. De outro, as consequências acabaram rendendo também perseguição na vida real. Pessoas que já colaboraram com a nossa redação – inclusive jornalistas que não trabalham conosco há mais de dois anos – foram interrogadas, ameaçadas e expostas a tortura psicológica por agentes de segurança do estado.
O que nos mantém firmes é uma combinação de propósito, capacidade de adaptação e comunidade. O El Toque se tornou uma redação totalmente transnacional, construída com base na confiança, colaboração remota e resiliência. Nossos leitores também têm sido uma fonte vital da nossa força. O retorno deles, a coragem que eles têm de compartilhar nosso trabalho mesmo quando é arriscado e as histórias deles nos lembram por que fazemos o que fazemos.
Anastasia Rudenko
Fundadora e editora-chefe do Rubryka
País: Ucrânia
No contexto de uma Ucrânia devastada pela guerra, a retirada do financiamento internacional não é só um problema orçamentário – é uma ameaça existencial. Nós estamos enfrentando simultaneamente o colapso do apoio de doadores, do modelo de publicidade e a escalada da crise de desinformação. Porém, a maior ameaça à liberdade de imprensa continua sendo o ataque deliberado e sistemático da Rússia ao jornalismo independente.
No terceiro ano da guerra contra a Ucrânia, a Rússia ataca não só nossas cidades e população civil; também ataca ativamente a verdade. Noventa e sete jornalistas ucranianos foram mortos e muitos outros foram sequestrados, feridos, perseguidos e ameaçados. Redações foram destruídas.
E é exatamente por isso que é mais importante do que nunca continuar com o nosso trabalho, continuar aqui, na Ucrânia, registrando, informando e nos recusando a deixar a verdade ser apagada. Acima de tudo, nosso jornalismo sobrevive porque não é só um trabalho de reportagem, é uma forma de resistência, de cuidado e cocriação com as comunidades que servimos.
Rana Sabbagh
Editora investigativa, repórter e vencedora do prêmio ICFJ Knight Trailblazer 2025
País: Jordânia
Eu acredito que a vigilância de jornalistas feita pelo governo usando tecnologia em constante evolução é a maior ameaça enfrentada pela profissão.
No caso do Oriente Médio e do Norte da África, os jornalistas sofrem mais porque aqui é a pior região do mundo no quesito liberdade de expressão e mídia independente. Acrescente a isso o sofrimento horrível de muitos dos meus colegas de longa data e suas famílias em Gaza, os colegas enfrentando a guerra no Iêmen ou aqueles em meio à turbulência política em países como Síria, Líbano e Iraque.
É um trabalho que se escolhe e se mantém a serviço do direito do público de saber para ser capaz de tomar decisões embasadas e cobrar responsabilidade dos poderosos. Sem a mídia livre, a sociedade não pode prosperar. Este é um trabalho muito perigoso e continua sendo uma questão de escolha.
Carlos Eduardo Huertas
Diretor da CONNECTAS
País: Colômbia
As campanhas dos poderosos que atacam o trabalho jornalístico de fiscalização ajudaram a erodir significativamente a confiança do público no jornalismo. O antídoto é continuar produzindo jornalismo de qualidade – mais e melhor.
O que permite seguir adiante é entender a importância e a urgência do nosso trabalho para uma sociedade que é nossa chefe suprema e a quem devemos informação relevante de interesse público para que as pessoas possam tomar decisões melhores.
John-Allan Namu
Cofundador e CEO do Africa Uncensored
País: Quênia
Nós sofremos bastante com o acesso à informação – nossas leis que protegem os direitos jornalísticos são vistas como inconvenientes por algumas instituições públicas. Também estamos vendo um aumento agudo dos processos legais estrategicamente abertos para coibir jornalistas. No nível subnacional, temos as antigas e más práticas de ameaças diretas, a exclusão flagrante de jornalistas que não se conformam às vontades dos poderosos e suborno.
Acredito que o perfil que construí ao longo dos anos é o que serviu para salvar a mim e à minha organização. É mais difícil perseguir alguém com um perfil público, mas gosto de acreditar que a credibilidade do nosso trabalho no Africa Uncensored fala por nós mais do que nós mesmos.
Imagem cedida pelo ICFJ.
Este artigo foi originalmente publicado pelo ICFJ, organização matriz da IJNet.