Imagens de satélite e análise de dados: por trás da investigação "Derramamentos Impunes"

Apr 1, 2025 em Jornalismo investigativo
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Através do uso de imagens de satélite e do cruzamento de dados sobre derramamento de petróleo no Golfo do México, a Mongabay Latsm e o DataCrítica revelaram, em uma investigação recente, a omissão no relatório oficial de resíduos, bem como o atraso no pagamento de multas por sanções aplicadas às empresas que extraem petróleo e contaminaram o mar.

Em oito meses de trabalho, uma equipe de jornalistas se uniu com grupos de acadêmicos, cientistas e organizações de pescadores para desenvolver “Derrames Impunes”, um trabalho que combina dados, metodologia de investigação, uso de ferramentas digitais, análise de informação e visualização através de um mapa interativo.

Em entrevista à IJNet, os autores Michelle Carrere e Gibrán Mena compartilharam os principais pontos desta investigação de jornalismo ambiental e de dados: desde o modo como diversificaram as fontes até como confirmaram o roteiro para ter acesso à informação governamental necessária para revelar as descobertas da matéria.

Alianças para compreender a complexidade do tema

Revelar o derramamento de petróleo no mar é muito mais complexo do que aquele que ocorre no solo. O problema é a fluidez do combustível na água, a agitação e sua rápida dispersão, o que torna mais complexa sua detecção, explica Carrere.

Com sua experiência em jornalismo ambiental, a Mongabay se juntou com a organização mexicana DataCrítica, especializada em jornalismo de dados. Ambas já haviam trabalhado juntas no desenvolvimento do Guia para jornalistas sobre o uso de IA e imagens de satélites, promovido em conjunto com a Bloomberg, o El CLIP e o La Nación, em 2021.

Para compreender a situação dos resíduos no mar, a equipe solicitou relatórios empresariais enviados ao governo mexicano sobre o derramamento de petróleo. Em seguida, os jornalistas compararam as informações com dados obtidos a partir da análise de mais de três mil imagens de satélite, compartilhadas por cientistas do Colégio da Fronteira Sul e do Instituto de Pesquisas Oceânicas da Universidade Autônoma da Baja Califórnia.

“Entendemos que seria necessário trabalhar de mãos dadas com os cientistas para fazer uma boa análise das imagens, com uma metodologia que fosse correta para uma análise correta. Identificamos organizações e universidades que há anos trabalham com o tema”, detalha Carrere.

Mas a jornalista explica que as imagens de satélite não contam toda a história. Há manchas que são difíceis de identificar. É preciso saber, por exemplo, se são naturais ou não, seu tempo de existência. Tudo isso não permitia que fosse determinada a quantidade de derramamento. Como conseguir precisão quando não é possível obter esse detalhes? Isso levou a equipe a realizar reuniões constantes para que o trabalho de dados fosse o mais bem exato possível.

 

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Captura de tela da investigação destaca mapa sobre os poços de petróleo

Identificação das dificuldades da investigação

No processo de análise de informação e de dados, os jornalistas podem cometer erros de interpretação se não incluírem na equipe cientistas ou especialistas no tema. Além disso, Mena ressalta a importância de conhecer bem o território que será investigado, observar a informação em detalhes e identificar as dificuldades enfrentadas na aplicação da metodologia de investigação.

“Nós entramos em contato com pessoas que estão há muitos anos observando diariamente imagens de satélite do Golfo do México. Elas sabem onde estão os efluxos naturais, como uma mancha ou um derramamento se comporta e a diferença entre eles; também identificam padrões visuais”, diz.

Mena comenta que as descobertas da investigação dependem em grande medida do cruzamento de dados na etapa de análise. Os jornalistas trabalharam com uma base de dados sobre derramamentos e escapes, bem como com uma base de dados de acidentes petrolíferos em território mexicano, além de dados trazidos pelos cientistas.

Estes dados foram, então, contrastados com informações do poder público. Para isso, foram feitas 11 solicitações de informação a órgãos como a Comissão Nacional de Hidrocarbonetos e a Agência de Segurança, Energia e Ambiente, as autoridades mexicanas responsáveis pela questão dos hidrocarbonetos.

Diante da solicitação da geolocalização de cada um dos derramamentos marinhos, a empresa Petróleos Mexicanos informou todos os derramamentos em território nacional e não só no mar, o que obrigou a equipe a fazer uma categorização de dados praticamente manual, conforme a descrição de cada derramamento. Houve ainda algumas negativas das solicitações de informação, o que fez com que os jornalistas entrassem com recursos que acabaram com decisão favorável para a equipe.

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Mais de 80 mil pescadores artesanais dependem dos recursos marinhos provenientes do Golfo de México

Fontes importantes além da academia

Mais que pensar que somente na academia há fontes especializadas, Mena diz que é imprescindível consultar as comunidades locais que trabalham no tema da investigação, neste caso, a comunidade de pescadores, que foi fundamental para que os cientistas avançassem nas suas observações de satélite.

As pessoas que trabalham diretamente com o assunto da investigação têm um conhecimento baseado numa experiência de décadas; muitas vezes elas são menosprezadas, mas na realidade são muito valiosas para o trabalho jornalístico. “Sempre que essas pessoas tiverem uma experiência para reconhecer padrões é possível incorporá-las à produção jornalística; é muito potente”, destaca Mena.

Aprendizados durante a cobertura

  1. Observar o território onde se vai trabalhar, identificar dificuldades e, com base nisso, determinar as ferramentas a serem usadas
  2. Incluir especialistas multidisciplinares, pois isso vai enriquecer o trabalho de investigação e o deixará mais rigoroso
  3. Conhecer as leis vigentes e atribuições de cada autoridade para fazer solicitações precisas e evitar negativas de informação
  4. Fazer alianças com as fontes de informação para ter acesso a dados exclusivos e mais próximos do tema de trabalho

Ferramentas utilizadas

  • Phtyon ou Javascript para analisar planilhas
  • Pinpoint para extrair dados
  • QGIS para georeferenciar a informação sobre os derramamentos e visualizar os poços Global Fishing Watch e SeaWatch. Isso permite identificar os movimentos de embarcações de pesca a partir dos dados de satélite

 


Imagens cedidas pelos autores da investigação.