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A notícia de uma só palavra que salvou uma cidade

Aug 14, 2023 发表在 Diversos
Soldado

A famosa Batalha de Maratona, conflito que opôs gregos e persas há mais de 2.500 anos inspirou o esporte por causa da criação da maratona nos Jogos Olímpicos de Atenas, em 1896. Mas, quem diria, também serve de inspiração até hoje ao jornalismo. Nesta luta, os gregos venceram os persas. E um soldado recebeu a importante missão de correr a distância de 42 quilômetros, entre Maratona e Atenas, para passar uma única informação.

O soldado Fidípedes, responsável pelo importante anúncio, tinha que proferir uma palavra quando chegasse ao destino: “Vencemos.” A História registra que o mensageiro cumpriu fielmente a missão. Teve tempo e fôlego de anunciar o resultado da guerra com a palavra necessária. Mas, pela exaustão, Fidípedes morreu ali mesmo, logo depois de proferir a mensagem, diante dos magistrados atenienses que aguardavam saber o resultado da batalha.

Arte
O soldado comunicando a notícia de vitória após correr 42 quilômetros. Pintura de Luc-Oliver Merson (1846-1920), “O soldado de Maratona”, 1869, obra conservada em coleção privada.

Imagine se antes de noticiar o fato, o moço tivesse pedido um copo d’água para aplacar a sua sede? Imagine se ele resolvesse emplacar um “nariz de cera” antes de dizer o que precisava ser dito? Muito provavelmente, o curso da História teria sido bem diferente. Se a população de Atenas tivesse recebido uma mensagem equivocada ou tivesse ficado sem resposta, todos precisariam abandonar completamente a cidade fugindo da suposta tropa invasora, os persas.

Nicolas Siron é professor e especialista sobre história de Fidípedes. Em um artigo recente sobre o tema, Siron conta que a história de um soldado correndo para dar a notícia e morrendo ao chegar ao seu destino foi relatada por diferentes autores clássicos, em diferentes épocas e também com algumas variações. Um dos autores que recriou o episódio do soldado ateniense foi Luciano de Samósata, escritor romano do segundo século da nossa era. Em um de seus tratados, Samósata escreveu que após anunciar a vitória, o corredor mensageiro “caiu morto juntamente com a notícia”.

O ato heroico de Fidípedes serve de exemplo para o jornalismo ao simbolizar algumas das qualidades que a profissão exige: precisão, objetividade e relevância na transmissão da mensagem. Para quem apura e escreve a notícia, o mensageiro Fidípedes inspira determinação, dedicação e foco.

Há mais de dez anos, a jornalista Adriana Magalhães, corre anualmente uma meia maratona. Ao refletir sobre as qualidades que partilham um corredor e um jornalista no exercício de suas tarefas, Magalhães destaca dois atributos. O primeiro refere-se à preparação. De um lado o corredor deve estar preparado para a maratona, de outro lado, o jornalista deve estar preparado para a averiguação das informações.

O segundo atributo, segundo a jornalista corredora, é a objetividade. “Se ele [Fidípedes] não tivesse sido tão objetivo quanto foi, a morte dele e o esforço extremo não teriam valido de nada porque ele teria morrido sem passar a mensagem”, diz Magalhães. “É importante, no jornalismo e na vida ter essa objetividade para você conseguir passar a mensagem que quer”.

Uma comunicação negligente pode resultar em males e prejuízos irreparáveis. É preciso vigilância pois todos estão sujeitos a distrações, mesmo os heróis. Foi o que aconteceu com Teseu, um herói da mitologia grega que ao negligenciar uma informação acabou por desencadear um dano fatal.

A bordo de um navio com velas pretas em seu mastro, partiu Teseu, de Atenas rumo à ilha de Creta. Tinha como missão matar o feroz Minotauro e com isso liberaria a cidade de um castigo que a obrigava de enviar, a cada nove anos, sete rapazes e sete moças para serem devorados pelo monstro - metade homem, metade touro - que vivia em um labirinto.

Antes de embarcar para a ilha, Teseu e seu pai Egeu estabeleceram uma forma de comunicação visual. No caso de êxito de Teseu e seu consequente regresso à Atenas, o rapaz deveria trocar as velas pretas do navio por velas brancas. Desta forma, o pai, desde muito longe, iria saber da notícia e poderia preparar uma gloriosa recepção para o herói.

Teseu, tomado por certas circunstâncias durante a viagem de regresso, esqueceu-se de substituir as velas, negligenciando assim a informação tão aguardada pelo pai. Ao avistar as velas negras do navio, Egeu considerou seu filho morto e, desesperado, atirou-se ao mar e morreu afogado. Desde então, aquelas águas são conhecidas como mar Egeu.

Tanto a história de Fidípedes quanto a de Teseu estão associadas à maneira de transmitir uma notícia e à sua consequente recepção pelo outro. Em nosso momento histórico, em que notícias tendenciosas e falsas circulam livremente, sem pudores nem remorsos, é preciso que sejamos mais Fidípedes no ato do nosso ofício.


Foto: Fidípedes dando a notícia antes de seu último suspiro de vida. Desenho do século XIX atribuído a Jérôme-Martín Langlois.