Quando cobrem eleições e campanhas, publicações online correm para postar artigos de verificação de fatos que analisam as declarações mais populares dos candidatos. Mas esse é o problema -- estes são apenas alguns artigos e não plataformas engajadoras.
Para desenvolver uma plataforma atraente que faz fact-checking e informa o público enquanto engaja os políticos, organizações de jornalismo podem buscar inspiração no projeto Truco da Agência Pública.
A Agência Pública é uma organização de jornalismo investigativo sem fins lucrativos, com sede em São Paulo, conhecida por reportagens de profundidade, com gráficos atrativos e engajamento online. A organização criou a plataforma de verificação de fatos "Truco" durante as eleições presidenciais no Brasil de 2014 e em agosto lançou o "Truco No Congresso" para focar no Senado e Congresso brasileiro.
A palavra "truco" vem do popular jogo de cartas. Cada jogador tem três cartas e a pessoa que alega ter a maior carta ganha cada truco. Para duplicar as apostas, um jogador pode pedir o truco e se os adversários aceitam, devem mostrar suas cartas. A equipe da Agência Pública escolheu este nome porque para eles o truco é um desafio para os políticos mostrarem suas cartas. Então, quando a equipe pede o truco, não só está verificando o que os políticos dizem, mas também desafia os políticos a darem mais informações ou esclarecerem declarações.
"O que nós queremos é que as pessoas digam a verdade", disse Natalia Viana, diretora da Agência Pública. "Queremos que as pessoas forneçam mais documentos e mais informações."
A equipe da Agência Pública percebeu cedo que na cultura brasileira nada é tão simples como apenas dizer que é verdade ou não -- há diferentes níveis de verdade. Assim, a equipe projetou o baralho ilustrado com desenhos coloridos e vibrantes que correspondem ao nível de verdade em um discurso. Um Blefe, o nível mais baixo, significa que a declaração é completamente falsa. Que Medo inclui declarações que teriam um impacto negativo sobre os direitos humanos.
Não é Bem Assim são para informações exageradas. Candidato em Crise! significa que o candidato disse algo que contradiz uma declaração anterior. Tá Certo, Mas Peraí significa que a informação estava correta, mas não foi contextualizada quando apresentada. Um Zap! significa que a afirmação é verdadeira e relevante.
"Decidimos desde o início que não queríamos parabenizar os políticos por dizer a verdade", disse Natalia. "Isso é o que eles devem fazer sempre."
O projeto foi realizado todos os dias durante as três semanas que antecederam as eleições presidenciais de 5 de outubro e durante as duas semanas que antecederam o segundo turno entre Aécio Neves e Dilma Roussef no dia 26 de outubro do ano passado. Durante esse tempo, 129 cartas foram distribuídas e foram feitos 18 trucos.
O impacto do Truco foi evidente durante a campanha do ano passado. O candidato Aécio Neves afirmou que tinha um índice de aprovação de mais de 90 por cento em Minas Gerais, o estado que ele governou por mais de sete anos. Quando a Agência Pública verificou esta declaração, a publicação descobriu que Aécio tinha exagerado os fatos e declarou sua declaração como Não É Bem Assim. A partir de então, organizações de mídia pararam de reportar essa estatística cada vez que falavam sobre Aécio, disse Natalia.
Agora, a crise política e econômica está aumentando no Brasil, então Truco no Congresso está se concentrando em uma área do governo que atrai uma maior atenção da mídia todos os dias. A cada dia o editor Maurício Moraes analisa as transcrições do Congresso à procura de dois tipos de frases: aquelas que precisam de informações mais aprofundadas para o público e aquelas que incluem dados questionáveis. Depois que Maurício escolhe as frases, ele as passa para a equipe de verificação de fatos, que também inclui membros da publicação Congresso em Foco. Com essa informação, Maurício edita e produz o relatório semanal do Truco.
Maurício descobriu que é mais difícil checar os discursos do Congresso do que os de candidatos presidenciais. Os candidatos presidenciais tentam mostrar suas realizações e assim tendem a usar fatos para apoiar suas declarações, ele disse. Os membros do Congresso não têm que mostrar porque já estão eleitos. Assim boa parte de seus depoimentos é muito subjetiva.
"Há menos dados e a conversa tende a ser mais um conflito político entre o governo e a oposição, por isso é preciso mais trabalho para encontrar frases para verificação", disse Maurício. "Existe uma grande quantidade de material, mas é menos evidente."
Talvez o elemento mais original de Truco é o envolvimento dos políticos. A Agência Pública recentemente pediu truco ao deputado José Guimarães do PT, que perguntou se era razoável o partido ter um ministro e a bancada desse ministro votar contra o governo. Guimarães respondeu as perguntas da Agência Pública em uma semana.
Imagens cortesia da Agência Pública