Quando a Libéria entrou em guerra em 1990, a nossa jornalista do mês, Wade C.L. Williams, tinha 9 anos. Depois de perder o contato com sua família enquanto buscava alimentos, Williams decidiu fugir. Ela escapou do conflito e embarcou em um navio para a Serra Leoa, onde ficou com famílias adotivas.
"A única maneira de poder ficar em contato com a Libéria foi ouvindo a BBC", disse Williams. "Meu avô adotivo tinha um rádio e sempre colocava [o programa] 'Focus on Africa' da BBC. Eu ouvia tudo durante a guerra e isso me atraiu para contar histórias."
Depois que Williams voltou para a Libéria em 1997 com 16 anos, ela estava pronta para ser jornalista. Williams participou de um clube de imprensa em sua escola local, cobriu a editoria de crime em um jornal e depois começou o Inside UMU, um programa jornalístico na United Methodist University onde obteve seu diploma de bacharel.
Desde então, Williams passou sua carreira contando histórias: de perfis políticos sobre a presidente liberiana Ellen Johnson Sirleaf à vida de uma criança sobrevivente do ebola, Miatta Urey, Williams continua a informar o público na Libéria e além.
Quando a crise do ebola se espalhou em toda a Libéria, Williams foi uma das primeiras jornalistas a cobrir a doença para FrontPageAfrica, onde trabalhou como jornalista investigativa. Ela escreveu sobre a manipulação da doença por parte do governo liberiano em um artigo de opinião no New York Times e continuou a cobrir a epidemia para a Associated Press e outras agências de notícias.
Williams é atualmente bolsista Hubert H. Humphrey na Universidade de Maryland, uma oportunidade que ela encontrou na IJNet. Ela também foi bolsista do New Narratives e Dag Hammarskjold Fund for Journalists. Abaixo, Williams conta como foi cobrir a crise do ebola e oferece conselhos para jovens jornalistas na Libéria.
IJNet: Fale sobre uma matéria difícil que você cobriu.
Wade C.L. Williams: Eu cobri a primeira matéria sobre direito de gays na Libéria. Eu tive essa ideia porque todo o debate dos direitos dos homossexuais começou quando o [ex-] primeiro-ministro britânico Tony Blair visitou a Libéria. Ele falou sobre como os EUA estavam reformando os direitos dos homossexuais e todos os lugares ao redor do mundo estavam reformando também. Um debate começou na Libéria, que não é realmente um país onde as pessoas aceitam que as pessoas que são gays.
Fiquei me perguntando se eu poderia encontrar pessoas que eram gay para falar sobre como se sentem e como a sociedade responde a eles. No início parecia impossível, mas então fiz alguns contatos. Em seguida, um ativista dos direitos de gays me apresentou a dois casais.
A história acabou sendo sobre... como as pessoas sentiam ser condenadas ao ostracismo por sua sociedade. Descobri que às vezes eram até mesmo expulsos de suas casas e explorados por causa de sua orientação sexual. Não sentiam que estavam perto de emancipação ou liberdade. Nós não divulgamos a identidade das pessoas. As fotos foram apenas de seus pés e mãos. A história chegou à primeira página e foi importante.
Como foi cobrir a crise do ebola?
A crise do ebola -- para todos, incluindo o governo -- não foi algo para o qual estávamos preparados. Veio e a gente teve que enfrentar. Na mídia liberiana, sempre ouvíamos o governo nos dizer quantas pessoas estavam infectadas naquele dia, mas não estávamos vendo as pessoas que estavam realmente doentes.
Não havia imagens. Ninguém estava vendo onde os enterros estavam ocorrendo. As pessoas estavam dizendo que o governo estava fazendo isso para conseguir dinheiro e que o ebola era uma mentira. O debate estava no auge e a imprensa estava dando margem ao debate. Ninguém estava saindo para investigar se isso era real.
Eu liguei para o vice-ministro da saúde [Tolbert Nyenswah] e o entrevistei sobre o aumento dos casos e a forma como o setor da saúde estava lidando com ele. Eu lhe disse: "As pessoas não acreditam que isto está acontecendo de verdade na Libéria. Eles precisam ver as imagens. Eles precisam ver as pessoas que estão fracas com a doença. Apenas deixe-me ir e ver isso."
Na época, a taxa de mortalidade era de 90 por cento. Em cada 10 pessoas que estavam doentes, nove pessoas morriam.
Ele me colocou em contato com uma pessoa que trabalhava na equipe de enterro. Eles estavam fazendo um enterro naquele dia e fui ver como era feito. A família veio. Na Libéria, se há um enterro, uma grande quantidade de pessoas aparecem. Mas naquele dia havia apenas três membros da família que apareceram. Você podia ver que eles nem sequer queriam ir perto.
Eu cobri o enterro e fiz uma matéria com os membros da família e o indivíduo que trabalhava na equipe de enterro. Eu fiz uma matéria multimídia: Havia fotos, vídeos e uma história. Essas foram as primeiras imagens que saíram e a venda do jornal se esgotou.
Por quando tempo você cobriu a epidemia?
Era todos os dias. Tornou-se uma obsessão em algum ponto. Todo dia eu queria fazer algo sobre a epidemia. Se eu ouvia algo ou alguém me ligava para dizer que algo estava acontecendo, eu ia lá.
Eu diminui a intensidade quando a epidemia abrandou. Quando a Libéria foi declarada livre do ebola, então eu comecei a focar nas histórias de sobrevivência.
Que tipo de conselho daria a jovens repórteres na Libéria?
A melhor coisa que você pode fazer é se esforçar ainda mais e não apenas ficar esperando que as coisas venham até você. Jovens repórteres têm que ir à luta e fazer-se profissionais. Eles têm que sair para [buscar] histórias e ser capazes de reportar a verdade e os fatos. Não deixe que ninguém te compre. Você tem que provar sua independência.
Esta entrevista foi resumida e editada.
Imagem principal de Wade C.L. Williams pela IJNet