Amigo Secreto: os bastidores do jornalismo investigativo na Vaza Jato

نوشته Marina Souza
Jul 18, 2022 در Jornalismo investigativo
Título do documentário

O documentário de Maria Augusta Ramos, Amigo Secreto, tem como protagonista o jornalismo investigativo. A partir dos vazamentos das mensagens e áudios entre os procuradores da Lava Jato, em 2019, que ficou conhecida como a Vaza Jato, a cineasta acompanhou o trabalho dos jornalistas Carla Jiménez, Marina Rossi e Regiane Oliveira, do El País Brasil, e Leandro Demori, na época, do Intercept Brasil. O documentário retrata, ainda, os desdobramentos da Lava Jato que resultaram na eleição de Jair Bolsonaro e a nomeação do Juiz Sergio Moro ao Ministério da Justiça, sua saída do governo e candidatura à presidência, além dos impactos econômicos da operação em relação à Petrobras.

A Lava Jato foi considerada a principal investigação de corrupção e de lavagem de dinheiro público realizada no Brasil, que atuou em problemas antigos do país, como o desvio de dinheiro e pagamento de propina pelas empreiteiras a partidos políticos e caixa dois de campanha eleitoral. Porém, as denúncias da Vaza Jato questionam a intenção política do Ministério Público Federal e dos julgamentos. É o caso das mensagens divulgadas pelo  Intercept, que acusam o procurador Deltan Dallagnol de duvidar das provas contra o presidente Lula no caso triplex.

Em outros vazamentos é possível perceber a atuação conjunta entre Dallagnol e o juiz Sergio Moro na condução dos processos contra Lula, como a sugestão de testemunhas e cobrança de novas operações por parte do juiz, apesar dos princípios constitucionais da imparcialidade e da isonomia garantirem que o magistrado não pode favorecer uma parte no processo. Sobre a Vaza Jato as declarações de Moro são controversas. Em um momento o ex-juiz afirma que as mensagens hackeadas com Dallagnol não contém anormalidades ou direcionamento da investigação. Em outro momento, Moro não reconhece a autenticidade das mensagens. O documentário mostra trechos da anulação das condenações contra Lula, pelo Supremo Tribunal Federal, em 2021, por suspeição de Moro.  Em nota, Moro declarou que a Operação Lava Jato foi um marco no combate à corrupção, com mais de  quatro bilhões de reais recuperados aos cofres públicos e que todos os acusados foram tratados com imparcialidade.

Jornalistas desconfiaram da operação

Carla Jiménez, em uma live do Grupo Prerrogativas, exibida pelo canal do Youtube TV 247, afirma que no início os jornalistas do El País acreditaram que estavam fazendo um trabalho legítimo de combate à corrupção, mas que os direcionamentos da operação acenderam um alerta. Os jornalistas perceberam uma discrepância em relação à agilidade das investigações, notando uma maior rapidez ou lentidão, dependendo de quem eram os envolvidos. “Nós começamos a entender que alguma coisa não estava certa quando tudo começou a ser direcionado. Não é possível o time das divulgações que sempre iam para um campo e outras denúncias de outros figurões da política demoravam. Tem uma hora que não dá mais para encarar este tipo de operação, com essas características, com esses atropelos que haviam”.

Alexandrino Alencar, ex-diretor da Odebrecht, uma das empreiteiras envolvidas nos escândalos, afirma no documentário que a delação premiada era um momento de muita pressão, em que os procuradores buscavam dos delatores narrativas prontas. “Se eu falasse mais estaria contando uma mentira, como aconteceu com alguns notórios, que eu não vou falar, que mentiram para tentar escapar”. Alencar menciona, ainda, que havia um objetivo político de atingir o presidente Lula e assegura que um colega delator foi solto ao confessar o pagamento de caixa dois para a campanha de Aécio Neves.

Para Guilherme Curi, jornalista e professor universitário, o filme é uma aula de jornalismo e mostra a importância da mídia séria e livre. “A gente sofreu um golpe manipulado pela justiça, por um juiz totalmente parcial e, na época, os grandes veículos de imprensa, a mídia hegemônica, sempre celebrou a Lava Jato e nunca desconfiou ou não colocou em xeque determinadas questões que estavam sendo totalmente violadas, como o direito de defesa”. Ele destaca o trecho no documentário em que Moro se lança candidato à presidência, e pontua.  “Moro se torna ministro do governo que se elege a partir da prisão do principal candidato que venceria as eleições e logo em seguida se lança candidato”.

A câmera oculta

Em Amigo Secreto, a sensação é que a câmera acompanha o trabalho dos jornalistas na Vaza Jato, quase sem ser notada. Curi afirma que a câmera oculta da cineasta impede que o do

cumentário fique panfletário, abrindo espaço para a interpretação e pesquisa do público.

Para Fernando Tibúrcio de Oliveira, apresentador e produtor do programa de TV Cinematógrafo, da Rede Minas, esse é o estilo da cineasta, presente em seus trabalhos anteriores como O Processo e Juízo. “Observando esse Brasil contemporâneo ‘à distância’, ela cria no público uma sensação imediata de pertencimento", destaca Oliveira. "Sem desmerecer os documentários mais tradicionais, esse estilo de documentário cria um ritmo mais intenso e dinâmico que consegue estabelecer em quem assiste um necessário sentido de urgência”. Oliveira acredita que o filme é um registro implacável de um dos momentos mais complexos da história recente do Brasil.

Maria Augusta Ramos, em live do Grupo Prerrogativas, relata que o filme trata do bom jornalismo, do jornalismo ético e as consequências políticas e econômicas do Bolsonarismo. E acrescenta. “Eu não faço filmes para defender uma tese. Se eu sei exatamente o que eu vou falar sobre um determinado assunto, eu não faço filme. Eu faço filme sobre temas que me inspiram, que me dão medo, que eu preciso entender melhor, que eu preciso compreender a sua complexidade, e aí eu me jogo”. A cineasta afirma que suas obras são independentes e comprometidas com a ética e com a estrutura estética. Segundo Ramos, Moro e alguns procuradores da Lava Jato não quiseram participar do documentário.


Veja por este link onde o documentário Amigo Secreto está sendo exibido.