Repórteres contam detalhes sobre desafio da cobertura do ebola

por Raymond Joseph
Oct 30, 2018 em Temas especializados

Quando a Organização Mundial de Saúde confirmou oficialmente um surto de ebola na Serra Leoa no final de maio do ano passado, Jennifer Yang, repórter de saúde global do Toronto Star, sabia imediatamente que era uma grande história internacional e ela tinha que cobri-la.

Mas ela também sabia que primeiro ia ter que superar alguns obstáculos importantes se fosse viajar para a África Ocidental para cobrir a história: o jornal estava cortando orçamento e seria difícil avaliar bem o suficiente a escala do surto de longe, do Canadá, para convencer seus superiores de que era uma história digna de cobertura.

Levou semanas para convencê-los e planejamento cuidadoso antes de Jennifer conseguir um sinal verde final para viajar para Serra Leoa por 10 dias.

Além dos obstáculos orçamentais, ela teve de superar o "fator do medo". Seu jornal, ela disse, estava "super nervoso sobre os riscos envolvidos, um contraste enorme em comparação ao envio de pessoas para zonas de conflito e de guerra. Estamos acostumados a isso, mas não tinha nenhum manual de instruções sobre como cobrir ebola. Em seguida, havia perguntas sobre meu seguro de saúde e se eu fosse infectada e teria que ser trazida de volta para o Canadá?

Em retrospecto, em alguns aspectos, foi uma das histórias mais fáceis de cobrir, disse Jennifer. "A história estava em todos os lugares; você não tinha que caçar [a notícia]. Mas logisticamente foi difícil, por exemplo, conseguir alguém para levá-lo ao epicentro. Um motorista ainda classificou as estradas, que eram terríveis, acima do ebola como uma razão para não ir para a área."

Os riscos são controláveis, seguindo certos protocolos como o uso de máscaras e luvas, não tocar em ninguém e nunca tocar seu próprio rosto ou colocar ou tirar suas lentes de contato sem usar um desinfetante forte.

Jennifer estava entre os repórteres que discutiram os desafios da cobertura do ebola durante a recente Conferência Mundial de Jornalistas de Ciência, em Seul, Coreia do Sul.

Como ela lutou em sua redação por aprovação para cobrir a história, Umaru Fofana, um jornalista freelance que também é correspondente da BBC na Serra Leoa, ouvia histórias sobre um surto da doença mortal, embora o governo se mantesse em silêncio.

Cinco semanas mais tarde, depois de a OMS confirmar a escala do surto, Umaru propôs a história para a BBC, mas o seu pedido para viajar para a área devastada pelo ebola foi recusado porque que "não era seguro". Em seguida, ele sugeriu a história para a Reuters, que concordou em enviá-lo e o encaminhou para obter orientação do grupo Médecins Sans Frontières.

Umaru foi um dos primeiros repórteres a chegar à cidade de Kenema, que foi o epicentro do surto mortal. Sua reportagem -- incluindo um vídeo arrepiante com o seu iPhone de uma equipe de sepultamento despejando sem a menor cerimônia o corpo de uma vítima em uma cova escavada apressadamente -- ajudou a alertar o mundo para a gravidade da situação.

"Eu cobri guerras civis, golpes de Estado e eleições violentas, mas eu nunca me senti tão assustado como quando estava cobrindo o ebola", disse Umaru. O acesso aos lugares quentes e fontes de notícias foi difícil, enquanto o perigo sempre presente de contrair a doença e infectar sua família era uma preocupação constante.

"Eu ia visitar a linha de frente e, em seguida, voltava para casa para a minha família. Foi uma época terrível para nós quando um dos meus filhos contraiu uma febre muito alta, mas, felizmente, não era ebola. Tivemos de dar uma licença integral a nossa empregada por medo de ela pode infectar nossos filhos, mas disse a ela que era porque não queria que ela pegasse [o vírus] de mim por causa do meu trabalho."

Os repórteres também tiveram que lidar com o governo de Serra Leoa "botando a sujeira por baixo do pano e intimidando os jornalistas que estavam reportando a história", disse ele. "Quinze semanas do surto e ainda não tinham declarado estado de emergência e, em vez de lutar contra o ebola, o governo intimidava jornalistas. Nós estávamos com medo e assustados, mas tínhamos que contar a verdade."

Somente quando a mídia internacional pegou a história que o governo da Serra Leoa finalmente admitiu a escala da crise.

Umaru criticou a mídia estrangeira por "concentrar sua cobertura sobre os estrangeiros" na maior parte. Na verdade, ele disse que o exército, que organizou e dirigiu um hospital que tratou centenas de pessoas, e os 300 trabalhadores humanitários locais que morreram tratando os doentes, foram os verdadeiros heróis.

E ele deu um alerta: Agora que a atenção dos meios de comunicação ocidentais saiu de lá, há um perigo real de um novo surto se a mídia não manter os holofotes sobre Serra Leoa.

Imagem principal sob licença CC no Flickr via UNMEER