Um estudo de 2017 do Conselho Nacional para Formação de Jornalistas (NCTJ na sigla em inglês) indicou que a falta de diversidade na mídia britânica é uma grande preocupação do setor há mais de 15 anos.
O estudo também mostrou que 94% da mídia no Reino Unido era branca, apesar de o setor ser amplamente concentrado em Londres, onde apenas 60% da população é branca. O estudo observou que o jornalismo, apesar dos esforços de inclusão, ainda é dominado por homens brancos de classe média.
Determinada a mudar isso, a jornalista Hannah Ajala, de origem britânica e nigeriana, fundou em 2018 a plataforma We Are Black Journos (WABJ), com o objetivo de criar uma plataforma para celebrar e empoderar a validade de vidas negras em um setor que tradicionalmente carece de representatividade dessa comunidade.
Impacto na comunidade
Com sede em Londres, a comunidade WABJ criou um espaço seguro em rede para que jornalistas negros se conectem, aprendam uns com os outros e ampliem sua presença na profissão. A comunidade, que tem mais de 100 membros e segue crescendo, organiza eventos virtuais e presenciais para que jornalistas negros mantenham contato com especialistas e informados sobre as últimas notícias da indústria da mídia.
Ao longo dos anos, a WABJ colaborou com veículos de renome, incluindo Financial Times, Marie Claire, Bloomberg, ITV News, BBC, e o Bureau of Investigative Journalism, na realização de eventos e oportunidades de networking.
"Colaboramos com eles de diferentes formas. A mais comum são os nossos eventos colaborativos, em que realizamos eventos baseados em um tema específico, como diversidade, redação e progressão de carreira", diz Ajala. "Nós fazemos questão de que o tema [seja sempre] interativo, gere engajamento e seja bem íntimo, em que as pessoas possam conversar entre si e aprender umas com as outras."
Benefícios para os jornalistas
Em 2019, Marcia Veiga, repórter da BBC Radio London, passou a fazer parte da WABJ depois de se formar na Universidade Bournemouth. Ela tinha expectativa de que fazer parte de uma plataforma a colocasse em contato com uma comunidade de jornalistas iguais a ela.
Depois de Veiga entrar para a plataforma, ela ganhou uma mentora, Blathnaid Healy, que a deu conselhos editoriais sobre seus textos e revisou sua carta de apresentação enviada para processos seletivos.
"Ela me fez sentir mais confiante [e me lembrou que] estou em uma área na qual preciso estar. O maior desafio foi que eu estava no exterior e era uma pessoa em início de carreira durante a pandemia, e as ofertas de trabalho eram bem limitadas. Ela me fez seguir firme e me deu confiança", diz Veiga.
Ela diz que jornalistas negros no Reino Unido deveriam considerar fazer parte da comunidade WABJ. "A comunidade me ajudou muito, ela mudou minha vida de tantas formas. Ter uma mentora como a que eu tive e ter pessoas como a Hannah [Ajala] na minha vida me ajudou a ser mais confiante na minha capacidade de conseguir um trabalho."
Lisa Hanley, jornalista freelancer de Manchester, entrou na WABJ em 2021, onde ajudou com as redes sociais e o podcast da plataforma. Ela considera que a experiência a ofereceu um espaço seguro para expressar opiniões sobre a mídia ao mesmo tempo em que formava uma comunidade.
"Desde falar em eventos até entrevistar meu herói na literatura e ter a chance de bater um papo e dar risada com uma comunidade profissional de pessoas que me entendem, isso é algo que eu sentia falta na indústria como um todo", diz Hanley.
Travis Levius, jornalista de viagem e criador de conteúdo que vive entre Londres e Atlanta, ficou sabendo da WABJ nas redes sociais em 2018. Ele conta que ficou entusiasmado ao descobrir uma comunidade de pessoas da mídia iguais a ele.
A experiência mais memorável de Levius com a WABJ foi quando ele participou do aniversário de um ano da comunidade em Londres, onde teve a oportunidade de conhecer outros jornalistas negros que cobrem diferentes editorias
"Isso me fez sentir menos invisível na cena de jornalismo do Reino Unido. Foi onde eu também conheci a Hannah Ajala, com quem eu mais tarde colaboraria como coautor do guia Lonely Planet's Experience London", conta.
Espaço para melhorias
Embora a WABJ já tenha feito bastante para criar um espaço seguro para profissionais de mídia no Reino Unido, a plataforma ainda tem mais trabalho a ser feito. "Conheço jornalistas negros em diferentes partes da Inglaterra que desejam ter esse senso de comunidade e a WABJ poderia talvez fazer encontros e eventos mais ao Norte", diz Hanley.
Levius sugere que a plataforma realize painéis ou palestras em universidades e faculdades do Reino Unido onde há uma quantidade considerável de estudantes negros, para que jornalistas negros profissionais possam inspirar uma nova geração de repórteres.
Apesar do sucesso da WABJ, Ajala diz que é difícil comandar um site liderado por negros no atual cenário de mídia, o qual ainda é dominado por publicações brancas no Reino Unido. "Você precisa forçar muito para ser vista", diz.
Ficar em dia com a saúde mental também é uma dificuldade para Ajala e muitos jornalistas em sua rede, principalmente diante da constante violência policial contra pessoas negras. "Às vezes pode ser desencorajador quando você está trabalhando em cima da importância de validar e celebrar a comunidade negra e você vê notícias sobre outro homem negro morto por um policial branco", diz.
Outro desafio é a manutenção da comunidade. "Você precisa ser bem consistente para manter a comunidade engajada. Você precisa ser consistente com o que diz que vai fazer. Você precisa ser consistente na coordenação efetiva da equipe", diz. "Pode ser difícil achar um senso de clareza e direção se você não foi consistente com o que está fazendo."
Apesar das barreiras, Ajala diz que a comunidade a mantém firme. "Sou muito grata pela comunidade porque comandar qualquer plataforma liderada por uma pessoa negra nem sempre é totalmente fácil, mas o que faz isso valer a pena 100% é ver o interesse que vem da comunidade, que as pessoas se importam com ela", diz. "Tenho muito orgulho de fazer parte de uma rede como essa."
Foto por Christina @ wocintechchat.com via Unsplash.