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O esgotamento dos jornalistas brasileiros às vésperas do segundo turno

作者 Marina Souza
Oct 12, 2022 发表在 Liberdade de imprensa
Mão de pessoa em escada saindo para a luz

Em tempos em que a liberdade de imprensa vem sendo ameaçada por recorrentes ataques de Jair Bolsonaro e de parte do seu eleitorado, a saúde mental dos jornalistas cobra seu preço. Além da realidade estressante inerente à profissão, o aumento exponencial das agressões apontadas nos relatórios produzidos, por exemplo, pela Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) constata que a ascensão do presidente foi determinante para o aumento dos casos, que triplicaram desde 2018, chegando a 430 ataques, em 2021. Este panorama contribui para o desgaste emocional da categoria que exerce uma das profissões mais propensas à Síndrome de Burnout.

“Eu estou com quase 40 anos de profissão e nunca vi isso na vida”, diz a jornalista Cristina Serra, colunista da Folha de São Paulo, se referindo ao que ela chama de "degradação" sobre o quadro geral da profissão com os recorrentes ataques à democracia. Ela destaca que os jornalistas têm trabalhado num ambiente hostil e de vulnerabilidade, sobretudo, os que cobrem a movimentação de Bolsonaro. A jornalista compara a situação atual do país ao período da ditadura militar, quando começou sua carreira. “Eu só fui voltar a conviver com o risco autoritário neste atual governo”.

O psicólogo Renê Dinelli atende pelo Sindicato dos Jornalistas do Ceará. Ele afirma que a cobertura da Covid 19 e a exposição ao contágio do vírus, somado ao trabalho de desfazer as fakes news sobre a atuação da vacina, causaram inúmeros adoecimentos. Nessas eleições de 2022, se intensificaram no consultório de Dinelli as queixas sobre a tentativa de cerceamento da imprensa, principalmente entre mulheres, expostas a uma política de desqualificação do seu trabalho.

Apoio das organizações é fundamental

Instituições como a Associação de Jornalismo Digital (Ajor) e a FENAJ tem dado apoio no fortalecimento da saúde mental dos profissionais de imprensa. O bem-estar nas redações foi tema de uma mesa do Festival 3i, realizado pela Ajor. A presidenta da FENAJ, Samira de Castro, explica que a federação orienta os sindicatos filiados a disponibilizarem atendimento psicológico, por convênio, aos associados, e a tomar algumas medidas como o respeito à carga horária especial, o pagamento de hora extra e a remuneração sem discriminação de gênero, raça ou orientação sexual, estabelecendo cláusulas sociais para jornalistas que são mães. Outro amparo vem da associação TORNAVOZ, que oferece suporte jurídico aos profissionais que sofrem restrição ao exercício de sua liberdade de expressão.

Dinelli percebe em seus pacientes uma desmotivação e o sentimento de desvalorização da função. “Muitos jornalistas têm trazido a ideia de democracia ameaçada de seu fazer, que acaba afetando a saúde mental e limitando o exercício da profissão”. E acrescenta. “O ideal é que a pessoa busque cuidados psicológicos e o fortalecimento da rede de apoio, inclusive entre a categoria, para que não somatize mais questões e denuncie no contexto coletivo”.

Estratégias para cuidar da saúde mental

Para dar conta desse período de forte pressão, Serra bloqueia as ofensas que recebe nas redes sociais e procura se desconectar nos finais de semana, desligando o celular e evitando ler notícias. A rede de apoio também é apontada como uma estratégia. “Com meus colegas eu procuro conversar, oferecer a minha solidariedade. Nós não estamos sozinhos”. A colunista incentiva a denúncia aos sindicatos e organizações que podem oferecer assistência jurídica. “A impunidade é um combustível. É importante registrar nas entidades e buscar proteção”. Serra acredita na importância da sociedade apoiar os jornalistas. “O direito a informação é um direito social e é importante que a sociedade entenda isso”. 

 

Rosiane Freitas, CEO do Jornal Plural, de Curitiba, faz um desabado sobre a crise que estamos vivendo. “Eu sempre tive orgulho de usar meu crachá e hoje tenho medo de usá-lo em certos ambientes". Apesar de tempos difíceis, Freitas encontrou algumas estratégias para cuidar da sua saúde mental e seguir na cobertura. Ela usa medicações, para o controle da depressão e ansiedade, e evita o contato com conteúdos políticos agressivos se não forem essenciais para o seu trabalho. A jornalista ressalta, ainda, o cuidado com a equipe. “Aqui no Plural nós temos uma política de checar como cada um está. Também liberamos o repórter da pauta sempre que necessário e estimulamos o pessoal a sair de vez em quando do hard news e cobrir outras coisas”.

Freitas pontua que sempre foi difícil cobrir política, mas que o bolsonarismo tem uma estratégia de sufocamento dos jornalistas, inclusive financeira, processando quem cobre o governo ou seus apoiadores. Nesse sentido, o Plural junto com 33 organizações jornalísticas assinaram um editorial contra a reeleição do atual presidente. O documento destaca, por exemplo, como a campanha de Bolsonaro atacou os pilares da democracia ao mirar na imprensa, no judiciário e na urna eletrônica. "A perspectiva de uma imprensa séria e livre se o Bolsonaro for reeleito é a pior possível".


Foto: Canva