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Os desafios na cobertura das eleições brasileiras

Jun 20, 2022 发表在 Liberdade de imprensa
Urna eletrônica brasileira

Em outubro de 2022, os eleitores brasileiros terão mais uma vez que decidir quem ocupará os cargos em escala estadual e federal. A disputa mais importante é a corrida para a liderança do poder executivo. E, nesses últimos quatro anos, a relação entre a imprensa e o presidente da República e seus apoiadores ficou cada vez mais conturbada. 

Segundo dados da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), que monitora ataques sofridos por jornalistas e meios de comunicação do país, até abril deste ano foram identificados 151 episódios de cerceamento ao trabalho jornalístico. Em comparação ao mesmo período do ano passado, houve um aumento de 26,9%. Já a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), aponta em relatório que a continuidade das violações à liberdade de imprensa no Brasil está claramente associada à ascensão de Jair Bolsonaro à Presidência da República. 

Entidades pela defesa de comunicadores

Com dados alarmantes que evidenciam a perseguição à liberdade de imprensa no Brasil, entidades começaram a se organizar para auxiliar comunicadores e profissionais do jornalismo.

O Instituto Tornavoz é uma associação formada por advogados que se propõe a garantir defesa jurídica especializada àqueles que sofrem processos em razão do exercício da manifestação do pensamento e da expressão. Segundo Charlene Miwa Nagae, diretora da Instituição, processos judiciais estão cada vez mais sendo utilizados para constranger a atividade jornalística. “Aqueles que necessitarem de defesa jurídica e não tiverem condições de contratar advogado podem preencher um formulário disponível no nosso site. Os casos acolhidos terão a defesa financiada pelo Tornavoz”, explica. 

A Rede de Proteção de Jornalistas e Comunicadores surgiu em meados de 2018, quando o Instituto Vladimir Herzog entendeu que precisava atuar de forma mais incisiva para combater o cenário de violência contra jornalistas e comunicadores. Dyego Pegorario, articulador da Rede, diz que as denúncias podem ser enviadas pelo site. “No processo de acompanhamento fazemos uma avaliação de risco e das medidas que podem ser tomadas em cada caso. Em linhas gerais, essas medidas podem incluir acompanhamento jurídico, psicológico, acionamento de estruturas de imprensa para dar visibilidade aos casos, apoio tecnológico e de segurança digital para recuperar perfis hackeados, etc”, conta. Desde setembro de 2021, a Rede já atendeu 23 casos. 

Atualmente, a coordenação é do Instituto Vladimir Herzog e Artigo 19, e tem como parceiros o Intervozes e a Repórteres Sem Fronteiras. Além destes suportes, a Rede conta com a atuação de 58 parceiros espalhados por todos os estados do Brasil.

Combate a Desinformação

Professora e pesquisadora em comunicação e política na Université Sorbonne Nouvelle, na França, Camila Cesar analisa que um governo que vira as costas para a imprensa vira as costas para a sociedade. “Se um jornalismo livre é umas das condições para a existência de uma sociedade democrática, a era Bolsonaro tem lançado um desafio importante ao jornalismo brasileiro, que tem de fazer frente a uma massa de mentiras, distorções e manipulações de toda sorte que são incompatíveis com um chefe de Estado em uma democracia”, diz Cesar.

Entre os vários desafios do jornalismo nessa cobertura estão justamente a verificação e a checagem de fatos para impedir a disseminação de fake news, tão exploradas durante o pleito de 2018. A jornalista e doutora com pesquisa sobre a prática de fact-checking no Brasil Taís Seibt lembra que o jornalismo deve tentar se desvencilhar da polarização no debate eleitoral, que acaba colocando o jornalismo e a verificação como algo ideologizado, o que prejudica a penetração de conteúdo verificado em certos grupos. A educação midiática seria uma das respostas. 

Alfabetização midiática e política

Criada por jovens moradores da Rocinha, no Rio de Janeiro, o Fala Roça está se preparando para a cobertura e pretende abordar questões de alfabetização midiática e política. “Enquanto um grupo de comunicação que atua na Favela, esperamos trabalhar mais no sentido de oferecer conhecimento para que o voto seja valorizado," diz Michel Silva, cofundador e editor-chefe do veículo. "Geralmente, as favelas brasileiras são vistas como grandes bolsões de votos, e muitos acabam votando sem muito discernimento. Eu acho que o papel do jornalismo também é explicar conceitos políticos para que tenhamos uma votação inteligente”.

Já o Congresso em Foco planeja uma cobertura mais plural focada nas eleições para o congresso nacional. “Estamos com uma série de parceiros nos diversos estados para identificar e divulgar candidaturas de grupos tradicionalmente sub representados no congresso brasileiro: mulheres, negros, indígenas, LGBTQI+, pessoas com deficiência”, aponta Sylvio Costa, editor do veículo. Além disso, eles estão buscando recursos para ir além do noticiário diário federal, procurando levantar favoritos para a câmara dos deputados e do senado de cada estado. 

Costa acredita que as eleições vão acontecer em um contexto de temperatura política elevada e que é preciso trabalhar em conjunto. “Precisamos ser solidários independentemente das diferentes propostas editoriais e interesses de cada veículo, é preciso ter em comum essa grande batalha de garantir o exercício do jornalismo com o mínimo de liberdade”, explica o editor. 


Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil