Este ano parece que todos os dias os grandes veículos de comunicação divulgam fotos e vídeos violentos para os seus leitores.
Da foto do corpo de um refugiado sírio de 3 anos afogado em uma praia ao vídeo de dois jornalistas assassinados ao vivo na televisão, não falta tragédia nos feeds de notícias em redes sociais.
Os jornalistas sempre tiveram que pesar as consequências do uso de imagens fortes ao reportar sobre eventos atuais, como na cobertura da Guerra do Vietnã ou o impacto do Holocausto. No entanto, o advento das mídias sociais e smartphones só reforçou o sentimento de que a violência está sempre ao nosso alcance.
Do ponto de vista do repórter, usar tais imagens é necessário para transmitir a realidade. Mas o que acontece quando essas imagens criam traumas psicológicos para os leitores e para os jornalistas?
Um grupo de especialistas analisou as consequências e ética do uso de imagens violentas no jornalismo durante uma palestra no Tow Center for Digital Journalism da Universidade de Columbia. Aqui estão alguns tópicos a considerar ao debater o uso de fotos explícitas ou vídeos em sua redação:
Considere que propósito as imagens servem
Antes de usar uma foto ou vídeo em uma notícia, os jornalistas devem determinar a intenção original da referida foto ou vídeo, disse Louise Roug, editora de notícias globais do Mashable. Embora não haja uma regra única para o uso de imagens explícitas em notícias, é imperativo considerar as consequências de fazê-lo. Em muitos casos, os perpetradores de atos violentos vão fotografar ou filmar a realização do ato, a fim de ganhar fama e infâmia.
Então, se disseminar vídeos de execuções do Estado islâmico, por exemplo, pode tecnicamente ser notícia, isso só ajuda a máquina da propaganda do ISIS, Louise explicou.
"Queremos ajudá-los a propagar essas imagens?", perguntou Louise.
O Mashable tomou uma decisão semelhante ao determinar o que fazer com o vídeo de um atirador matando dois jornalistas na Virgínia, disse ela.
"No caso do assassinato da equipe de reportagem -- mesmo que a gente não sabia um monte de coisas, porque isso estava acontecendo em tempo real --- parecia que esse cara estava tentando ganhar [notoriedade]. Queremos estar envolvidos com isso?"
Entenda o contexto em colapso
Quando se trabalha em jornalismo internacional, também é crucial considerar os fenômenos do contexto em colapso quando se analisa imagens fortes na mídia, explicou Sam Gregory, diretor de programa no Witness. O contexto entra em colapso quando um indivíduo cria e compartilha uma imagem, não esperando que seja visto por um público mais vasto. Quando a imagem ganha tração, a sua intenção original é perdida no público novo.
"Acho que isso é parte da razão pela qual estamos nos sentindo confrontados agora", disse Sam. "Em um feed de mídia social, vemos imagens que não esperávamos, porque saíram do contexto da comunidade de outra pessoa."
Em países árabes, por exemplo, uma imagem forte é regularmente apresentada aos leitores de uma maneira simples, quase clínica. Tais imagens se destinam a estimular a comunidade a entrar em ação, explicou Sam. Para os consumidores da mídia ocidental, no entanto, essas imagens são chocantes.
"É importante entender o nosso papel em ver estas imagens, muitas das quais não são mediadas pela grande mídia", disse Sam. "Essa é a realidade se você olhou para 800.000 imagens da Síria ao longo dos últimos anos -- a maioria não teria aparecido através de uma lente da grande mídia; teria sido compartilhada em redes de ativistas e plataformas online."
Imagens podem causar danos irreparáveis
Por décadas, pouco se sabia sobre os efeitos psicológicos em visualizar imagens fortes, disse Bruce Shapiro, diretor-executivo do Dart Center for Journalism and Trauma. No entanto, com a ascensão do jornalismo cidadão, psicólogos contemporâneos desenvolveram uma compreensão compartilhada da capacidade dessas imagens em causar danos.
"Há um corpo inteiro de pesquisa, olhando especialmente para [os ataques terroristas de 11 de setembro], a explosão de bombas em Boston, [o assassinato em massa na escola] Sandy Hook e eventos similares, que diz que sim, os níveis de sofrimento psíquico dos consumidores de notícias, problemas físicos de saúde e outras coisas parecem ser associados ao consumo de grandes quantidades do imaginário violento de eventos de grande valência", explicou Bruce.
Os efeitos psicológicos da imagem explícita se manifestam de várias maneiras. Uma delas é o sofrimento e danos psicológicos em consumidores de notícias; outra é a possibilidade de incitamento de imitadores que desejem emular um crime representado numa imagem ou vídeo. Por fim, há a possibilidade do trauma indireto que impacta as pessoas na indústria de notícias cujo trabalho é ver estas imagens.
"Em todas essas três áreas, o vector importante parece ser não a intensidade de uma imagem única e não a duração em que você visualiza a imagem, mas a frequência de visualização", disse Bruce.
Essa imagem torna-se particularmente traumática quando os leitores são apresentados com vídeo de "autoplaying", que remove sua capacidade de controlar a experiência de visualização. Bruce disse que essa sensação de perda de controle é uma marca da lesão psicológica e trauma.
"Eu acho que é bastante claro que devemos assumir alguma responsabilidade pelas imagens que levam a níveis mais altos de angústia", disse ele.