Estratégias para engajar públicos que estão distantes do jornalismo

Apr 2, 2024 em Engajamento da comunidade
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Como alcançar o público que não consome ou que desconfia do jornalismo tradicional?  Um estudo do Reuters Institute mostra que 41% dos entrevistados, no Brasil, disseram evitar se manter informados. A média global é de 36%. “Além disso, a pesquisa mostra que cada vez menos as pessoas acessam a notícia diretamente nos sites ou veículos, preferindo as redes sociais como o Instagram ou o TikTok, e prestam mais atenção quando um influencer compartilha algo do que um jornalista”, afirma Jamile Santana, coordenadora da Escola de Dados, programa de alfabetização em dados da Open Knowledge Brasil.

Ela participou do Empowering the Truth Global Summit 2024. Um treinamento virtual organizado pelo ICFJ com foco na disseminação de conteúdo confiável. Santana trouxe alternativas para reconquistar essa audiência desinteressada. Você acompanha a gravação desse encontro com o jornalista Daniel Dieb e o resumo na sequência.

O perfil de consumo de notícias no Brasil

Santana apresentou outros dados preocupantes. Segundo o Instituto Verificador de Comunicação (IVC),12 dos principais jornais brasileiros, em 2023, perderam 3,9% dos seus assinantes das versões digitais, o que representa menos 43.000 pessoas. Outra questão são os desertos de notícias. “Segundo o Atlas da Notícia, temos mais de 26,7 milhões de brasileiros que moram em 2.712 cidades sem acesso à cobertura jornalística sobre o lugar onde vivem. Quase metade dos municípios do país”, pondera.

A pesquisa do Reuters Institute aponta que 79% dos entrevistados, no Brasil, se informam online (incluindo mídias digitais). “É preciso entregar um conteúdo que atenda esse formato, ainda que não tenha uma roupagem que o jornalismo tradicional conhece,” destaca. A pesquisa traz, ainda, o perfil do público que evita notícias, quais os veículos de maior confiança e a possibilidade de conferir a audiência por diversos países.

Quem são os inalcançáveis?

Um relatório da TIC Domicílios 2022 detectou que 92 milhões dos brasileiros acessam a internet apenas pelo celular, o que representa 62% dos usuários do país. “Quando você está no celular a dinâmica de uso é outra, abrir várias abas para comprovar a informação e fazer o contraponto é mais difícil. Embora 51% dos entrevistados afirmassem verificar a autenticidade das informações, esta porcentagem caiu para 37% entre quem utiliza o aparelho”. Os dados da pesquisa sobre o papel do WhatsApp e Telegram na manipulação das eleições de 2022, no Brasil, corroboram com as afirmações de Santana.

O público que acessa a internet pelo celular é predominantemente feminino (64%), preto (63%) e pardo (67%), das classes DE (84%). “Estamos falando de um problema social e interseccional. Não tem como discutir a audiência do jornalismo, aproximação e o impacto da desinformação, sem passar por questões de gênero, raça e classe”.

Evite linguagem polarizada ou estereotipada

Outro estudo destacado é o dos pesquisadores Sue Robinson e Patrick Johnson. Eles constataram que a maioria das pessoas que não consome notícias são homens brancos, conservadores e de partido de direita. O perfil dos analisados também envolvia pessoas negras independentes ou liberais, que estavam frustradas com a forma estereotipada em que eram retratadas, e pessoas brancas de direita que rejeitavam a linguagem adotada pelos veículos, considerada de viés progressista. “Ambos apontaram que seus grupos estavam sendo excessivamente generalizados, sub-representados e retratados de forma negativa. Como fascistas ou marginais”, afirma.

Segundo Santana, os pesquisadores concluíram que os jornalistas precisam tomar cuidado com a linguagem polarizada ou estereotipada, incluir fontes diversas e construir parcerias com as comunidades para produzir conteúdos mais inclusivos. “Perguntar se a audiência está gostando do conteúdo pode salvar a relação com o público. Qual é o valor/notícia que eu dou à informação e qual o tipo de impacto que a informação traz?”

Perguntas certas para o público distante

Alcançar públicos novos e diversos requer planejamento. Santana sugere o uso da ferramenta trusting news para encontrar o perfil da audiência. A plataforma apresenta alguns passos, além de fornecer um guia de entrevista para a comunidade.

Ela sugere encontrar as lideranças locais e tentar se aproximar da comunidade a partir delas. E elenca uma série de perguntas que precisam ser feitas para o público que você quer conquistar:

- Como você vê as preocupações e questões da sua vida refletidas nas notícias?

- O que os jornalistas entendem errado sobre você?

- O que o jornalista deve fazer para retratar, com precisão, você e sua comunidade? O que você gostaria que fosse feito diferente?

- Conte uma questão na comunidade pela qual você é apaixonado. Em quem você confia para fornecer informações sobre esse assunto?

- Que tipos de histórias você gostaria de ver nas organizações?

“Depois que você fez o raio-x, discuta com a equipe e crie ferramentas de aproximação com a audiência”, afirma. Santana destaca que é importante esse espaço de escuta. “Ouvir pessoas e conversar com quem não é a nossa audiência é de graça. Temos que deixar de lado o nosso ego, porque estamos perdendo público”.


Foto: Canva