Durante a catástrofe socioambiental que aconteceu no mês de maio no Rio Grande do Sul, o Nonada Jornalismo - veículo jornalístico no qual trabalho - também foi afetado. Naquele momento, não conseguimos fazer a cobertura que gostaríamos, pois a emergência pessoal foi mais forte.
Assim que nos estabelecemos, começamos a elaborar a ideia de uma série de reportagens aprofundadas com a temática do racismo ambiental, observando como comunidades periféricas foram afetadas pelas enchentes históricas. E, para isso, precisávamos de um financiamento. Muitas mídias se sentem desencorajadas de buscar subsídios por falta de experiência ou até por não se acharem à altura do que diz o edital. E aqui busquei reunir algumas dicas para projetos neste sentido.
Qual o seu diferencial?
Uma das dicas principais para escrever um projeto é conhecer bem o seu trabalho, as suas potencialidades e os seus diferenciais na área. Uma das especialidades que desenvolvemos no Nonada Jornalismo é a criação de projetos de comunicação e de cultura ligados às políticas públicas, direitos humanos e memória. No início do ano, começamos uma editoria de Clima e Cultura, para cobrir estes tópicos que rendem diversas pautas.
É importante ter em mente que é preciso estar aberto para mudanças e sugestões. O Pulitzer Center aceita sempre ideias de pautas para receber os “grants”, além de possuírem vários programas específicos em que é possível aplicar. Nós elaboramos a pauta-projeto focada e enviamos. O processo continuou a partir da conversa direta com uma das editoras que entrou em contato conosco por e-mail.
Entre os aprendizados deste processo, destaco a preocupação em mensurar o impacto do trabalho jornalístico, em chegar a um número maior na audiência. Para isso, fizemos uma parceria com um grande portal de notícias brasileiro, o Uol para republicar algumas matérias da série. É preciso também ter um bom material da sua trajetória ou a do seu veículo para mostrar a seriedade do trabalho.
Fundamental ter rede de contato
Vagner de Alencar, diretor de jornalismo da Agência Mural, foi o único jornalista latino-americano escolhido para o Humphrey Fellowship, financiado pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos. O programa oferece dez meses de estudos não-acadêmicos, experiências de aperfeiçoamento profissional, participação em seminários, encontros de networking e uma série de outras atividades com foco no desenvolvimento de carreira.
Ele conta que conhecia o programa há muito tempo, desde a época da faculdade, e percebeu que tinha chegado o momento certo de tentar uma aplicação. “Esses processos são muito exaustivos, então você tem que se preparar, porque há várias fases”, diz.
Alencar ressalta a importância de criar e cultivar uma rede de contatos, já que muitas dessas seleções pedem cartas de recomendação. "Ter uma boa carta de recomendação é valiosíssimo. Alguém que valide sua trajetória faz toda a diferença", diz.
Encontros online dos programas
Outro ponto essencial é reservar tempo para escrever uma boa aplicação e participar dos encontros online oferecidos pelos programas, que são importantes para tirar dúvidas. Qualquer detalhe fora dos requisitos pode ser motivo para a eliminação.
Alencar diz que, depois da aprovação no processo, foi enviado para um curso intensivo de inglês em Champaign-Urbana, no estado de Illinois, antes de começar o programa propriamente - algo que não é comum nesses tipos de programa. “Eu sinto que ainda estou emergindo na cultura e me familiarizando mais com a língua. Então, é preciso ter um pouco de paciência, de calma, é tudo uma questão de entender seu tempo e não deixar que essas fragilidades te impeçam de aproveitar da melhor forma possível", explica ele.
Enfrentar e conquistar a língua estrangeira
Outra dica é não se deixar travar pela falta de fluência na língua estrangeira: "Esses dias, eu estava entrevistando como parte do programa, alguns jornalistas que trabalham com engajamento de audiência, que é o meu foco aqui, e já comecei o papo falando, ‘ó, desculpa, o inglês não é tão bom’, então, é isso, é entender essas vulnerabilidades e trabalhar com isso”, diz Alencar.
Filipe Speck, diretor de produto e negócios da Matinal Jornalismo, participou de diversos programas internacionais de formação, mas destaca o Emerging Media Leaders, do International Center for Journalists (ICFJ), como o mais importante de sua carreira até agora. O programa ofereceu a ele a oportunidade de trabalhar durante um mês na redação do jornal KUT, em Austin, nos Estados Unidos, produzindo matérias, podcasts e vídeos para uma audiência internacional.
Para o jornalista, o maior desafio na aplicação foi encontrar o ponto de virada em sua trajetória e comunicar claramente por que aquele era o momento certo para participar. "Trajetória e currículo são importantes, mas é fundamental mostrar que o programa vai trazer uma inflexão na sua carreira, impactando o seu trabalho dali para frente”, diz.
Ao imergir em uma redação de um país com uma realidade completamente diferente, Speck pôde repensar todas as etapas da produção jornalística. "Lidar com problemas semelhantes aos nossos em outro contexto nos faz refletir sobre o que fazemos e por que fazemos jornalismo”. E ele mantém contato com colegas do intercâmbio até hoje. “Sempre que preciso, troco e-mails, compartilho ideias e recebo feedbacks". Graças a oportunidade que teve, a rede de contatos dele pode se expandir internacionalmente.
Foto: Canva
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