Eu me encontrei com o futurista Robert Scoble na Augmented World Expo (AWE) em maio, para falar sobre o que vem por aí para o jornalismo. Scoble, ex-evangelista tecnológico da Microsoft e atualmente consultor de startup para a Rackspace, é conhecido por causar o "efeito Scoble" - que, em termos de celebridades "geek" pode ser o equivalente na tecnologia ao efeito Oprah.
Scoble também é conhecido por ser contundente (seu pronunciamento "O Glass está condenado" reverberou nos meios de tecnologia no início deste ano). Ele não poupou críticas ao estado do jornalismo e ofereceu algumas palavras de sabedoria para os próximos passos do jornalismo.
Copo meio cheio
Os dispositivos vestíveis formam a peça central do evento AWE, com uma série de novos competidores entrando no mercado, do Moverio da Epson (comprei um) ao bacana Oculus Rift (quero um). Scoble tem o hábito de experimentar todos os tipos de realidade aumentada e dispositivos de realidade virtual, e nós falamos sobre por que os jornalistas devem também - não tanto para a produção de conteúdo (é melhor usar um GoPro, ele diz); mas para participar da revolução social épica que está acontecendo.
O [Google] Glass não consegue fazer muito ainda, mas você ainda acha que os jornalistas devem estar experimentando com ele. Ajude-me a convencer meus colegas jornalistas.
Scoble: Vai ser um grande negócio para os jornalistas. Eu posso fazer mídia enquanto estamos andando por aí. Posso interagir com você naturalmente e fazer mídia. Isso vai ser algo interessante para explorar.
Mas o Glass muda o contrato social que temos uns com os outros. Apesar de eu ter o Glass, ainda sinto um desconforto em relação a ele, porque é algo interferindo entre nós e não temos essa cultura. Nós não temos tido esse pedaço de vidro entre nós.
E isso muda o contrato social, mas se você é um jornalista... talvez isso seja uma coisa legal.
Contexto é fundamental
Dados contextualizados são a nova história em realidade aumentada, e Scoble descreve sua trajetória, de brinquedinho a dispositivo de valor, de móvel a vestível, de GPS a 3D de tudo. Estamos "vivendo na era do contexto", ele diz, mas ainda precisamos construir um bom sistema operacional contextual e uma nova interface de usuário para o mundo físico.
O salto de brinquedinho a algo de valor com novas experiências de conteúdo implora a participação de jornalistas, que podem adicionar conteúdo significativo --e contexto relevante-- nestes primeiros experimentos. Em jogo está nada menos do que a construção da alma da tecnologia, segundo Scoble.
Quanto ao que está em jogo para os jornalistas --como ameaças à privacidade em um mundo perpetuamente documentado-- Scobble é mais realista sobre a tensão entre ser servido e ser vigiado, mas observa que o jornalismo ainda pode ter um super poder.
Tenho a sensação de quando se trata de dados e privacidade, você é tudo ou nada.
Scoble: O tempo para lamentar a perda de privacidade já passou. Temos que descobrir como ganhar a confiança sobre a linha louca. As pessoas finalmente acordaram para o fato de que nosso governo está nos vigiando, com [o informante Edward] Snowden.
Embora Snowden tenha ido a jornalistas para distribuir os vazamentos.
Scoble: Bem que ele poderia ter postado no Twitter, e teríamos alcançado tantos hits quanto.
Fiquei surpresa com isso também. Não era realmente necessário, pelo menos no que diz respeito à distribuição. Talvez Snowden achava que teria uma aura de credibilidade?
Scoble: Certamente, talvez essa seja a última peça do poder que o jornalismo tem.
Jornalistas já estão trabalhando com dados grandes e experimentando com novos formatos. Embora o Google seja o dono de tudo, e os jornalistas não.
Scoble: Essa é uma visão interessante. Que vergonha para os jornalistas não entenderem o que o Google está fazendo para eles.
Novo jornaleiro: vamos fazer um acordo
O que Scoble realmente quer falar com jornalistas é sobre o Facebook. E ele é um dos poucos percebendo o movimento por trás das cenas do Facebook insinuando que o futuro da plataforma de mídia social chegando à maturidade ainda está muito em jogo, e os dados continuam a indicar que mais notícias do que nunca estã sendo compartilhadas através da potência em distribuição.
Você está convencido sobre o Facebook para jornalistas. Sou mais fã do Twitter.
Scoble: Eu não vou ler CNN. Eu vou ler Facebook. Ou o que substituirá o Facebook.
Os jornalistas ainda não sabem como usar o Facebook. Talvez seja por causa de um monte de problemas internos -- o chefe diz que não são autorizados a estar no Facebook. Eu trabalhava para a Fast Company, e as pessoas diziam, 'você sabe que não tem permissão de postar lá'. O que você está falando? Esse é o futuro da distribuição de notícias!
Se as pessoas não entendem o quanto o Facebook tem controle em relação à distribuição de notícias, vão ficar de fora.
Pare de ser anti-Facebook. Isso não vai funcionar para você.
Existe um segredo para monetizar o conteúdo que nós simplesmente não sabemos ainda?
Scoble: As pessoas vão estar escrevendo sobre isso por décadas. Qual é a mistura do jornalismo? Quanto investir nele, como ganhar dinheiro com ele?
Isso vai ser um problema muito profundo para a indústria por mais uma década, pelo menos. [Pierre] Omidyar pode encontrar um caminho para sair do problema de modelo de negócio. E talvez Jeff Bezos [presidente da Amazon]. Ele entende que, se vai vender um dispositivo para você, é melhor fornecer algumas notícias.
As empresas de tecnologia se tornaram empresas de mídia ao longo dos últimos 10 anos, mas as empresas de mídia não se tornaram empresas de tecnologia. Imagine se o New York Times tivesse construído uma rede social para distribuir notícias?
Scoble: O Facebook não veio ao mundo através da lente do jornalismo. Veio ao mundo através da lente de um garoto de faculdade que queria obter encontros. E isso é uma maneira muito diferente.
Não acho que o New York Times pudesse ter chegado ao lugar onde o Facebook chegou por causa dessa visão de mundo diferente.
Eu concordo. O New York Times deveria ter trabalhado muito mais duro para conseguir encontros. O que eles podem fazer agora?
Scoble: Se estamos nos movendo para um mundo onde todo mundo tem uma câmera em seu rosto --as pessoas vão ver as notícias. Posso construir uma marca e uma comunidade de pessoas para compartilhar essa notícia comigo e com todos os outros? Posso construir uma rede de confiança?
Eu realmente estaria construindo parcerias com empresas de tecnologia, até mesmo ao ponto de compartilhar receitas publicitárias. Podemos fazer um acordo?
Estou feliz que eu não estou na indústria do jornalismo agora.
Existe um lugar para os jornalistas causarem um impacto agora, enquanto entramos em uma era totalmente nova de realidade aumentada?
Scoble: Se eu fosse um jornalista, estaria pensando em distribuição. Quando eu cresci, a notícia aparecia na minha porta da frente. Agora, o Facebook é quem entrega as notícias. Eu estaria perguntando: o que precisamos fazer para construir o sistema de distribuição do futuro?
Este artigo é um trecho de um post no PBS MediaShift e é publicado e traduzido para a IJNet com permissão.
Dana Coester é professora assistante da PI Reed School of Journalism, na Universidade da Virgínia Ocidental, e também trabalha como diretora criativa do centro de inovação de mídia da faculdade. O trabalho de Coester foca em mídia comunitária e o potencial do desenvolvimento econômico na inovação tecnológica. Sua pesquisa examina o futuro da storytelling/narrativa com interesse especiai na realidade aumentada móvel e tecnologia vestível no cruzamento da narrativa e neurociência. Coester concluiu seu mestrado em jornalismo pela Universidade de Missouri-Columbia, em 1993.
Fotos cortesia de Dana Coeste
Imagem principal sob CC licença do Flickr via Ted Eytan.