Na Tanzânia, políticos são proprietários ou exercem influência sobre muitos veículos de mídia, de acordo com o Índice de Liberdade de Imprensa 2024 da organização Repórteres Sem Fronteiras. Os jornais privados do país tendem a depender de financiamento governamental, com a publicidade estatal representando entre 40% e 80% da receita total.
Veículos que não produzem conteúdos alinhados ao governo podem ver as verbas evaporarem e, como resultado, passam a ter dificuldades para se manterem vivos e cumprirem com suas obrigações financeiras. Essa dependência do apoio do governo para ter sustentabilidade enfraqueceu a independência editorial das redações e a capacidade de responsabilizar os poderosos, resultando particularmente em um declínio do jornalismo investigativo.
"Às vezes, jornalistas descobrem uma boa pauta, mas não vão atrás", diz Deodatus Balile, chefe do Fórum de Editores da Tanzânia. "Os jornalistas ganham pouco e os veículos têm dificuldade para financiar o jornalismo investigativo – isso é visto como um luxo."
Em um esforço para melhorar as condições do jornalismo no país, profissionais de mídia e defensores de direitos humanos se uniram e criaram em 2015 a Tanzania Media Foundation (TMF). Um braço do Tanzania Media Fund, há quase uma década a TMF vem trabalhando com o objetivo de ajudar redações a produzirem jornalismo investigativo de qualidade.
Uma abordagem "estimulante"
A TMF realiza cursos para desenvolver as habilidades de reportagem investigativa dos jornalistas, explica Dastan Kamanzi, diretor executivo da fundação. Ela também ajuda os veículos a melhorarem sua sustentabilidade financeira.
"Nosso foco é o ambiente interno das redações porque acreditamos que se as organizações têm sistemas internos fortes e se a capacidade dos jornalistas de produzirem reportagens investigativas for melhorada, elas podem lidar melhor com o ambiente econômico, político e social", diz Deodatus Mfugale, um dos fundadores da TMF.
A fundação emprega uma abordagem "estimulante" no apoio aos jornalistas e redações, ensinando como gerar ideias de pautas investigativas, entrevistar fontes e redigir os textos ao final desse processo.
"Fazemos isso porque descobrimos que, com o passar do tempo, os jornalistas e as redações participam de oficinas e seminários, e mesmo assim a qualidade do conteúdo jornalístico é baixa", explica Mfugale. "Na nossa abordagem, os jornalistas aprendem com especialistas e, na sequência, nos reunimos para discutir ideias de pautas e fornecer recursos para apoiá-los. Já as redações aprendem com os especialistas sobre planos de negócios para sustentabilidade financeira, gestão de mídia e tecnologia."
Banco PIJ
A TMF administra o Banco de Jornalismo de Interesse Público (PIJ) para ajudar jornalistas e redações a produzirem jornalismo de alto padrão. O banco tem três pilares: pautas de jornalismo de interesse público, matérias de interesse público e bastidores de matérias de interesse público.
O primeiro pilar permite que jornalistas enviem ideias de pauta para análise. Caso a pauta seja selecionada, o jornalista recebe mentoria e apoio financeiro para produzir a reportagem.
O segundo pilar recebe matérias publicadas que são analisadas por sua competência e qualidade para então concorrer ao Prêmio Tija de Jornalismo, que celebra matérias investigativas excepcionais.
Por fim, o terceiro pilar recebe documentos que destacam os impactos mais significativos das matérias investigativas para também concorrer a categorias do Prêmio Tija.
"O PIJ representa um passo adiante significativo na missão de fortalecer o jornalismo de interesse público na Tanzânia", diz Kamanzi. "Ao apoiar e reconhecer jornalistas focados na responsabilização e transparência, a TMF empodera a mídia para que ela desempenhe um papel de maior destaque no fomento a uma sociedade mais responsável."
Subsídios de apoio a reportagens
A TMF administra subsídios para a produção de reportagens investigativas. Até hoje, de acordo com Kamanzi, a fundação já apoiou mais de 3.000 jornalistas e 150 veículos na Tanzânia. Com esse apoio financeiro, jornalistas puderam publicar reportagens exclusivas com um forte foco em questões e vozes rurais.
"Com a capacitação e o apoio da TMF, eu investiguei questões sociais, políticas e econômicas para manter o público informado", diz Sanula Athanas, repórter do IPP Media.
As oportunidades de desenvolvimento profissional oferecidas pela TMF deram aos jornalistas habilidades avançadas de investigação, jornalismo de dados, verificação de fatos e ética na reportagem, acrescenta Athanas.
Editoria Tija
Em janeiro, a TMF criou na redação do Mwananchi Communications Limited a Editoria Tija, que significa produtividade em suaíli. A editoria foca em reportagens aprofundadas, jornalismo investigativo e na melhoria da produtividade e dos padrões jornalísticos.
"A editoria é formada por nove repórteres que receberam capacitação e apoio por meio dos programas da TMF e que trabalham em diferentes investigações", diz Rashid Kejo, editor do Mwananchi.
Em maio, o Mwananchi publicou sua primeira reportagem especial com foco em como as más condições e a falta de manutenção das balsas em Dar es Salaam colocam em perigo as vidas de mais de 60.000 passageiros que usam esse meio de transporte diariamente.
"O apoio da TMF permitiu que a gente melhorasse a qualidade das nossas reportagens e contribuísse mais efetivamente com o debate público e a responsabilização de autoridades na Tanzânia", diz Kejo.
Desafios e próximos passos
Como acontece com muitas iniciativas para a mídia nos dias de hoje, o financiamento é um desafio primordial para a TMF.
"Nós planejamos lançar a Jo-Bazaar, plataforma em que ideias de pauta com foco em determinadas áreas vão ser vendidas para financiadores e patrocinadores em potencial, como organizações não governamentais e organizações da sociedade civil", diz Kamanzi. "Os recursos arrecadados vão ser usados para ajudar os jornalistas a produzirem as matérias."
A fundação também planeja fazer contato com universidades e faculdades de jornalismo na Tanzânia para discutir como preencher lacunas entre a sala de aula e a experiência prática.
"Nós já definimos nossa direção e sabemos o que queremos conquistar daqui para frente. Só temos que continuar arrecadando fundos para poder atingir nossos objetivos porque o financiamento continua sendo um desafio", acrescenta Kamanzi.
Foto por Iam Alex Levis via Pexels.