Se há um momento em que um turbilhão de informações e acontecimentos importantes precisam ser tratados pelo jornalismo, é durante o período de eleição. A polarização aumenta durante ciclos eleitorais, e junto com ela os fatos e a veracidade perdem lugar para as emoções e opiniões. É essencial ter em mente — e na hora de escrever — um guia sobre o que fazer e o que evitar antes da eleição começar.
Em 2020, vimos como a teoria da conspiração sem fundamento de "fraude eleitoral" na eleição presidencial dos Estados Unidos ganhou força, levando a uma tentativa de golpe. Nós vamos continuar tendo que lidar com essa desinformação com a chegada da próxima eleição presidencial, em 2024.
É imperativo reiterar os fatos em relação ao caso: o ex-presidente Donald Trump perdeu 6 dos 64 processos que ele abriu depois da derrota nas urnas, e o único bem-sucedido não provava nenhuma fraude. Cite organizações apartidárias e use dados para sustentar sua cobertura sobre a questão.
O aumento dos votos por correio divergiu entre as linhas políticas nos Estados Unidos. Quase 60% dos democratas votaram pelo correio em comparação a apenas 32% dos republicanos, de acordo com dados analisados por Charles Stewart, cientista político e diretor do MIT Election Data and Science Lab. Esses dados ajudam a explicar por que os votos por correio, que normalmente são contados depois, normalmente tendem a favorecer candidatos democratas.
Os atrasos na tabulação dos resultados em alguns estados criam ansiedade e dúvida, principalmente porque muitas pessoas gostariam e esperam saber dos resultados no dia da eleição. Ao fazer sua cobertura, observe detalhes fundamentais, por exemplo, que os estados-pêndulo, incluindo Michigan, Pensilvânia e Wisconsin, proíbem a abertura dos envelopes de cédulas enviadas por correio antes do dia da votação. Especialistas em política recomendam alertar os leitores sobre esses padrões com antecedência para evitar incerteza diante do sistema eleitoral e de seus resultados.
Diante de figuras políticas e outros indivíduos que tentam lançar dúvida sobre o voto pelo correio e voto ausente, jornalistas devem usar dados para explicar por que votar pelo correio é tão seguro quanto votar presencialmente.
Na eleição em 2024, vai ser trabalho do jornalista lembrar o público das lições aprendidas sobre as pesquisas para restaurar a confiança no processo. A explicação de coisas básicas como onde votar e o que esperar no dia da eleição deve incluir lembretes de que a existência de algumas irregularidades não significa que há fraude generalizada e coordenada. Esta é uma das narrativas de desinformação mais repetidas tanto nos Estados Unidos quanto na América Latina, conforme mostrou um estudo da UNESCO com a LatamChequea.
Outros padrões de desinformação destacados no estudo incluem alegações de que pessoas que morreram ou são inaptas para votar o fizeram. Nos Estados Unidos, este último caso tende a focar em imigrantes sem documentação.
Pessoas falecidas podem ser incluídas em listas de votação, já que elas nunca são atualizadas no mesmo dia em que a eleição acontece. Caso aconteça de alguém usar a identidade de uma pessoa que já morreu para votar, assegure-se de contextualizar o incidente com dados mostrando a prevalência de casos assim e observe se e como isso afetou a contagem de votos.
Dê exemplos de casos anteriores, como na Geórgia, em 2020, que depois de alegações infundadas sobre milhares de eleitores ilegais, dados oficiais mostraram que apenas duas pessoas de fato votaram ilegalmente no estado.
O mesmo se aplica a alegações de voto sem documentação ou voto de eleitores inaptos: junto com as alegações, inclua estatísticas, dados oficiais, exemplos de anos anteriores e contexto para saber se os erros mudariam o resultado.
Certifique-se de que sua reportagem vai além da cobertura no estilo corrida de cavalo: não é só sobre quem está liderando as pesquisas e por qual vantagem, mas sobre quais são as propostas dos candidatos, as questões fundamentais das eleições, dentre outros temas. Ao informar sobre dados de pesquisas, informe somente os dados das organizações mais confiáveis e os números delas junto com informações sobre margem de erro, tamanho da amostra e a data em que as pesquisas foram realizadas.
Vácuos de dados são espaços vazios nos quais a desinformação prospera: não tenha medo dos números e identifique especialistas em análise de dados que possam explicá-los, primeiro para você e depois para a sua audiência.
Estabeleça relacionamentos desde o início, tanto com suas fontes quanto com sua audiência. Seus leitores já sabem a melhor forma de entrar em contato com você? Ainda há tempo para avisá-los.
Este recurso é parte de um kit de ferramentas de cobertura de eleições e como identificar desinformação, produzido pela IJNet em parceria com o Chequeado e o Factchequeado, com apoio do WhatsApp. A produção dos vídeos foi feita em parceria com Aos Fatos, Comprova, Estadão Verifica e Lupa.
Imagem por Element5 Digital via Unsplash.