Embora Gana ocupe uma posição de destaque como uma democracia, a liberdade de imprensa no país da África Ocidental está se deteriorando. Em 2022, o país caiu 30 posições no Índice de Liberdade de Imprensa da Repórteres Sem Fronteira, e saiu da terceira para a décima posição na África, à medida que jornalistas vivenciaram uma piora nas condições de segurança nos últimos anos.
"Gana tem se caracterizado por uma espécie de aversão oficial ao jornalismo investigativo e crítico e por uma escalada de ameaças contra jornalistas investigativos", diz Sulemana Braimah, diretor executivo da Media Foundation for West Africa (MFWA).
Exemplos de ameaças a jornalistas ganenses incluem o assassinato do jornalista Ahmed Suale, após o envolvimento dele na produção do documentário "Number 12", sobre Anas Aremeyaw Anas, que expôs atividades de propina e corrupção envolvendo funcionários e árbitros de futebol de Gana. Em 2020, Manasseh Azure Awuni, jornalista investigativo e editor-chefe do The Fourth Estate, foi forçado a fugir do país depois de ter recebido ameaças de morte devido a um artigo que ele escreveu sobre o resultado das eleições em Gana.
Com o governo ganense se tornando cada vez mais intolerante a críticas, jornalistas estão valendo-se da autocensura para proteger seus empregos e sua segurança. O resultado é que o jornalismo investigativo e crítico que responsabiliza os poderosos está em declínio em Gana.
Apesar dessas ameaças, jornalistas e organizações de mídia no país estão comprometidos com a construção da próxima geração de repórteres investigativos para a responsabilização de indivíduos e instituições. Duas iniciativas em particular, o Clube de Jornalismo Investigativo Club e a bolsa Nova Geração do Jornalismo Investigativo (NGIJ na sigla em inglês), estão à frente da mudança.
A construção de uma nova geração
Para preservar o jornalismo investigativo crítico em Gana, Manesseh Awuni e a MFWA lançaram em março o Clube de Jornalismo Investigativo em várias universidades ganenses, incluindo a Universidade da Costa do Cabo, a Universidade de Educação em Winneba e a Faculdade de Comunicação da Universidade Africana.
As iniciativas do clube ensinam os estudantes os fundamentos da reportagem investigativa, incluindo como fazer pesquisa aprofundada, realizar entrevistas, identificar pautas investigativas, obter acesso a documentos públicos e adotar a mentalidade necessária para perseverar diante da repressão à mídia.
A ideia de capacitar jornalistas investigativos por meio de clubes em universidades surgiu em uma viagem que Awuni fez aos Estados Unidos em 2014 para o programa International Visitor Leadership, onde ele viu como as aulas de jornalismo investigativo na Universidade Northwestern resultavam em matérias de impacto produzidas pelos estudantes. Ele reconheceu que faltavam cursos práticos similares em Gana, onde o currículo das universidades normalmente carece de ênfase forte em técnicas de reportagem e desenvolvimento de habilidades.
Embora os clubes estejam em estágio inicial, muitos já começaram a funcionar. "No momento, nossa tarefa é acompanhar os eventos em curso no país para determinar quais questões valem uma investigação, e a partir disso nós compartilhamos ideias com nossos mentores para análise e aprovação", diz Isaac Donkor, estudante da Universidade de Mídia, Arte e Comunicação e membro do clube.
No fim do ano, Awuni vai organizar a primeira daquela que ele espera se tornar uma competição anual para as iniciativas do Clube de Jornalismo Investigativo, que vai dar aos estudantes a chance de serem reconhecidos por suas matérias e receberem prêmios. Eles também vão ter a oportunidade de escrever e ter seu trabalho publicado pela The Fourth Estate e outras plataformas.
"O objetivo é engendrar o espírito de competição e a vontade de realizar investigações todos os anos em cada universidade", diz Awuni.
Agentes de mudança
Em 2021, a MFWA lançou a bolsa NGIJ, através da qual jornalistas ganenses participam de uma capacitação abrangente de cinco meses que inclui um programa de mentoria com o Fact-Check Ghana e o The Fourth Estate.
O NGIJ seleciona os bolsistas em um processo competitivo que envolve testes de habilidade de escrita e entrevistas. Depois, os selecionados participam de um treinamento prático intensivo de jornalismo de dados, verificação de fatos, desenvolvimento de reportagem, reportagem investigativa e jornalismo móvel.
A bolsa, organizada com o apoio da Academia Deutsche Welle, a Embaixada dos EUA em Gana e o Ministério do Exterior da Holanda, também capacita os bolsistas no uso de leis de informação para obter importantes conjuntos de dados, que podem servir como base para o jornalismo inovador.
"Como parte das tarefas, os bolsistas devem gerar suas próprias ideias e apresentá-las aos editores, que analisam e dão sua aprovação final. Depois disso, são disponibilizados recursos por meio da MFWA para a produção da matéria", diz Deborah Bempah, coordenadora do programa e ex-bolsista.
Os participantes do NGIJ já produziram várias matérias de destaque. Em 2022, Bempah e o bolsista Joseph Kpormegbey produziram uma matéria sobre as dificuldades enfrentadas pelas crianças em Gana, incluindo a privação de educação, assistência à saúde e infraestrutura básica. Também no ano passado, o bolsista Edmund Boateng produziu uma matéria sobre o fracasso do presidente de Gana, Nana Akufo-Addo, em lidar com a mudança climática, enquanto o bolsista Philip Agbove investigou injustiças sofridas pelo povo indígena em Ada, cidade na Região Metropolitana de Acra, cujas vidas estão sendo ameaçadas por uma empresa rica e poderosa.
"Por meio de oficinas, sessões de capacitação e mentoria, eu aperfeiçoei minhas habilidades para ir mais fundo em questões complexas e apresentar minhas descobertas de forma eficaz", diz Agbove, que ganhou o prêmio de jornalista investigativo promissor no ano passado.
Neste ano, a MFWA anunciou as inscrições para a terceira edição do programa, que vai acontecer de setembro a novembro. Esta edição vai oferecer oficinas focadas especificamente em tributação progressiva, mobilização de recursos internos e fluxos financeiros ilícitos.
Responsabilização dos poderosos
Juntos, o Clube de Jornalismo Investigativo e o NGIJ estão oferecendo as oportunidades necessárias para quem está disposto a assumir o desafio de aprofundar em questões sociais e expor injustiças.
"O objetivo é permitir que os bolsistas recebam capacitação prática e intensiva para que sejam capazes de conduzir reportagens críticas, de alta qualidade, baseadas em fatos e aprofundadas voltadas para a melhoria de vida e promoção da boa governança por meio da excelência jornalística", diz Bempah.
Ao aumentar o número de jornalistas investigativos que podem cobrar de quem está no poder, o objetivo desses projetos é tornar mais difícil para o governo e outras pessoas poderosas a perseguição e o silenciamento de repórteres, diz Awuni.
"Se tivermos dois ou três jornalistas saindo de cada um desses programas e decidindo todo ano fazer investigações, eles vão responsabilizar mais autoridades e ter mais impacto", diz.
Foto por aboodi vesakaran via Unsplash.