A emissora norte-americana que empoderou jornalistas negros

por Lauren Talley
Mar 10, 2022 em Diversidade e Inclusão
Tv station

Se você dirigir ao longo da avenida Jefferson, a leste do centro de Detroit, você vai ver um grande toldo branco com as letras WGPR. O prédio abriga a rádio 107.5, mas é também o local de um pedaço da história da televisão. A WGPR-TV foi o primeiro canal de TV de propriedade e operado por negros no país. A emissora não existe mais, mas um museu que homenageia sua história fica no antigo estúdio.

É onde Daphne Hughes começou a trabalhar na televisão. Depois de se formar na faculdade em 1980, ela entrou na WGPR como produtora. Hughes diz que a emissora era um ótimo lugar para jovens jornalistas negros terem experiência prática. "Era um lugar empolgante no geral porque tinha muita coisa acontecendo e era tão bom pra mim ver pessoas como eu, você sabe, afro-americanos fazendo coisas e fazendo acontecer na televisão", diz Hughes.

 

 

Em uma época em que oportunidades para profissionais negros de rádio e TV eram limitadas, dezenas de afro-americanos começaram suas carreiras na emissora. O então diretor Joe Spencer diz que amplificar vozes negras era a visão do fundador da emissora, William V. Banks.

"O que ele queria era dar aos afro-americanos a oportunidade de contar sua própria história", diz. "Naquela época havia muita notícia negativa sobre afro-americanos e essa era uma das coisas que ele achava muito desagradável. E é por isso que ele queria que a gente tivesse um departamento jornalístico."

Spencer diz que Banks era um advogado e homem de negócios pioneiro em Detroit. Ele também era pastor e já era proprietário da emissora de rádio WGPR. Em 1973, Banks e outros profissionais de rádio e TV de destaque foram convidados pelo então presidente Richard Nixon a irem à Casa Branca para falar sobre a falta de representatividade de pessoas negras na TV. Spender diz que, após aquele encontro, Banks acabou adquirindo uma concessão para começar a emissora de TV. 

"Depois de conseguir financiamento, ele levou dois anos até criar a emissora e ela foi inaugurada em setembro de 1975", diz. Spencer conta que Banks precisou levantar US$ 3 milhões para lançar a emissora, o equivalente a US$ 15 milhões em valores atuais. Doug Morison foi um dos âncoras do Big City News na primeira transmissão ao vivo em 1975.

"A primeira transmissão que fizemos foi muito agitada, para dizer o mínimo", diz. "Nós entramos no ar e toda matéria que a gente tentava colocar simplesmente não entrava. Então Jerry Blocker, meu co-âncora naquela época e diretor de jornalismo, teve simplesmente que improvisar praticamente o noticiário inteiro."

Morison diz que isso só alimentou a empolgação da TV ao vivo, mas o que ele se lembra com mais carinho é dos convidados que ele entrevistou.   

"O mais notável foi Steve Wonder. Eu o entrevistei", diz. "Também recebemos John Conyers. Tivemos Coleman Young e muitos membros do Tuskegee Airmen [grupo de pilotos militares afro-americanos] também foram entrevistados. 

Sendo uma emissora independente, a WGPR não tinha programação de rede, então produzia a maioria do seu próprio conteúdo. Além de notícias locais, o canal produzia também programação árabe-americana e polonesa. Mas um dos programas mais populares era o The Scene. Era um programa de dança aos moldes do American Bandstand e do Soul Train.

"Eu lembro que nas noites de sexta-feira os jovens faziam fila do lado de fora, na avenida, esperando para entrar e ter a chance de dançar no programa", diz Daphne Hughes. "Ele de fato estabeleceu padrões para a dança e para a moda que os jovens usavam na época."

 

A emissora não era muito bem avaliada, o sinal não atingia muito além da cidade de Detroit e a verba de publicidade ficou aquém da expectativa de Joe Spencer. Mas mesmo com essas limitações, Spencer se pergunta se era porque a WGPR era uma emissora de propriedade de negros.

"Certamente nós tínhamos muitas, muitas horas com boa programação. E as pessoas gostavam dos programas. Os programas não eram considerados de alta qualidade, mas a audiência era mensurável", diz. "Mas, em muitos casos, não conseguimos receber a receita que achávamos que tínhamos direito ou merecíamos na condição de comunicadores no mercado." 

Mas a emissora continuou adiante com a visão do fundador William V. Banks por duas décadas. Banks morreu em 1985 e o canal acabou sendo vendido para a CBS dez anos depois.

 

Hoje o estúdio na avenida Jefferson, em Detroit, abriga o Museu William V. Banks de Radiodifusão. Dentro do museu, imagens em vídeo do The Scene e de outros programas de dança do canal passam repetidamente diante da réplica de uma pista de dança. E um grande sofá laranja fica em uma reprodução de uma sala de estar dos anos 1970. Há alguns pufes, uma luminária de lava e uma TV antiga que exibe trechos do Big City News.

Algumas das gravações originais foram perdidas, mas o museu está trabalhando para digitalizar as fitas remanescentes para um dia criar um arquivo. Daphne Hughes diz que o museu é fundamental na preservação do legado da WGPR como uma pioneira na história da televisão.

"Queremos que ele se torne um lugar onde as pessoas vão visitar, como o Museu Charles H. Wright ou qualquer outro museu na cidade", diz. "Essa é uma parte importante da história afro-americana não só aqui, mas em todo o país."


Esse artigo foi originalmente publicado pela Michigan Radio e republicado na IJNet com permissão.

Foto por Robert Linder on Unsplash.