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Como os veículos nativos digitais estão fazendo a diferença no jornalismo brasileiro 

Sep 26, 2021 发表在 Jornalismo digital
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Você sabe o que é um nativo digital? O conceito aparece em diferentes contextos, mas no jornalismo está ligado a organizações que nasceram exclusivamente na internet e que apostam em tecnologias e em diferentes modelos de negócios em busca de sustentabilidade. Nos últimos anos, esse ecossistema tem se solidificado com o crescimento de organizações importantes no Brasil, como a Agência Pública, Nexo Jornal e Alma Preta

O jornalista Guilherme Alpendre, vice-presidente do Conselho da Associação de Jornalismo Digital (Ajor), conta que muitas das associadas têm sido responsáveis por coberturas investigativas importantes e sensíveis nas áreas como direitos humanos, meio ambiente e política. “A ideia é realmente que a Ajor seja uma organização para a defesa desse novo jornalismo que surge. Para nós, é importante um jornalismo de interesse público, que defenda a democracia, justiça social. Ao fazer isso, estamos nos colocando em defesa de direitos fundamentais, como a liberdade de expressão, igualdade e acesso à informação”, explica. 

A Ajor foi lançada em maio de 2021 e estrutura sua atividade em três eixos: profissionalização e crescimento das associadas, a defesa do jornalismo e da democracia e o foco na diversidade. Atualmente são mais de cinquenta iniciativas que compõem a rede. 

Cobertura do meio ambiente no dia a dia

Essas organizações apresentam um panorama da diversidade brasileira no jornalismo, porque cobrem distintos temas, com diferentes formatos e olhares. A Agência Eco, especialista em cobertura ambiental, por exemplo, está na ativa desde 2004. Segundo o diretor-executivo Paulo André, nos grandes jornais a pauta ambiental só aparece em momentos de catástrofes ou em grandes eventos. “O Eco sempre teve esse desafio de cobrir o meio ambiente no dia a dia, de falar sobre política ambiental”, diz. 

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Com o tempo, o Eco foi também focando na cobertura relacionada à conservação. “Somos especialistas em áreas protegidas, nas últimas descobertas científicas de novas espécies”, conta Marcio Isensee e Sá, diretor de conteúdo. Para ele, os veículos independentes vêm também preencher uma lacuna que o jornalismo tradicional não consegue. 

Do lado financeiro, por muito tempo a organização investiu em um modelo de cunho filantrópico. Atualmente, eles têm diferentes modos de garantir recursos, como campanha de membership, e vislumbram a oportunidade de oferecer serviços de comunicação e audiovisual. “É uma construção, não temos certeza se esses caminhos vão dar certo, mas acredito que a principal lição é diversificar as fontes de financiamento”, diz Sá. 

Jornalismo de quebrada

Thiago Borges, um dos fundadores do Periferia em Movimento, conta que um dos desafios é entender a real necessidade do público. Eles produzem o que chamam de jornalismo de quebrada, um jornalismo sobre, para e a partir das periferias. A iniciativa foi criada em 2009 por jovens jornalistas que moram em periferias da Zona Sul de São Paulo. “Quando a gente entende que nosso público prioritário é uma mulher negra, de 20 a 40 e poucos anos de idade, que tem uma rotina atribulada e quais são as suas necessidades, isso determina todo o nosso fazer", diz Borges. "A gente sabe que não dá pra esperar que essa pessoa chegue até nós. A gente precisa chegar até ela antes”. 

Para Borges, uma das alegrias ao longo desse tempo é o fato de desglamourizar o jornalismo, assim como o público que se vê nas matérias. “Conseguir identificar histórias importantes e que as fontes retratadas ali também reconheçam a importância dessas histórias quando a mídia em geral invisibiliza ou criminaliza também é uma alegria. Nesse período, eu particularmente gosto muito de uma série feita em 2019, chamada Matriarcas. ”, diz ele, se referindo a reportagens que mostraram trajetórias de várias mulheres.

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Atualmente, a Periferia em Movimento está com uma campanha de financiamento coletivo no Catarse e atua financeiramente com prestação de serviços diversos, patrocínios, apoio institucional privado e editais públicos. Borges valoriza a formação de uma rede de veículos independentes como a Ajor mas pondera, entretanto, que é preciso considerar quem tem acesso a internet e em quais condições.

Precursores da discussão sobre gênero

Camila Tavares, gerente de produto da Gênero e Número, conta que a organização, na ativa desde 2016, ajudou a fincar as bases para a discussão de gênero e raça na imprensa. “Mostramos o quanto isso é premissa fundamental para falar de desigualdades no Brasil. Hoje este é um debate difundido inclusive entre veículos tradicionais, que não costumavam usar estes ângulos em suas coberturas”, diz. 

Um dos trabalhos de maior impacto foi a reportagem que mostrou com dados do próprio governo federal como o Ministério da Família, Mulher e Direitos Humanos do Brasil havia executado pouco mais da metade de seu orçamento no primeiro ano de pandemia. “Fomos atacadas pela ministra Damares Alves e respondemos mais uma vez evidenciando os dados, que partiram de seu próprio ministério”, diz Tavares.  

A Gênero e Número faz captação de recursos por projetos, apoio dos usuários e Fundações, mas entende também que é necessário diversificar as fontes de receita para a sustentabilidade do negócio. “Hoje estamos testando a produção de pesquisas, relatórios e serviços para empresas sobre temas que dominamos", explica Tavares.


Foto: montagem com as logomarcas citadas no artigo

Rafael Gloria é jornalista, mestre em comunicação, editor-fundador do site de jornalismo cultural  Nonada e sócio da Agência Riobaldo.